Cultura

Pela identidade cultural capixaba | Oscar Gama Filho

Para José Augusto Carvalho, meu eterno mestre

 

A presente História da Literatura do Espírito Santo nos agracia com vários paradoxos lógicos a serem descobertos.

 

Um dos paradoxos lógicos que ela oferece recebe o nome popular de Identidade Cultural Capixaba. Paradoxos dos mentirosos, como este, convidam filósofos a reflexões aparentemente sem solução do tipo “se uma árvore caiu na floresta e ninguém percebeu, ela caiu?”. Uma pessoa menos complicada resolveria: “ora, se a frase diz que a árvore caiu, então ela caiu!” Semelhante proposta é a da busca da Identidade Cultural Capixaba. Não que seja desnecessária — muito pelo contrário. No entanto está equivocada quanto às premissas usadas para interrogar, qual esfinge, o seu objeto de estudo e, daí, descrevê-lo e explicá-lo.

 

Melhor transformar, então, provisoriamente, por mágica, Identidade em Ideologia da Cultura Capixaba. Abordaremos, por essa transformação alquímica, sua função, sua história, sua formação, seu desenvolvimento e a sua relação com a produção de um Capital Cultural Regional. Daí, seguiremos até que nossas palavras gritem, para nos fazerem compreender o processo de construção do lugar periférico da cultura capixaba.

 

I – POR QUE SOMOS CAPIXABAS?

Qual a origem de capixaba? A versão corrente, aceita entre os pesquisadores, concorda que capixaba significava, primitivamente, talvez desde o século XVI, a lavoura ou roça que se estendia da atual Rua Barão de Monjardim até à região da antiga Capitania dos Portos. Com o passar do tempo, por uma extensão metonímica, a coisa possuída — a plantação — passou a ser a denominação concedida primeiro aos seus possuidores e, por fim, a todos os habitantes da ilha de Vitória. Posteriormente, talvez porque Vitória seja a sua capital, os naturais de qualquer parte do Espírito Santo passaram a receber esse epíteto.

 

II – O PRINCÍPIO DA IDENTIDADE

A palavra identidade deriva de idem, que significa o mesmo. Estaríamos diante, portanto, de um projeto estruturalista de procura do invariante presente nas diversas e contrastantes microrregiões culturais capixabas? Onde se encontra esse conjunto interseção, esse graal, essa pedra filosofal que as más línguas apelidaram de “logicamente inconsistente”?

 

Sabemos que ninguém pensa além da linguagem e que a Identidade Cultural é um subconjunto da cultura nativa. Ferdinand de Saussure enriquece nossa óptica, mostrando que os elementos da linguagem não possuem uma essência positiva independente. O sentido de uma palavra é definido negativamente pelas relações de diferença mantidas com todos os demais elementos do sistema. Para ele, na língua só há diferenças, e o mecanismo linguístico gira totalmente sobre identidades e diferenças:

 

“Quando se diz que os valores correspondem a conceitos, subentende-se que são puramente diferenciais, definidos não positivamente por seu conteúdo, mas negativamente por suas relações com os outros termos do sistema. Sua característica mais exata é ser o que os outros não são.” (SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de linguística geral. 27. ed. São Paulo: Cultrix, 2006, p.136) 

Para entendermos isso melhor, pensemos no caso de um cego de nascença que recuperasse a visão em uma casa completamente azul. Nós não conseguiríamos que ele compreendesse o que é o azul até lhe mostrarmos as outras cores. O azul é o que não é verde, roxo, amarelo, branco, vermelho, negro etc. O azul não possui um sentido independente e só pode ser compreendido por meio de suas relações de diferença com as demais cores e elementos do sistema.

 

Se a Identidade resulta das relações de diferença do sistema linguístico, então a Identidade Cultural Capixaba também não possui uma essência nítida: ela é o que as demais identidades não são. Ou seja: sua característica mais exata é ser “o que as outras não são”: a Identidade Cultural Capixaba é aquela que não é a mineira, não é a carioca, não é a baiana, não é a italiana — não é nenhuma das outras do seu sistema. 

 

Freud enriquece nossa abordagem: a percepção da diferença, pelas crianças, na fase fálica, é a instauradora do complexo de castração que, constituindo o apogeu do Édipo, permite a formação do superego. Sem a diferença, estaríamos definitivamente condenados à privação do superego e à neurose narcísica, sinônimo de psicose.                     

 

Heidegger, em O Princípio da Identidade, nos adverte de que a busca da identidade diverge da procura matemática da igualdade, expressa com singeleza na fórmula A=A:

 

“Que diz a fórmula A=A, em que ordinariamente se apresenta o princípio da   identidade? A fórmula designa a igualdade de A e A.  De uma equação fazem parte ao menos dois elementos. Um A se assemelha a um outro. Quer o princípio da identidade expressar tal coisa? Manifestamente não. O idêntico, em latim idem, designa-se em grego tò autó. Traduzido em nossa língua, tò autó significa o mesmo.  Se alguém repete sem cessar o mesmo, por exemplo, a planta é planta, exprime-se numa tautologia. Para que algo possa ser o mesmo, basta cada vez um. Não é preciso dois como na igualdade.

 

A fórmula A=A fala de uma igualdade. Ela não nomeia A como o mesmo. A fórmula corrente para o princípio da identidade encobre, por conseguinte, justamente o que o princípio quereria dizer: A é A, quer dizer, cada A é ele mesmo o mesmo.” (HEIDEGGER, Martin. O Princípio da identidade. In:— Conferências e escritos filosóficos. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p.179. Coleção: Os Pensadores)

 

A tarefa aumenta, portanto, em complexidade. Não basta acharmos elementos iguais em várias partes do Espírito Santo. Nem nos compararmos com outras Identidades. Não é tão simples assim. A inviabilidade ou a impossibilidade dessa tarefa de forma alguma elimina a possibilidade ou a necessidade da existência da Identidade Capixaba. A Identidade é uma unidade logicamente incomparável, ainda que se preste a ser comparada. Analogamente, em psicologia, erram os leigos que se referem a alguém como “sem personalidade”, quando todos a possuem, por tíbia, frágil ou sem brilho que seja. Continua Heidegger:

 

“O que o princípio da identidade, quando ouvido em seu teor fundamental, expressa, é exatamente aquilo que todo pensamento ocidental-europeu pensa, a saber, isto:  a unidade da identidade constitui um traço fundamental no seio do ser do ente. Em toda parte, onde quer que mantenhamos qualquer tipo de relação com qualquer tipo de ente, somos interpelados pela identidade. Se não falasse este apelo, então o ente jamais seria capaz de manifestar-se em seu ser como fenômeno. Por conseguinte, também não haveria nenhuma ciência. Pois se não lhe fosse garantida previamente e em cada caso a mesmidade de seu objeto, a ciência não poderia ser o que ela é.” (Ibid., p.180.)

 

Concluímos que nem tampouco o Espírito Santo poderia ser o que visivelmente é sem a relação entre o Estado e seus habitantes, o que, automaticamente, gera a Identidade intuída por muitos. Para Heidegger, citando o pré-socrático Parmênides,identidade é tanto pensar (aprender) quanto ser. Daí ele deriva a equação “o ser faz parte da identidade” e mostra que a Identidade Capixaba estaria na semente de onde surgiu o ser do Estado do Espírito Santo. Em suma, não parece correto imaginar que o Espírito Santo deveria, hoje, produzir sua Identidade: o Estado surgiu dela, ou seja, o ser e o pensar capixaba surgiram de uma Identidade pré-existente, culturalmente difusa por não possuir uma teoria que a explicitasse.  Mas uma Identidade que em tudo podia ser intuída e que emana das páginas dos primeiros cronistas. Bem como de José de Anchieta. Ainda Heidegger: 

 

“É preciso que reconheçamos: nos primórdios do pensamento, muito antes de a identidade se formular em princípio, fala ela mesma, e precisamente, através de um dito que dispõe: Pensar e ser têm seu lugar no mesmo [n.do A: na identidade] e a partir deste mesmo formam uma unidade. (…) O ser é determinado a partir de uma identidade, como um traço desta identidade. Pelo contrário, a identidade, mais tarde pensada na metafísica, é representada como um traço do ser.” (Ibid., p. 180-1). 

 

Lembremo-nos do óbvio ululante antropológico dos meninos-lobos: uma criança criada entre os animais, sem contato com outras pessoas, não se torna um ser humano. É necessária uma Identidade Cultural Humana para produzir o ser, o pensar e a existência com outros que caracterizam um homem. É preciso, a priori, a Identidade Capixaba para que seja produzido o ser e o pensar do Espírito Santo. E esta Identidade só pode ser considerada dentro da redução fenomenológica — a epoquê —, que colocaria o Espírito Santo entre parênteses, eliminando a existência efetiva do mundo exterior e retirando-o de uma posição comparativa que nada esclarece. Nenhuma Identidade Cultural   — japonesa, italiana, alemã — resiste a uma “literatura comparada” entre seus traços típicos e os de outros países, onde também se encontram, ou, mesmo, de onde se originaram. 

 

A Identidade Cultural é intertextual: um mosaico vivo em que centenas de nações dialogam, absorvendo, destruindo e transformando interminavelmente os seus elementos; é um subconjunto de um conjunto maior formado pela Identidade Humana. Não há uma Identidade original. E nem a Identidade Capixaba merece a classificação de primitiva, de inferior ou de rústica. Lévi-Strauss demonstrou, referindo-se a sociedades ágrafas, que não existe cultura primitiva ou inferior a outra: todas são adultas, incomparáveis e elaboradas. A visão do primitivo ou rudimentar seria uma projeção das próprias deficiências do investigador contaminado pelo etnocentrismo (citamos de memória).

 

Com facilidade podemos localizar os elos de identificação — entre as microrregiões — que construíram a malha de teia em que se situa a Individualidade Cultural Capixaba.

 

Se, como postula a psicanálise, a aquisição da personalidade humana, pela criança, ocorre por meio do processo de identificação, as microrregiões culturais também estruturaram seu ego através desse mecanismo. Lembremos, en passant, que eu, tradução da palavra latina ego, tem sido empregada como sinônimo de identidade

 

Cabe, aqui, um parêntese: segundo Laplanche e Pontalis, a identificação é o “Processo psicológico pelo qual um indivíduo assimila um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo dessa pessoa. A personalidade constitui-se e diferencia-se por uma série de identificações.” (LAPLANCHE, J & PONTALIS, B. Vocabulário de psicanálise. 9. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1986, p. 295).

 

Sua importância é fundamental. O próprio Freud, aliás, nos mostra que ela vai além da imitação e tem como base a relação entre fantasias inconscientes comuns às pessoas ou aos objetos que são alvo da identificação.

 

Além disso, há, interligando seus elos, mecanismos semiológicos criadores de um sistema único: as microrregiões têm, como conjunto interseção, o fato de pertencerem ao Espírito Santo, de voltarem os olhos para sua capital, de se encontrarem sob um mesmo Governo, de serem submetidos à manipulação cultural por meios de comunicação de massa comuns, de possuírem símbolos estaduais idênticos e de construírem os microssistemas literários a que se refere Paulo Roberto Sodré, em sua Apresentação. Esses mecanismos criaram uma linguagem capixaba peculiar e plasmaram uma massa ideologicamente homogênea e distinta da que é encontrada no exterior ou em outras unidades da federação, mas que se amalgamam e se confundem com o macrossistema literário brasileiro.  

 

A identificação preserva e interioriza aquilo que há de semelhante entre suas possibilidades genéticas de ser e o objeto de identificação externo. Por analogia, percebemos que as microrregiões culturais possuem uma identificação, pois há partes de uma microrregião apropriadas por outra, sem que pertençam às suas características típicas: encontramos moqueca no funil teuto-italiano e sopa de capelete em Guarapari. A microrregião, em sua gênese, quando ainda não apresentava características definidas, buscou o que havia para se identificar — em outra — e o jogou para dentro de si, assimilando-a e adquirindo personalidade graças a esse processo.  

 

Cada microrregião se identificou, portanto, com elementos da realidade alheia e os incorporou a si, ou aos espaços vazios que possuía, preenchendo-os em tudo que não era determinação filogenética anterior, de acordo com suas possibilidades genéticas pré-determinadas pela Identidade Cultural que, como vimos com Heidegger, determinam o ser e o pensar. 

 

Realmente, correspondendo ao conceito freudiano de fantasias primitivas ou protofantasias — de origem filogenética —, as microrregiões possuem uma carga filogenética ditada pela proximidade umas das outras, pela história, pela topografia, pelos acidentes geográficos, por respirarem partículas semelhantes do cosmo, pelo fato de serem montanha, planície ou beira-mar e, naturalmente, por elementos imperceptíveis, pois residem em seu inconsciente coletivo. Constituiriam o que os enólogos chamariam de terroir capixaba —, conjunto de traços regionais que tornam um vinho diferente de outro de mesma cepa, mas plantado em local distinto.

 

III- DE COMO NASCEU O BRASIL

Voltemos ao momento do parto, do nascimento do Estado brasileiro. Tudo fica claro-sangue e o século XVI incha como o útero da mãe-terra prestes a dar à luz o monstro gerado sem a participação paterna. Sim, o Brasil nasceu por clonagem, sem o pai que caracteriza o surgimento de qualquer Estado: o povo.

 

Colônia criada “por decreto”, no Brasil quinhentista, paradoxalmente, as leis, as instituições, o governo e a religião foram preparados e implantados fora daqui, no estrangeiro Portugal, a priori, de cima para baixo, antes da presença daquele elemento que deveria produzi-los: o povo. Por incrível que pareça, na formação nacional, o Estado precedeu o povo. Qualquer semelhança com a atualidade não é mera coincidência. E, se não havia povo, não se pode dizer que existia pátria. Os únicos que, nesse pré-Brasil, possuíam algo parecido com a noção de pátria — se é que tinham — eram os índios. A pátria dos brancos obviamente estava em Portugal. Como o povo existente — o gentio — não constituía o povo brasileiro, muito menos capixaba ou português, e não tinha a confiança da Coroa, tornou-se necessário procurar dissolvê-lo cultural e fisicamente para se formar um outro. 

 

A criação de um Estado sem a participação popular produziu sérios problemas. Sem pai, não foi possível a ocorrência da castração edípica. Sem a castração edípica, não aconteceu a introjeção da proibição paterna, base do superego. Sem superego, não pudemos contar com uma instância censória, com uma moral verdadeira.

 

Sua condição marginal à lei desde sempre inscreveu o Brasil em um processo que, inicialmente obsessivo, com seus rituais — religiosos, políticos, culturais, científicos, esconjuradores de um mal invisível, mas presente, evoluiu para um quadro psicótico. Desprovido da marca legal primitiva, ele não pôde se inscrever na lei, nem tampouco aceitá-la. Restou-lhe apenas o espaço vital da loucura.

 

Concluímos que a esquizofrenia do país se originou no fato de que o Estado brasileiro surgiu antes do seu pai. Vivíamos, até há pouco, no segundo momento, em que o surto havia fragmentado e dissociado o Aparelho de Estado, transformando-o no espírito dividido a que se refere a origem etimológica de esquizofrenia. Esse resultado aponta, sempre e necessariamente, para um caco-átomo indivisível, resistente ao processo de desintegração, que a Identidade traduziria, por seu caráter de unidade pré-existente.

 

Porém talvez já esteja ocorrendo esta recuperação, esta saída da psicose esquizofrênica em direção ao ingresso em um quadro de neurose obsessiva — certamente um progresso, mas, evidentemente, não uma cura. Este revezamento entre as posições obsessiva e neurótica foi abordado nesta História da Literatura do Espírito Santo, ora publicada pela Edufes.

 

Hoje, em 2023, o povo, de uma forma ou de outra, tem procurado se revestir de uma tacanha cidadania, resgatando-a, recuperando a sua brasilidade e ocupando o lugar simbólico do pai no inconsciente nacional, tornando possível tanto o resgate de sua macroindividualidade sã quanto o da microindividualidade capixaba. 

 

 

 

IV- IDEOLOGIA DA CULTURA PERIFÉRICA CAPIXABA

O código genético que interliga nossas diferentes microrregiões culturais se materializa na Ideologia da Cultura Capixaba. Por meio dela, o Espírito Santo passa a ter uma geopolítica, limites territoriais, símbolos, hinos, problemáticas, defensores, amigos e inimigos. Sem ela, seríamos todos irmãos. Mas abrir mão de sua proteção, em um novo mundo dominado pela globalização neocolonialista, em um planeta em aquecimento apocalíptico, corresponde, exatamente, a deixar de existir. 

 

A gestação da Ideologia da Cultura Capixaba começou no século XIX, quando se iniciou a produção do Capital Cultural regional. Desenvolveu-se lentamente, a partir de então, para nascer, de fato, no governo de Jerônimo Monteiro.

 

Capital Cultural é a soma que, derivada direta ou indiretamente do enriquecimento social, está empregada em setores relacionados à cultura, levando ao aumento de suas atividades.  O Capital Cultural se valoriza mais ideológica do que economicamente, por meio do investimento em uma mercadoria — a cultura — que será “vendida” de forma primordialmente ideológica para a sociedade, originando ganhos diversos, também monetários, que se estruturarão em um Aparelho Cultural (instituições de arte, academias, editoras etc.).

 

O nosso conceito de Aparelhos de Estado pode ser traduzido mais ou menos pelo mesmo que Instituições.

 

Dois eventos, datados do século XVIII, consolidaram o lugar cultural periférico ocupado pelo Espírito Santo no contexto nacional. 

 

O primeiro deles determinou que a capitania fosse praticamente transformada em uma simples barreira de proteção das Minas Gerais. Privou-nos, assim, do Capital Cultural gerado pelas ricas lavras de ouro que, descobertas em terras capixabas por Antônio Rodrigues Arzão, em 1693, seriam incorporadas a São Paulo em 1709: Portugal, temeroso do ataque de piratas, decretou que os territórios situados a leste de Minas — e a oeste do Espírito Santo — fossem considerados áreas proibidas, de acesso vedado, e interditou a construção de estradas por elas. Ao mesmo tempo, a Coroa comprou a Capitania, impediu a prospecção de ouro, aprimorou suas fortificações e desestimulou as poucas atividades e iniciativas econômicas que ainda ocorriam. 

 

Tais medidas, além de terem condenado a população à pobreza, retardaram e dificultaram o povoamento, a exploração e a expansão do território. Em consequência, não pudemos nem progredir internamente nem, ao menos, vender produtos aos mineiros, o que garantiria uma participação indireta na riqueza dos garimpos e aumentaria o Capital Cultural circulante.

 

No segundo deles, perdemos os jesuítas, que, expulsos do país em 1759, eram detentores do monopólio das instituições escolares e do controle da maioria absoluta das atividades artísticas. A Companhia de Jesus participava, de forma ativa e intensa, do Aparelho Econômico Espírito-Santense. Possuía, entre muitos outros bens, ricas fazendas que garantiam a sua subsistência e a continuidade dos seus trabalhos por aqui: — destacavam-se Araçatiba, como engenho de açúcar; Muribeca, na criação de gado; Itapoca, na fabricação de farinha.

 

Esses acontecimentos deixaram marcas profundas na cultura, que entrou de vez em um marasmo comatoso. Ela só despertaria com a injeção de capital ocorrida, graças ao café, em meados do século XIX. No entanto a predominância do Capital Cultural Agrícola, enquanto em todo o Brasil surgia o Capital Cultural Industrial, mais dinâmico, resistente, modernizador e capaz de autorreprodução, levou-nos a ficar para trás. Esse terreno começaria a ser recuperado no século XX, na década de 70, quando o processo de industrialização capixaba, produzindo um Capital Cultural inaudito, garantiu que suas instituições se estruturassem de forma definitiva.

 

Não achamos correto falar de nação brasileira ou de nacionalismo — de nativismo, sim — antes de 1808, ano em que a corte portuguesa se instalou no Rio de Janeiro. Deixamos, então, de ser uma simples colônia, com os olhos voltados para Portugal, para nos tornarmos, em 1815, Reino Unido a Portugal e Algarves. Não podíamos, obviamente, construir uma ideologia por falta dos Aparelhos Ideológicos de Estado necessários, criados por diversas medidas de D. João VI. Seu Governo revogou as restrições impostas à indústria, ao comércio e ao funcionamento de tipografias. A partir de 1808, passou a haver liberdade de imprensa, de instalação de indústrias, e os portos nacionais foram abertos às nações amigas — o que representou, na prática, o fim do monopólio do Reino sobre a Colônia. Além disso, sua política instituiu a Imprensa Régia, o ensino superior, o Banco do Brasil, o Jardim Botânico, a Academia Real Militar, a Biblioteca Real, a Fábrica de Pólvora, o Arsenal Real da Marinha etc. Por fim, em 1816, a missão artística francesa desembarcou no país. 

 

Repetindo, compulsivamente, a tendência primitiva de implantar a realidade por decreto, de cima para baixo, sem ouvir as razões mercantis ou populares, o Governo produziu, assim, estruturas econômicas e ideológicas que a conjuntura colonial não engendraria tão cedo e que foram responsáveis pela formação da nação e dos organismos indispensáveis à sua sobrevivência e à reprodução das suas condições de produção.

 

Como era de se esperar, logo depois de estruturado, o conjunto primitivo de entidades adquiriria vida própria e se encarregaria de criar uma segunda geração de Aparelhos e de Agentes que dessem conta da tarefa de compor uma Ideologia da Cultura Nacional. Tal objetivo nortearia a organização do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, em 1838. Por outro lado, a liberdade de imprensa permitiu a criação de editoras e a publicação de jornais, livros e revistas que, provocando uma efervescência artística, científica, crítica, intelectual e política, aceleraram a maturação da nacionalidade.

 

No entanto, só em 1826, com a publicação, em Paris e em francês, do Résumé de l’Histoire Littéraire du Portugal, suivi du Résumé de l’Histoire Littéraire du Brésil, de Ferdinand Denis, pela Lecointe & Durey, pela primeira vez a literatura brasileira passou a ser estudada como um corpus textual diferente do português. 

 

Ainda que o sermos portugueses não comprometesse a formação natural das características capixabas, de certa forma impedia seus movimentos culturais, já que o modelo ideal paradigmático da sociedade brasileira da época se identificava com a Europa portuguesa. E a ela, portanto, os como nós oitocentistas se voltavam, considerando-a o modelo da perfeição a ser alcançada: nossa meta de Meca. 

 

Podemos compreender, agora, o paradoxo lógico com que abrimos este ensaio: se ninguém percebeu a árvore cair, de que forma saberemos se ela caiu? Analogamente, ainda que nossa identidade cultural pré-existente estivesse sendo desenvolvida, em estado bruto, natural, até mesmo antes do século XVI — afinal, a participação indígena na nossa formação ultrapassa a doação da palavra capixaba — é necessário o pensamento da cultura para captar os dados produzidos e integrá-los em um sistema de ideias do porte de uma ideologia. Melhor dizendo: preparar moqueca ou torta capixaba em panela de barro não é o bastante. 

 

Precisamos, entre os primeiros passos, dos estudos de um lexicógrafo ou de um filólogo que se proponham a elaborar um Pequeno Vocabulário Ortográfico do Dialeto Capixaba. Nele, não poderia faltar a contribuição secular dos portugueses, dos italianos, dos indígenas nativos, dos afro-capixabas escravizados e de tantos outros povos. Bem como da culinária e das manifestações folclóricas típicas, com seus linguajares característicos. Deveria incorporar até mesmo a língua dos pomeranos, que só existe no Espírito Santo, pois desapareceu na Alemanha.  Uma rica fonte pode ser encontrada na gíria chula da Vitória antiga, listada em Cantáridas, antologia de poemas fesceninos escritos por Guilherme Santos Neves, Jayme Santos Neves e Paulo Vellozo (São Paulo: Max Limonad; Vitória: Fundação Ceciliano Abel de Almeida,1986).

 

Mas como, se não temos nem sotaque? Ledo engano: o sotaque capixaba é não ter sotaque, o que o torna diferenciado no Brasil. Aqui se fala um português sem alteração excepcional, em que não se puxa o “s” palatal antes de pausa ou no final de sílaba, como o fazem os cariocas; ou o “r” vibrante, à moda paulista. 

 

O Espírito Santo, contudo, apenas conseguiu desenvolver uma infraestrutura econômica forte o bastante para produzir o Capital Cultural necessário à montagem de um Aparelho Ideológico completo a partir da segunda metade do século XIX, quando o café passou a ser o principal artigo de exportação.

 

Em 1840 viria à luz o jornal pioneiro O Estafeta, que circulou uma vez. O Correio da Vitória surgiria em 1849; A Regeneração, em 1853; O Capixaba, em 1856 e assim por diante. A imprensa passou a servir de púlpito para as discussões dos intelectuais da província que, ainda timidamente se esforçavam para buscar os legítimos valores e costumes da plaga.

 

Os trabalhos de José Marcelino Pereira de Vasconcelos são uma boa mostra de tal esforço. Em 1856, ele publicou, em Vitória, na tipografia de Pedro Antônio d’Azeredo, o volume inicial da primeira antologia de que temos notícia: o Jardim Poético ou coleção de poesias antigas e modernas, compostas por naturais da Província do Espírito Santo. O segundo tomo sairia quatro anos depois, em 1860. Entre ambos, José Marcelino lançou, em 1858, o Ensaio Sobre a História e Estatística da Província do Espírito Santo.

 

O fato de terem sido impressas — precursoramente — em Vitória nos autoriza a considerar essas obras de José Marcelino como evidências da presença de um movimento romântico estruturado em um Aparelho Cultural. Trata-se de uma etapa heróica, de procura de uma linguagem para o ensaísmo, em que encontramos muito do espírito da coletânea caótica — de poemas, no Jardim Poético; de nomes, feitos, descrições, números, documentos e geografias no Ensaio — e pouco da luz racionalizadora da ciência. Fase ainda primeva do desenvolvimento, similar à da busca da nacionalidade empreendida em termos de Brasil, nela parece ser mais importante invocar e comprovar a existência do Espírito Santo e de seus fenômenos do que compreendê-lo.   

Fazendo parte do novo Aparelho Ideológico Cultural que se formava, surgiu a Sociedade Dramática, primeira companhia regional — depois que os jesuítas foram expulsos, no século XVIII —, responsável pela encenação, em 20.8.1841, da peça Maria Teresa, Imperatriz da Alemanha ou o Heroísmo do Amor Filial. 

 

Em virtude da intensa participação dos românticos, muitos deles políticos de relevo, as entidades culturais capixabas foram se constituindo. Em 16.7.1855, ocorreu a inauguração da Biblioteca Pública da capital. Em 1832, a maçonaria instalou, em Vitória, a Loja Beneficência, que seria seguida pela Loja União e Progresso, fundada em 1872.

 

Os intelectuais abraçaram com entusiasmo as causas de interesse do neocolonialismo: a campanha pela abolição da escravatura teve ampla repercussão. Garantiu, sabemos hoje, a ampliação dos mercados consumidores dos produtos ingleses e a passagem do modo de produção escravista para o capitalista. Em 1869, seria criada a Sociedade Abolicionista da Escravatura do Espírito Santo, que, em breve, estaria acompanhada de inúmeras associações congêneres.

 

A Ideologia da Cultura Capixaba começou a se delinear melhor quando se tornou necessária para a implantação do projeto desenvolvimentista promovido, com mais vigor, a partir do governo de Jerônimo Monteiro (1908-12). Em 1909, ele instituiu o selo e as armas do Espírito Santo. Antes de sua posse, cantava-se, nas cerimônias públicas, a Marseillaise, o Hino Nacional Francês. Esse despropósito foi mais ou menos corrigido por meio de determinações que levaram a substituí-lo pelo Hino Nacional Brasileiro.  

 

Os símbolos podem ser comparados a verdadeiros retratos do Estado e, à semelhança das imagens de deuses e de santos, têm a função de tornar o abstrato concreto, e o irreal, palpável. Sua implantação constituiu, assim, uma “prova” sensorialmente perceptível da existência do Espírito Santo como unidade distinta do resto da nação. O advento de Jerônimo Monteiro, portanto, marcou o nascimento de um “saudável” bairrismo.

 

Depois da produção do selo e das armas, o passo seguinte foi o estabelecimento de associações que desempenharam a dupla tarefa de formação das elites e de criação das bases teóricas “comprobatórias” da especificidade e da peculiaridade da cultura regional. Esses objetivos nortearam a fundação do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, em 1916, e da Academia Espírito-Santense de Letras, em 1921. Em 1923, nasceu a revista Vida Capixaba, que seria, por mais de três décadas, a principal divulgadora de nossas características.

 

A Segunda Guerra Mundial abalou as raízes agrícolas tradicionais da sociedade e introduziu novas empresas, a exemplo da Companhia Vale do Rio Doce e da Companhia Ferro e Aço de Vitória, ambas surgidas em 1942. Ao mesmo tempo, a difusão do modo de vida e dos valores norte-americanos pelo cinema e pelo rádio contribuíram para a modernização do Estado. Essa dinamização se estendeu às artes. Em 1946, jovens escritores — como Christiano Dias Lopes Filho, futuro governador — lançaram a Academia Capixaba dos Novos, que se propunha diminuir o marasmo literário vitoriense. Em 1947, ocorreu a Quinzena de Arte Capixaba, uma amostragem ampla que incluiu recitais poéticos, teatro, palestras, concursos, concertos e exposições. Finalmente, em 1947, foi instituído o Hino do Espírito Santo, único símbolo que faltava. Em seu lugar, desde o governo Jerônimo Monteiro, o Hino Nacional Brasileiro era cantado nas cerimônias oficiais.

 

Eurico Rezende (1979-83), com uma única medida administrativa, transformou os principais organismos encarregados da promoção da Ideologia da Cultura Capixaba em inexpressivos departamentos de seu Governo, ferindo de morte o bairrismo de que se nutrem os elementos típicos. Entre os moribundos, lamentamos, em especial, pela Fundação Jones dos Santos Neves e pela Fundação Cultural do Espírito Santo — esta se encontrava, quando de sua facada nas costas, sob a direção iluminista do brilhante escritor e pesquisador Renato Pacheco. Ficamos, então, à mercê do neocolonialismo cultural oriundo do estrangeiro e dos grandes centros que nos cercam: Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia. 

 

V- ARTES DE CRIAÇÃO DA CULTURA CAPIXABA

De todos os agentes de construção da ideologia de que necessitamos — para continuarmos a existir —, os artistas merecem ser destacados pelo seu poder de introduzir vida, voz e personalidade no que era barro: intuitivamente, os habitantes de um local se reconhecem em certas características culturais produzidas por eles. Seus olhares genesíacos ressuscitam o que é matéria bruta e inerte e criam uma grande personagem: o Espírito Santo. Sim, pois o Estado necessita de uma construção psicológica que o transforme em ser social maior do que a simples soma de dados, pessoas, ruas e moradias. Eles têm o poder de nos apresentar a interessantíssimos tipos populares e — mágica! — fazê-los se reunirem, suspensos no ar, sob a forma do mosaico eternizado que nos define.

 

Do todo de características desarmônicas só a arte pode dar conta, graças a seu demiúrgico poder de sair do passado, apreendendo-o, para plasmar o futuro. Compõe, assim, o universo cultural, captando-o de sua desarmonia abstrata natural e dando-lhe o toque harmônico da variante estética.

 

Essa maravilha ocorre, não no mundo ideal e irreal de Platão, e sim dentro de uma prática — que podemos sentir, porque a Identidade Cultural e a sua ideologia se materializam em atos, costumes e posturas rituais que desaguam em edificações, em cidades, em ruas e — quem sabe? — na disposição do homem sobre os campos. Muito mais do que pousa sobre os símbolos do Estado, repousa sobre nós sua mão disciplinadora com padrões que — se quisermos ser capixabas — devemos ser capazes de incorporar. É como o ritual de entrada em uma ordem tão secreta, que mesmo nós desconhecemos nossa entrada. Mas os membros reais dariam a própria vida por ela.

 

Da trilha aberta por uma Identidade Cultural Capixaba pré-existente é que surgiram o ser e o pensar que caracterizam, no presente, o Espírito Santo. Pelo mesmo caminho, restaria ao povo também resgatar sua cidadania e, impulsionado por ela, obter uma evolução em seu quadro psicótico. Adquiriria, então, resistência contra a psicose, criando poderosos anticorpos microssociais que se encarregariam de diminuir os sintomas de corrupção absoluta, de catatonia, de autismo, de delírios malsistematizados, de alucinações e de regressão comportamental comuns em nossa plaga para tentar retomar o caminho da neurose obsessiva a que os lemas ordem e progresso e trabalha e confia parecem se referir.

 

Tratar-se-ia, acreditamos, do processo de cura do ser social, a que nos referimos anteriormente, de um modelo de luta contra a violência, a corrupção e o crime. Evidentemente, os arquétipos da justiça, do vigor econômico e da honestidade precisam de se estruturar após a degradação secular que apenas simulacros deles mesmos produziram. 

 

Contudo, apesar do que dissemos, algumas pessoas ainda não aceitarão esse raciocínio. São os que acreditam que não existia Identidade Cultural Italiana antes da fundação de Roma. Estão certos? Não há, de fato, uma Identidade Cultural Americana, nem alemã, nem japonesa, nem baiana, nem irlandesa? Vamos tratar de produzi-la, então, conforme James Joyce advogava: 

 

“Sê bem-vinda, ó vida! Eu vou ao encontro, pela milionésima vez, da realidade da experiência, a fim de moldar, na forja da minha alma, a consciência ainda não criada da minha raça.” (JOYCE, James. Retrato do artista quando jovem. São Paulo: Abril Cultural, 1971, p.238.  Coleção: Os Imortais da literatura universal)

 

Sim, os irlandeses, como Joyce, também não constituem, de fato, uma raça. Sua obra, contudo, contribuiu para criar e divulgar a Identidade Cultural Irlandesa pelo mundo inteiro e pelo futuro afora. Tornamo-nos conhecidos, na década de 70, por defendermos a produção de uma Consciência de Raça Capixaba (GAMA FILHO, Oscar. A busca de uma consciência de raça. A Tribuna, Vitória, p.13, 15.03.1979). A contemporaneidade nos deu razão, transformando essa divisa joyceana na atitude que hoje impulsiona o Espírito Santo. 

 

A busca da Identidade aponta para o toque de tempero capixaba. Proferindo esta palavra-chave da alquimia verbal, espécie de “abre-te, sésamo!”, podemos compreender a importância das várias microrregiões culturais de que somos compostos. Graças à identificação, elas incorporaram dados culturais umas das outras e guardam um sensível sentido de peculiaridade local, de diferença em relação a localidades semelhantes encontráveis no exterior ou no restante do país: apenas nós temos nosso caboclo indígena das praias — filhos espirituais dos jesuítas —, nossos afro-capixabas, nossos baianos amineirados do norte, nossos teuto-italianos alegres, nossos agropecuaristas caricaturais das montanhas.

 

É o terroir capixaba, leve toque típico do Espírito Santo, livramento terreal onde todos podem se comportar do jeito que quiserem, graças à sua democrática pasmaceira — uma de nossas características, segundo o dramaturgo romântico Amâncio Pereira — que, cordialmente, não impõe formas de ser. Sejam bem-vindos a ela!        

 

Neste terroir, um dos tijolos fundamentais é o microssistema literário capixaba que esta obra constrói enquanto também constitui prova. 

 

Oscar Gama Filho é escritor, ficcionista, dramaturgo, historiador, compositor e ensaísta.

 

Casamar, 13.7.2023

 

Fotografia de Oscar Gama Filho

OSCAR GAMA FILHO, escritor capixaba, nascido em 1958, busca captar a essência dos momentos estéticos justapostos, passados e presentes. Por meio da soma de seus diversos pontos de vista, tenta atingir a completude da arte. Eis um esboço da equação passada:

Esforçou-se por alcançar a essência do poema em De Amor à Política (Vitória: edição marginal mimeografada, 1979, obra dividida meio a meio com Miguel Marvilla); em Congregação do Desencontro (Vitória: Fundação Cultural do Espírito Santo, 1980); em O Despedaçado ao Espelho (Vitória: Fundação Ceciliano Abel de Almeida/UFES, 1988); em O Relógio Marítimo (Rio de Janeiro: Imago, 2001) e em Ovo Alquímico, escrito com seu filho Alexandre Herkenhoff Gama (São Paulo: Escrituras Editora, 2016). 

Procurou o tempo perdido em obras como História do Teatro Capixaba: 395 Anos (Vitória: Fundação Cultural do Espírito Santo/Fundação Ceciliano Abel de Almeida, 1981) e Teatro Romântico Capixaba (Rio de Janeiro-Vitória: Instituto Nacional de Artes Cênicas/Ministério da Cultura, Departamento Estadual de Cultura, Secretaria de Estado da Educação e Cultura, Governo do Estado do Espírito Santo, 1987).

Precisando de outras línguas para auxiliá-lo em sua tarefa, traduziu-se para Rimbaud em Eu Conheci Rimbaud & Sete Poemas para Armar um Possível Rimbaud mesclado com O Barco Ébrio/Le Bateau Ivre (ensaio-tradução-conto-poema, Vitória: Fundação Ceciliano Abel de Almeida, Universidade Federal do Espírito Santo, Departamento Estadual de Cultura, 1989).

Acrescentou sabedoria à sua equação graças à Razão do Brasil em uma sociopsicanálise da literatura capixaba (Rio de Janeiro: José Olympio Editora; Vitória: Fundação Ceciliano Abel de Almeida, 1991).

Percebendo a insuficiência da ótica literária, realizou a exposição de arte ambiental poético-plástica Varais de Edifícios, em 1978, a partir do conceito criado por Hélio Oiticica.

Como compositor, criou o disco Samblues, lançado em 1992 pelo Departamento Estadual de Cultura, e incluído no selo histórico Série Fonográfica do Espírito Santo

O CD Ecos de Sereia, de Elaine Rowena, possui cinco composições suas. 

Escreveu o libreto de Canoeiros do Santa Maria, opereta do virtuose Maurício de Oliveira. O interessante é que Maurício achou a primeira versão muito vanguardista, e pediu para que fosse escrita uma história de amor, que é a letra citada em sua biografia, escrita por Marien Calixte, em O Pescador de Sons.

Suas canções foram apresentadas nos shows O Barco Ébrio (1989) e Samblues (1992), produzidos por ele.

Em 2005, lançou o CD Antes do Fim-Depois do Começo, que contém músicas em parceria com Mario Ruy e em que aparece pela primeira vez o invariante eidético universal absoluto: o Ovo Alquímico. As músicas foram executadas pela Ovo Alquímico Samblues Band.

 Mas era pouco: dirigiu suas peças A Mãe Provisória, em 1978, e Estação Treblinka Garden, em 1979. Miguel Marvilla encenou seu poema dramático Onaniana, em 1990.

Foi escolhido por Afrânio Coutinho para escrever o verbete Literatura do Espírito Santo em sua Enciclopédia de Literatura Brasileira (Oficina Literária Afrânio Coutinho/Fundação de Assistência ao Estudante, 1990), na qual mereceu inclusão como escritor. 

Citado como escritor e crítico na História da Literatura Brasileira, de Carlos Nejar (São Paulo: Leya, 2011), honra que se repetiu na 3ª edição da mesma obra, pela Editora Unisul, em 2014.

Assis Brasil também lhe concedeu verbete em A Poesia Espírito-santense no século XX (Rio de Janeiro, Imago; Vitória, Secretaria de Estado de Cultura e Esportes, 1998).

Participou de todas as antologias de escritores capixabas publicadas nas duas últimas décadas, entre elas: Panorama das Letras Capixabas (organizada por José Augusto Carvalho, na Revista de Cultura-UFES. Vitória, Fundação Ceciliano Abel de Almeida, 1982); Poetas do Espírito Santo (organizada por Elmo Elton. Vitória, UFES/ Fundação Ceciliano Abel de Almeida, Prefeitura Municipal de Vitória, 1982); Torta Capixaba II (Vitória, Academia Espírito-Santense de Letras, 1989); Palavras da Cidade (poemas. Vitória, Prefeitura de Vitória, Secretaria Municipal de Cultura e Esportes, 1990); Palavras da Cidade (contos. Vitória, Prefeitura de Vitória, Secretaria Municipal de Cultura e Esporte, 1991); De Amar e Amor (poemas organizados por Jorge Solé. Vitória, Fundação Ceciliano Abel de Almeida, 1992); Escritos de Vitória (crônicas. Secretaria Municipal de Cultura e Esporte, Prefeitura Municipal de Vitória, 1993); Escritos de Vitória — bares, botequins, etc. (conto. Prefeitura Municipal de Vitória, Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e Turismo,1995); Daqui Mesmo — 34 Poetas (seleção e apresentação de Reinaldo Santos Neves. Vitória, Rede Gazeta de Comunicações-UFES, Coleção Nosso Livro, Suplemento especial de A Gazeta, novembro de 1995); A Poesia Espírito-Santense no Século XX (antologia. Organização, introdução e notas de Assis Brasil. Rio de Janeiro, Imago; Vitória, Secretaria de Estado de Cultura e Esportes,1998).

Colaborou em diversos jornais brasileiros, entre eles Folha de São Paulo, Zero Hora, Suplemento Literário de Minas Gerais, A Gazeta e A Tribuna

Orgulha-se, especialmente, de A Essência da Poesia, publicado na Revista Brasileira, da Academia Brasileira de Letras (Rio de Janeiro: Fase VII, outubro-novembro-dezembro de 1996, Ano III, nº 9, p.48). Assim como de As Metamorfoses do Homem, também estampado na Revista Brasileira, da Academia Brasileira de Letras (Rio de Janeiro: Fase VIII, abril-maio-junho de 2015, Ano IV, nº 83, p.191).

Pertence à Academia Espírito-santense de Letras e ao Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. 

Como psicólogo clínico, foi coordenador e fundador do Serviço Psicológico da Sub-Reitoria Comunitária da Universidade Federal do Espírito Santo desde a sua criação, em 28/4/1986, até solicitar a sua exoneração, em 4/11/95. Em 2003, a Desportiva Capixaba o contratou como psicólogo, tendo participado da subida do time da segunda para a primeira divisão e da conquista do vice-campeonato da Copa Espírito Santo de futebol.  Solicitou sua demissão em janeiro de 2004.

Sua excursão argonáutica mereceu os seguintes comentários:

Assis Brasil (A Poesia Espírito-santense no século XX, p. 210): “a poesia de Oscar Gama Filho, em especial seu quarto livro, de 1988, O Despedaçado ao espelho, é de feição original, recursos técnicos e de linguagem personalíssimos, num momento em que voltamos ao academicismo das fórmulas, das costumeiras metáforas e… do soneto. Nada contra a coinvenção de Petrarca, mas é raro um poeta, hoje, época algo sincretista — como o foi o começo do século — criar os seus próprios recursos de expressão.”

Afrânio Coutinho (orelha de Razão do Brasil): “A obra de Anchieta é analisada com a maior penetração, como jamais fora feito antes. Livro original e destinado a ser um marco na historiografia brasileira e capixaba.”

 



Qual é a sua reação?

Gostei
0
Adorei
0
Sem certezas
0

Também pode gostar

Os comentários estão fechados.

More in:Cultura