Lusofonia na Galiza e a inclusão do Brasil e demais países lusófonos | Wesley Sá Teles
Desde a aprovação no parlamento da Galiza da chamada lei Valentim Paz Andrade (lei 1/2014) existe uma tentativa de reaproximar a região autônoma espanhola à lusofonia. Sem embargo, a mesma tem concentrado seus esforços de maneira quase exclusiva na aproximação com a região norte de Portugal, que junto à Galiza formam a euro-região Galicia Norte de Portugal, de aproximadamente 6 milhões de pessoas, e que possui projetos já consolidados, tais como as eurocidades de Tui-Valença, Chaves-Verin e Salvaterra-Monção, na área conhecida como Raia Termal.
Certo é que existem diversos fatores que justificam essa prioridade, sejam estes históricos, econômicos, culturais ou geográficos, ao final ambas as regiões formavam no passado o chamado Reino de Gallaecia e preservam fortes características em comum, além de constituir uma área linguística e cultural bastante semelhante, defendida como a mesma por diversos estudiosos.
Porém, é impossível falar de uma aproximação real à lusofonia sem incluir o resto de Portugal ou atores importantes tais como o Brasil, Angola e Moçambique. Que muitas vezes são negligenciados ou sentenciados a um papel secundário nas discussões e negociações entre a Galiza e o mundo lusófono.
No caso do Brasil por exemplo, embora existam mais de 30 mil galegos e descendentes residindo no país, são poucos os acordos e ações bilaterais que buscam consolidar uma relação benéfica, mesmo sendo o maior representante da lusofonia em número de falantes e em produção cultural, ainda havendo possibilidades tais como a paradiplomacia ou diplomacia das cidades. Pois se, por um lado, a Galiza abraça a lusofonia em sua relação com Portugal e com o Brasil, a mesma se castelhaniza, sendo o galego subutilizado e restrito a um grupo seleto de pessoas (em sua maioria imigrantes galegos) permanecendo praticamente desconhecido pelo grande público embora termos tais como “Galeguia” (Ruffato, 2007) tenham tido no Brasil uma de suas maiores expressões e defensores, ao incluir a Galiza na lusofonia, recuperando o papel histórico da mesma na formação linguística de ambas as regiões.
Assim mesmo, a relação com nações africanas tais como Angola ou Moçambique, dentre outras, continuam sendo negligenciadas pelas autoridades locais, incapazes de ver o potencial de uma das regiões que mais cresce economicamente no planeta.
Na Galiza, existe mais interesse em regiões onde o português é uma minoria tais como a cidade chinesa de Macau ou na pequena Guiné Equatorial, que em países onde o idioma já está consolidado e que são um exemplo de resiliência e de uma realidade multicultural.
Sendo assim, é possível observar que a Galiza não usa o galego como uma ferramenta diplomática ou como fator competitivo em suas relações, à exceção de Portugal, e que prefere fazer uso da língua estatal de maior relevância, neste caso o castelhano, para se relacionar com as demais nações lusófonas.
Cabe observar que, em nenhum momento, o uso do castelhano supõe um problema, sem embargo sua exclusividade, principalmente quando se trata de países lusófonos, acaba sendo contraditória aos anseios da lei Valentim Paz Andrade, reforçando a imagem equívoca que muitos cidadãos lusófonos possuem do galego, que se trata somente de um dialeto de uso local, e não de uma língua constituída, capaz de ser instrumentalizada e utilizada na relação com outras nações que possuem uma origem em comum.
Quando comparamos a lusofonia com outros espaços linguísticos tais como a francofonia, anglofonia, etc… vemos que a diferença dessas regiões que acabaram por inserir uma diversidade de línguas locais e dialetos dentro de seus espaços de atuação, na lusofonia ainda impera uma visão segregacionista que gera mais divisões que sinergias e uma busca incansável e sem sentido de um protagonista linguístico.
Ao não incluir outros países lusófonos nessa reaproximação da Galiza e Portugal, vemos um crescente abismo, sendo comum a cidadania fazer paralelismos entre o galego e o português lusitano, mas simultaneamente se distanciando de outras vertentes da língua lusa.
Sem embargo, longe do cenário discursivo da política e dos centros acadêmicos, atividades culturais tais como programas de rádio, concursos literários, canais de youtube e demais redes sociais, vão aos poucos conscientizando o povo de que pertencem a um mesmo espaço linguístico e que a diversidade do mesmo não faz outra coisa que não seja agregar valor ao idioma. Assim, o efeito Tanxugueiras repercutiu graças às redes sociais em diversos países da lusofonia e para a surpresa de muitos, eles entendiam a letra, sem realizar grandes alterações… e se isso não é falar a mesma língua, o que faz do inglês uma língua internacional?
A Galiza deve, sem dúvidas, continuar a se aproximar de Portugal, seja por fatores competitivos ou por fatores culturais e linguísticos, porém não pode nem deve negligenciar o resto da lusofonia.
Wesley Sá Teles Guerra, brasileiro, residente em Ourense (Galicia), PHd Candidate em Sociologia e Mudanças da Sociedade Contemporânea, Mestre em Políticas Sociais e Migrações, autor do livro Cadernos de Paradiplomacia e do estudo Brasil Galicia. Membro associado do IGADI – Instituto Galego da Análise e Documentação Internacional, do OGALUS – Observatório Galego da Lusofonia e da Associação Impulsora da Casa da Lusofonia. Fundador do Think tank CERES – Centro de Estudos das Relações Internacionais do Brasil. Contato: Wesleysateles@hotmail.com web: www.wesleysateles.com