Na casa compartilhada | Beatriz Aquino
Na casa compartilhada, há cinco quartos e quatro pias. Duas dos banheiros, uma da cozinha e outra da área de serviço onde se lavam as solas dos sapatos e algumas meias.
Na cozinha, há nove pratos para os cinco moradores. E quatro copos. Que não sei bem como se organizam no uso. Os talheres são fartos, as xícaras numerosas. Já as panelas não.
Às oito da manhã, o mais velho da casa toma um café apressado. Às nove, a senhora cansada remoe lembranças perdidas. Às dez e meia o rapaz faz um shake de proteína antes de ir para o surf. Ao meio dia, o casal desempregado prepara o almoço e depois se tranca no quarto onde gemem sem cerimônias.
À noite, monossílabos são trocados nos corredores.
– Não se trata aqui de uma família.- Às vinte e três horas, é a hora que o bule para o chá ferve pela última vez.
Na madrugada, o silêncio de uma vida anônima enche o teto de uma bruma alaranjada.
Dizem ser essa a cor da melancolia, mas sobre isso nada sei…
Beatriz Aquino, além de escritora, é formada em Publicidade e propaganda e é atriz de teatro. Beatriz também é autora dos livros: Apneia (romance), A Savana e Eu (crônicas), Caligrafia selvagem (poesia), Anne B.: a hora mais pacífica, e outros. Colabora em diversos sites, jornais e revistas, como o jornal O tornado e a revista InComunidade, do Porto. Atualmente vive em Portugal.