OTELO
defronte ao tabuleiro de xadrez
medita o gesto
o peão o cavalo a torre o bispo
a rainha
e o rei a proteger
sabe do risco de avançar
mas há que jogar
porque
nas suas mãos
detém o olhar da madrugada
de todas as alvoradas
SALGUEIRO MAIA
trazia os mapas da vontade
de um ir e cumprir
fazer do sonho um corpo imenso
que rompe a mordaça
do silêncio
e liberta a voz de um povo
inteiro
num dia nado cristalino
MANUEL ALEGRE
há sempre um caminho
de regresso
uma ítaca entre as sombras
de um bojador
quem o diz
é esta voz
que sopra contra o vento
escuta
o seu murmúrio ensina
que o exílio é somente
o corpo deslocado
DIAS COELHO
na rua um cinzel tombado
recusa-se a cinzelar
na rua dos lusíadas
não queria demandar
as novas
para além do chão onde se deitava
ao seu lado
a mão pousada
a mesma que lhe dera movimento
enquanto a infâmia seguia
rua abaixo
com mãos de sangue
sangue que a água do tejo
se recusa a lavar
in “25 CRAVOS DE ABRIL” (Menção Honrosa (Poesia) no 1.º Concurso de Conto e Poesia da CGTP-IN – 2007, promovido pela CGTP-IN). In “Conto e Poesia – Concurso CGTP-IN”, Departamento de Cultura e Tempos Livres – CGTP-IN, co-edição de AE, Artes do Espectáculo, Lda, Julho de 2009, sob o nome de Pedro Baptista; volume incluído em “Viagem pelos livros”, Escrituras Editora, São Paulo, Brasil, 2011.
Xavier Zarco (Coimbra, 1968), estreou-se em 1998 com “O livro dos murmúrios”. Editou cerca de quarenta obras. Recebeu vários prémios
entre os quais se destacam: Prémio de Poesia Vítor Matos e Sá – 2004 e
2007; Prémio de Poesia do Concurso Literário Manuel Maria Barbosa du
Bocage – 2005 e 2010; Prémio de Poesia Raul de Carvalho – 2005; Prémio
Literário da Lusofonia – 2007; Prémio Nacional de Poesia Sebastião da
Gama – 2017, Prémio de Poesia Judith Teixeira – 2022 e Prémio
Literário Aldónio Gomes – 2023. Em 2011, editou toda a obra publicada
em Portugal no Brasil sob o título: “Viagem pelos livros”
(Escrituras). O seu último título é “Sísifo Liberto”, Prémio Literário
Carlos Carranca – 2024 (Câmara Municipal da Lousã, 2024).