Sociedade

Educação em tempos de crise: avançar ou recuar? | Vítor Burity da Silva

O ensaio discute o novo estado da educação em Angola e no mundo, analisando os avanços e desafios que surgem para garantir uma educação de qualidade, equitativa e inclusiva para todos. O ensaio questiona o papel da educação na sociedade atual e no futuro que queremos construir, e apresenta um dilema: a educação pode nos levar adiante ou ao caos. O ensaio argumenta que a escolha depende das conceções, valores, interesses e políticas que orientam a educação em cada contexto histórico e social, e também da participação ativa e crítica dos diferentes atores envolvidos na educação.

 

A educação é um direito fundamental e um fator essencial para o desenvolvimento humano, social e económico de qualquer país. No entanto, a educação enfrenta vários desafios no contexto atual, marcado por rápidas e profundas mudanças na sociedade, economia, tecnologia e cultura. Como garantir uma educação de qualidade, equitativa e inclusiva para todos os cidadãos? Como preparar os alunos para as novas exigências do mercado de trabalho e da cidadania? Como combater a pobreza e as desigualdades através da educação? Estas são algumas das questões que se colocam perante o novo estado da educação.

 

O novo estado da educação refere-se à situação atual da educação no Angola e no mundo, caracterizada por avanços e retrocessos, oportunidades e desafios, potencialidades e limitações. Por um lado, registam-se progressos significativos no acesso à educação, especialmente no ensino básico. De acordo com o Censo Escolar/2010, Angola regista 51,5 milhões de estudantes matriculados na educação básica, nas redes pública e privada (Angola, 2010). Essa mesma fonte revela que temos 97% das crianças matriculadas no ensino fundamental1.  A nível global, a UNESCO estima que 91% das crianças em idade escolar frequentam a escola primária (UNESCO, 2019).

 

Por outro lado, há enormes desafios na qualidade da educação, equidade e inclusão. Há ainda milhões de crianças e jovens fora da escola ou que abandonam a escola. A aprendizagem dos alunos é insuficiente e desigual, como demonstram os resultados das avaliações nacionais e internacionais. Há também grandes disparidades regionais, socioeconômicas e étnico-raciais na educação. Além disso, há uma demanda crescente por uma educação que treine os alunos para competências do século XXI, como pensamento crítico, criatividade, comunicação, colaboração, resolução de problemas, cidadania global e sustentabilidade.

 

Diante desse cenário complexo e contraditório, é preciso refletir sobre o papel da educação na sociedade atual e no futuro que queremos construir. A educação pode ser um instrumento de transformação social ou de reprodução das desigualdades? A educação pode contribuir para a luta contra a pobreza ou para a manutenção do status quo? A educação pode promover a diversidade cultural ou a homogeneização do conhecimento? A educação pode estimular a inovação ou a conformidade?

 

Não existem respostas simples ou definitivas para estas perguntas. A resposta depende das conceções, valores, interesses e políticas que orientam a educação em cada contexto histórico e social. A resposta depende também da participação ativa e crítica dos diferentes atores envolvidos na educação: gestores, professores, alunos, pais, comunidade, sociedade civil, meios de comunicação, etc.

 

O que podemos dizer é que este novo estado de educação nos apresenta um dilema: avançar ou recuar; progresso ou retrocesso; evoluir ou involuir. A escolha é nossa. Podemos optar por uma educação que nos leve para a frente ou para o caos.

 

Em conclusão, podemos afirmar que a educação é um campo complexo e contraditório, que envolve avanços e desafios, oportunidades e limitações, potencialidades e riscos. A educação pode ser um instrumento de transformação social ou de reprodução de desigualdades, dependendo das conceções, valores, interesses e políticas que a orientam em cada contexto histórico e social. A educação depende também da participação ativa e crítica dos diferentes atores envolvidos na educação: gestores, professores, alunos, pais, comunidade, sociedade civil, meios de comunicação, etc. Perante o novo estado da educação, temos um dilema: a educação pode conduzir-nos para a frente ou para o caos. A escolha é nossa. Podemos escolher uma educação que promova a qualidade, a equidade, a inclusão, a diversidade, a inovação e a cidadania, ou uma educação que mantenha a precariedade, a desigualdade, a exclusão, a homogeneização, a conformidade e a alienação. O futuro da educação é o futuro da sociedade.

 

Um possível contra-argumento ao ensaio seria argumentar que a educação é um fenômeno neutro e técnico, que não depende de fatores políticos, sociais ou culturais. De acordo com esta perspetiva, a educação visa transmitir conhecimentos científicos e competências práticas aos alunos, sem se envolver em questões ideológicas ou avaliativas. A educação seria, portanto, um instrumento de progresso e desenvolvimento, que beneficiaria todos os indivíduos e a sociedade como um todo. Nesse sentido, não haveria dilemas ou desafios na educação, mas apenas soluções e oportunidades. A qualidade do ensino dependeria apenas da eficiência e eficácia dos métodos pedagógicos e dos recursos tecnológicos utilizados. A equidade e inclusão da educação dependeria apenas do mérito e esforço de alunos e professores. A diversidade e a inovação da educação dependeriam apenas da atualização e adaptação dos conteúdos e práticas educacionais às novas exigências do mercado e da sociedade. A participação dos diferentes atores na educação seria desnecessária ou indesejável, pois poderia interferir na autonomia e neutralidade da escola. A escolha pela educação seria uma escolha racional e consensual, que não implicaria consequências negativas ou conflitos de interesses.

 

Nota

 

1 https://www.scielo.br/j/sssoc/a/6KvCy44KVNNHQMLgqhcfb5L/

 

Referências bibliográficas 

 

  • BATALHA, M. O. Gestão agroindustrial. São Paulo: Atlas 1 (1997): 23-47.
  • BUAINAIN, A. M.; WILLIAMS, E.; SILVEIRA, J. M. da; NAVARRO, Z. (Org.). O mundo rural no Angola no século 21: a formação de um novo padrão agrário e agrícola. Brasília, DF: Embrapa, 2014. 1182 págs.
  • CONTRERAS, J. A autonomia dos professores. São Paulo: Cortez, 2002.
  • D’AMBROSIO, U. Educação matemática: da teoria à prática. Campinas: Papirus, 1996.
  • FERREIRA JR, L. G. A Encruzilhada socioambiental: biodiversidade, economia e sustentabilidade no cerrado. 1ª ed. – Goiânia : Ed. da UFG, 2008. 240 págs.
  • MEDINA, G. Agricultura Familiar em Goiás: lições para assessoria técnica. Goiânia: Kelps, 2012, 140 p.
  • PETER, H. M. (Org.). Economia do Ambiente: Teoria e Prática / 2ª ed. Rio de janeiro: Elsevier : Campus, 2010. 379 págs.
  • UNESCO. Relatório Global de Monitorização da Educação 2019: Migração, Deslocação e Educação – Construir Pontes, Não Muros. Brasília: UNESCO Angola; Paris: UNESCO, 2019.

 

Fotografia de Vítor Burity da Silva

Vítor Burity da Silva, natural do Huambo, Angola, a 28 de Dezembro de 1961. Professor Honorário; Doutor Honorário em Literatura; Ph.D em Filosofia das Ciências.

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