Política

Privatização de empresas públicas: uma solução inadequada para a corrupção no Brasil e no mundo | Wesley Sá Teles Guerra

A privatização de serviços públicos tem sido uma estratégia adotada por muitos países na busca por melhorar a qualidade e reduzir os gastos. No entanto, a implementação dessa ideologia mercadológica e empresarial nem sempre alcança os resultados desejados. Na verdade, muitas vezes ela leva a efeitos contraproducentes, como a concentração da infraestrutura em áreas de alta demanda e a falta de investimentos em regiões com pouca demanda ou de população reduzida. Além disso, a privatização não resolve o problema da corrupção, podendo, inclusive, acentuá-lo. Este artigo discutirá a relação entre a privatização de empresas públicas e a corrupção, argumentando que apenas privatizar sem promover mudanças nos valores culturais e sociais de um país é insuficiente para solucionar esse problema e algo que vemos frequentemente nas estatais privatizadas no Brasil e no resto do mundo.

 

A privatização e lógica de mercado: 

 

Ao privatizar empresas públicas, elas são inseridas no contexto de uma lógica de mercado, voltada para a busca de lucro e redução de custos. Isso pode levar à concentração dos serviços nas áreas de maior demanda, deixando regiões menos rentáveis desprovidas de atendimento adequado. Algo frequente é perceptível por exemplo com a privatização do transporte público, que dá prioridade às áreas de alta demanda e reduz a oferta em áreas de baixa população agravando os fluxos demográficos e a fixação da população local.

 

 

Foto: Povoado Abandonado em Portugal vítima do êxodo urbano e falta de infraestrutura.

 

A lógica de oferta e demanda pode dificultar a universalização dos serviços públicos, já que regiões com menor demanda tendem a ser negligenciadas pelos investidores privados e vistas como áreas de baixo interesse por não gerar lucros da mesma forma que áreas densamente povoadas. Na Europa, vemos isso na distribuição de médicos, professores, transporte e no Brasil mais do mesmo…

 

 

 

Foto: Estação de Trem Abandonada na Espanha por falta de“demanda” deixando incomunicados mais de 50 municípios.

 

Sonegação de impostos:

 

Um dos problemas enfrentados após a privatização de empresas públicas é o aumento da sonegação de impostos. Algumas empresas, em busca de maximizar seus lucros, adotam estratégias questionáveis para reduzir suas obrigações fiscais. Isso resulta em perdas significativas para as contas públicas, afetando a capacidade do Estado de prover serviços e investimentos em benefício da sociedade como um todo, já agravado pela lógica empresarial do lucro e demanda.

 

Contexto político e social:

 

 A privatização de empresas públicas ocorre dentro de um determinado contexto político e social, no qual os participantes possuem valores e interesses diversos. Embora a gestão dessas empresas possa estar focada no lucro, é importante reconhecer que as pessoas envolvidas têm valores sociais e culturais que vão além das organizações. A corrupção não é um fenômeno exclusivo do setor público, e a privatização não garante automaticamente uma mudança nos valores culturais e sociais que perpetuam a corrupção. De modo que privatizar uma empresa em países onde a corrupção está arraigada em determinados processos sociais no intuito de eliminar a mesma é uma falácia. Vemos exemplos disso na Rússia e no Brasil, além de outros países… Assim mesmo, motivar uma mudança cultural a nível nacional é cada vez mais difícil pela crescente falta de recursos dos Estados, sendo um círculo que se retroalimenta.

 

Soluções além da privatização: 

 

Para combater efetivamente a corrupção, é necessário ir além da simples privatização. Medidas como fortalecer os sistemas de controle e fiscalização (ou seja, fortalecer o papel fiscalizador do Estado e seu judiciário), promover a transparência, capacitar servidores públicos, envolver a sociedade civil e fortalecer os valores éticos são fundamentais, de modo que privatizar para enfraquecer o Estado é um tiro no pé de quem prega o fim da corrupção… Além disso, investir em educação e conscientização sobre a importância da integridade e da responsabilidade social pode contribuir para uma mudança cultural mais profunda e duradoura.

 

 

Foto: Vale, mineradora privatizada que se encontra na lista de uma das maiores empresas em sonegar impostos à federação.

 

A privatização de empresas públicas pode não ser a solução adequada para o problema da corrupção. Embora possa trazer benefícios em termos de eficiência e redução de custos, a falta de regulação e a manutenção dos valores culturais e sociais arraigados podem agravar a corrupção. Para combater efetivamente esse problema, é necessário adotar medidas mais abrangentes que promovam a transparência, fortaleçam os sistemas de controle e fiscalização, e estimulem uma mudança cultural em direção à integridade e responsabilidade social. Somente assim poderemos avançar em direção a uma sociedade mais justa e transparente, independentemente do setor de propriedade das empresas que prestam serviços públicos.

 

 

Wesley Sá Teles Guerra, formado em Negociações Internacionais pelo Centre de Promoció Econômica del Prat de Llobregat (Barcelona), Bacharel em Administração pela Universidade Católica de Brasília, Pós-graduado em Ciências Políticas e Relações Internacionais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, MBA em Marketing Internacional pelo Massachussetts Institute of Business, MBA em Parcerias Globais pelo ILADEC, Mestrado em Políticas Sociais com especialização em Migrações pela Universidade de A Coruña (Espanha), Mestrado em Gestão e Planejamento de Cidades Inteligentes (Smartcities) pela Universitat Carlemany (Andorra) e doutorando em Sociologia e Mudanças da Sociedade Contemporânea Internacional. 

Atuou como paradiplomata e especialista em cooperação internacional e smartcities para a Agência de Competitividade da Catalunha (ACCIÖ – Generalitat de Catalunya), atualmente é colaborador sócio do Instituto Galego de Análise e Documentação internacional (IGADI) e do Observatório Galego da Lusofonia (OGALUS), Também participa como coordenador da área de Economia, Ciência e Tecnologia do CEDEPEM – UFF.

Idealizador e diretor do CERES – Centro de Estudos das Relações Internacionais, membro do Smart City Council, do IAPSS International Association for Political Sciences Studentes, do Consório Europeu para a Pesquisa Política, REDESS, Centro de Estratégia e Inteligência das Relações Internacionais e colaborador da ANAPRI.

Autor dos livros ”Cadernos de Paradiplomacia” (2021) e “Paradiplomacy Reviews” (2021) além de participar do livro “Experiências de Vanguarda, no ensino nos países lusófonos” publicado em 2021 pelo CLAEC e organizado pela Dra. Cristiane Pimentel. 

Professor, articulista e especialista: wesleysateles@hotmail.com

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