Poesia & Conto

Poemas | Márcia Maranhão de Conti

onde

 

eis-me pele e pensamento

preciso apoiar o peso do vazio

estou imensa e nua

não me encontro no meu corpo

mas não sei onde busco

 

eis-me onde não estou

cravo as unhas no tecido

e os meus pés se tocam

estou viva

 

onde estará o tempo?

 

        distância

 

um pequeno barco 

na lonjura do mar

 

sou eu quando acordo

minha palidez

e o nada

 

talvez seja o perfume

que sem ver espalho

 

so-li-tu-de

pronuncio e gosto

 

solitude é a noite

dentro do quarto

 

solitude 

são os meus passos.

 

    tesouro 

 

se inverno só

preludio o pensamento

petalo os dedos 

ao poema primavero

todas primaveras

todas flores

 

minhas mãos, uma corola

meus braços, um cabo verde

balouçando à brisa.

 

para o nada

 

escrevo para o nada

para o vão que habita entre as letras

 

escrevo para a extrema inutilidade da vigília

no meio do olho da noite

para o mínimo bulício do silêncio

esse que se escuta feito acalanto de sombras

 

escrevo para ver se me vejo

se concebo os traços que o espelho oculta

te molhar com minhas águas

te levar uma flor

 

escrevo-te menina

 

para subir na montanha mais alta

a que tocava o azul, eu sempre queria

para estar comigo mais perto

como se íntimo o mistério parasse

mas não para, cresce

até além da montanha

até para lá da nuvem

e debaixo do leito do rio

 

escrevo para o meu próprio leito

dou-me esse gozo

de acordar do nada

e ir-me.

 

            caça

 

eu me espero do outro lado
me olho e me indago
por que não vens?
eu me respondo
não sei
não tenho as rédeas do vento
é ele quem me leva para fora

 

para longe


eu me olho vagamente
também não entendo a resposta
nem a pergunta que faço
essa conversa obtusa
esse atroar do nada


eu me viro de costas para os meus olhos
para que tanto afã?
melhor eu me deixar um pouco
melhor eu me dar um tempo
eu me aguardo do mesmo lado
esse vício me constrange.

 

 


            às vezes

o rastro das patas pelo quarto
um resto do cheiro selvagem
o corpo exausto

se eu visse o espelho
veria os olhos fundos
e os ares de vigília

um quê de caça frustrada
amor que não sai do flerte
e consome a vida

o poema, às vezes, esse bicho.

 

 transparência 

 

transparência difusa
dos poros ao tempo
em que me derramo

canto e canto
meu eu extremo
aos píncaros
ao solo

em luas e estrelas
que eu tramo
e me falo

transparência imensa
oceano
de azuis e escuros
que eu ilumino

sim, eu clareio
com o meu canto
desfio as cores

transparência rara
que eu cultivo
como flor do deserto
que não morre.

       textura

 

  a noite e os azuis

ternuras

diminutas flores

 

peixes cantando

assovios 

um riacho num bosque

 

a noite e as fragrâncias

das músicas solitárias

 

eu, assustada

triste e feliz

entrelaçada comigo

em um jardim confuso.

 

 

Fotografia de Márcia Maranhão de Conti

 

Márcia Maranhão de Conti: Nutricionista e advogada, publicou, em 2011, ‘’Luar nos Porões – Piano mudo’’, no programa ‘’Prosa e Verso’’ da Secretaria Municipal de Cultura de Goiânia. O livro foi acolhido por poetas e críticos (Gilberto Mendonça Teles, Álvaro Alves de Faria, Flora Figueiredo, Gabriel Nascente, João de Jesus Paes Loureiro, Nei Duclós e Rubens Jardim, entre outros). 

Em 2013, seu livro de poesia ‘’Na Fissura do Vestido’’ foi premiado com a bolsa Hugo de Carvalho Ramos. 

Participou, como autora, do livro ‘’ Essas Mulheres’’, 2021, da editora Recriar, organizado por Ronaldo Cavalcante, com prefácio de Mia Couto, e com um poema no livro ‘’ A Caligrafia de Dona Sofia’’ de André Neves, Edições Paulinas, 2021.

Em abril de 2022, foi a poeta homenageada no Sarau Gente de Palavra em São Paulo, organizado por Rubens Jardim e César Augusto de Carvalho.

Foi premiada nos concursos, participando das respectivas antologias: 3º lugar no V e VI Concurso Kelps de Poesia Falada 2005 / 2007; 2º lugar no 5º Prêmio Nacional de Poesia Cidade Ipatinga- 2007; selecionada no IV Prêmio Literário Canon de Poesia / 2011 e II Concurso de Poesias da Revista Literária/2011;  2º lugar  no 10º Prêmio Nacional de Poesia – Cidade Ipatinga. Selecionada nos concursos Poemas no Ônibus e no Trem de 2007/2009/2011. Prêmio TOC 140 da Fliporto (Festa Literária Internacional de Pernambuco/2013. Seu poema ‘’Serventia’’ ficou entre os 10 melhores entre mais de 1100 inscritos avaliados pela comissão julgadora, na votação on line, em rede social,  ficou em 5º lugar. Ganhou o prêmio de ‘’Melhor Intérprete’’ no ‘’Concurso de Poesia Falada Geraldo Coelho Vaz – 50 anos de Literatura’’, em 2009. 

Participou das  antologias: Vinte e Cinco Anos de Poesia – Coletânea Comemorativa do Clube dos Escritores de Ipatinga (2011);  Poetas Em/Cena – Reunião de poemas brasileiros no 8º Belô Poético, 2012; 32ª Mini Revista Literária, 2012 ;  Poema de Mil Faces e Revista Varal do Brasil (virtuais), 2012; Sarau na Paulista, organizado por Rubens Jardim e Cesar Augusto, publicado pela Editora Patuá, 2019;  As Mulheres Poetas na Literatura Brasileira, organizado por Rubens Jardim, publicado pela Patuá. 2019; Rubens Jardim (antologia em homenagem ao poeta), publicado pela Patuá, 2019; Parem as Máquinas, pela Off Flip, 2020; Festival de Poesia Falada, da Academia Goiana de Letras, 2022.

Foi publicada em diversos jornais, blogs, sites e revistas literárias, entre eles, http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/goias/marcia_maranhao_de_conti.html;

https://www.germinaliteratura.com.br/2021/marcia_maranhao_de_conti.htm;

http://www.sermulherarte.com/2020/04/a-palavra-acesa-de-marcia-maranhao-de.html;

https://comoeuescrevo.com/marcia-maranhao-de-conti/;

https://revistacaliban.net/%C3%A9den-na-l%C3%ADngua-539f6b785f16?gi=a0737857a8d2;

https://ubegoias.wordpress.com/2020/05/28/a-vitima-por-marcia-maranhao-de-conti/;

https://nuhtaradahab.wordpress.com/2013/11/27/marcia-maranhao-de-conti-poesias-avulsas/;

https://pt.slideshare.net/roberley/memento-mori-v-noite-de-poesia-mrcia-maranho-de-conti-presentation;

https://www.literaturaefechadura.com.br/tag/tres-poemas/;

Participou dos recitais :

‘’Poemas e Canções de Amor’’, com o Grupo Fé Menina e o poeta Rubens Jardim, na Oficina Cultural Geppetto, Goiânia, 6/2012;  Casa das Rosas e Praça Benedito Calixto,  São Paulo, 9/2012, Sesc de: Goiânia, Pirenópolis, Brasília e outras cidades.  Além da poesia e do roteiro dos shows, participou com a leitura dos textos. 

80° Recital Quinta Poética, por Escrituras Editora em 10/2015 na Casa das Rosas..

Festival de Poesia Falada da Academia Goiana de Letras, Goiás Velho, 09/2022.

Seu poema Flor foi para camisetas de catadores de papel de Porto Alegre a pedido do canadense, professor universitário, Denis Beauchamp, que presidiu uma associação voltada para esses trabalhadores.




Qual é a sua reação?

Gostei
0
Adorei
3
Sem certezas
0

Também pode gostar

Os comentários estão fechados.