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Península Ibérica e a crise da moradia: saturação urbana e abandono das áreas rurais em Portugal e Espanha | Wesley Sá Teles Guerra

foto: imigrantes brasileiros morando em cabanas, em Carcavelos, Cascais.

A Península Ibérica tem testemunhado um processo contínuo de desindustrialização em diversas regiões de Portugal e Espanha, já seja devido à concorrência asiática ou à mobilização dos centros produtivos a países terceiros onde o custo de operação é menor e por último à centralização da produção em grandes áreas metropolitanas tais como Porto, Lisboa, Braga, Madrid, Barcelona e Bilbao.

 

Mapa de densidade demográfica da Península Ibérica.

 

O que tem resultado na concentração da população nessas grandes cidades e o aumento dos problemas derivados da ocupação urbana, diante de uma perda contínua de habitantes em regiões do interior.

 

Esse movimento tem desencadeado uma série de problemas sociais e econômicos, incluindo o êxodo rural, o aumento da migração de jovens para outras partes da Europa e a escassez de oportunidades de emprego nas pequenas cidades, gerando um ciclo sem fim de escassez e um aumento da desigualdade. 

 

A crise da moradia também tem se intensificado, com um aumento exorbitante do valor do metro quadrado nas grandes cidades devido ao incremento da demanda, fruto da mobilização demográfica, tornando-as inacessíveis para grande parte da população de renda média, a chamada “Pobreza Laboral” (pessoas que ainda que estejam trabalhando não conseguem manter os custos básicos de vida) tem sido uma constante nas grandes cidades Ibéricas e também refletida tanto na população local como nos imigrantes. 

 

A falta de projetos eficientes para a revitalização e fixação das áreas rurais tem contribuído para o esvaziamento demográfico da Espanha e de Portugal, gerando verdadeiros desertos demográficos em ambos os países. Por outro lado,  a incompatibilidade crescente entre os custos de vida e os salários médios tem levado a um padrão preocupante de empobrecimento e dificuldades econômicas para uma grande parcela da população. Se no campo tem casas a um baixo custo, não existem ofertas laborais nem serviços, já nas cidades, se existe emprego o mesmo não é suficiente para manter o custo de vida, gerando um grande paradoxo, onde convivem cidades saturadas e outras que simplesmente lhe pagam para morar nelas.

 

foto: imigrantes brasileiros morando em cabanas, em Carcavelos, Cascais.

 

As consequências dessa crise generalizada são profundas e duradouras. Em muitas áreas rurais, a falta de infraestrutura e serviços básicos, como hospitais e escolas, tem levado as comunidades locais a um estado de abandono e isolamento. A deterioração das condições de vida nessas regiões tem provocado um círculo vicioso de despovoamento e falta de investimento, o que agrava ainda mais a situação.

 

Por outro lado, não somente a demanda do metro quadrado aumenta nas grandes cidades, mas também a demanda de serviços públicos, saturando e reduzindo os níveis de prestação dos mesmos.

 

saturação urbana e abandono das áreas rurais em Portugal e Espanha_3”: Manifestações em Lisboa pela crise da moradia. By Joana Azevedo Viana /RR

 

A imigração, que para muitos se desenhava como uma solução, se transformou em parte do problema já que grande parte das comunidades vindas de outros países se concentram nas grandes cidades diante da falta de oportunidades no interior.

 

A Espanha, em particular, tem sido afetada por esse esvaziamento demográfico, resultando em um desequilíbrio significativo entre as regiões urbanas e rurais. Muitas áreas rurais enfrentam uma crise existencial, com a juventude migrando para centros urbanos mais desenvolvidos e para outros países em busca de melhores oportunidades. Da mesma forma, algumas regiões de Portugal estão sofrendo com um problema semelhante, com o despovoamento de áreas rurais e a consequente perda de tradições e cultura locais.

 

Se medidas eficazes não forem tomadas para lidar com essa crise, a Península Ibérica corre o risco de perder parte significativa de sua identidade e de seu potencial econômico além de sua população, dando lugar a grandes áreas despovoadas e carentes de atividade econômica e de potencial para o desenvolvimento, uma estrutura muito mais parecida aos das nações emergentes que a países desenvolvidos… É crucial desenvolver estratégias abrangentes e sustentáveis que incentivem o desenvolvimento equilibrado em todo o território, promovendo oportunidades econômicas e de vida digna tanto para áreas urbanas quanto para as rurais. Investimentos em infraestrutura, educação, serviços de saúde e incentivos para a criação de empregos locais são essenciais para reverter a atual tendência de despovoamento e abandono das áreas rurais.

 

Diversos vilarejos em Espanha e Portugal estão abandonados.

 

“O rural Ibérico clama por um sistema de impostos e de subvenções específicos para gerar uma fixação da população e novas oportunidades para a população mais jovem”

Wesley.S T Guerra

 

É fundamental que os governos de Portugal e Espanha reconheçam a urgência dessa situação e implementem políticas abrangentes que incentivem o crescimento equitativo e sustentável em todo o território da Península Ibérica. O futuro da região depende de uma abordagem integrada e colaborativa que valorize e revitalize tanto as áreas urbanas quanto as rurais, promovendo um equilíbrio saudável entre desenvolvimento econômico e preservação das tradições locais e da qualidade de vida. A hora de agir é agora, antes que a crise atinja proporções irreversíveis e a imigração tem um papel fundamental nesse processo, caso contrário aumentará a insatisfação social, as tensões urbanas, o desequilíbrio dos serviços e a falta de desenvolvimento homogêneo em ambos os países. 

 

Fotografia de Wesley Sá Teles Guerra

 

Wesley Sá Teles Guerra, formado em Negociações Internacionais pelo Centre de Promoció Econômica del Prat de Llobregat (Barcelona), Bacharel em Administração pela Universidade Católica de Brasília, Pós-graduado em Ciências Políticas e Relações Internacionais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, MBA em Marketing Internacional pelo Massachussetts Institute of Business, MBA em Parcerias Globais pelo ILADEC, Mestrado em Políticas Sociais com especialização em Migrações pela Universidade de A Coruña (Espanha), Mestrado em Gestão e Planejamento de Cidades Inteligentes (Smartcities) pela Universitat Carlemany (Andorra) e doutorando em Sociologia e Mudanças da Sociedade Contemporânea Internacional. 

Atuou como paradiplomata e especialista em cooperação internacional e smartcities para a Agência de Competitividade da Catalunha (ACCIÖ – Generalitat de Catalunya), atualmente é colaborador sócio do Instituto Galego de Análise e Documentação internacional (IGADI) e do Observatório Galego da Lusofonia (OGALUS), Também participa como coordenador da área de Economia, Ciência e Tecnologia do CEDEPEM – UFF.

Idealizador e diretor do CERES – Centro de Estudos das Relações Internacionais, membro do Smart City Council, do IAPSS International Association for Political Sciences Studentes, do Consório Europeu para a Pesquisa Política, REDESS, Centro de Estratégia e Inteligência das Relações Internacionais e colaborador da ANAPRI.

Autor dos livros ”Cadernos de Paradiplomacia” (2021) e “Paradiplomacy Reviews” (2021) além de participar do livro “Experiências de Vanguarda, no ensino nos países lusófonos” publicado em 2021 pelo CLAEC e organizado pela Dra. Cristiane Pimentel. 

Professor, articulista e especialista: wesleysateles@hotmail.com



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