

Zeca Pagodinho anunciou uma vida sem preocupações aceitando o que viesse pela frente.
Sorte do que vem…
Azar do que vem…
Tu vens, tu vens…
Deixar acontecer, bom, para ele tudo certo, vive no Rio de Janeiro e curte suas cervejas com dinheiro no bolso.
Na paz.
Já nosso outro amigo viveu as agruras da guerra e do pós-guerra e não havia mais nada a fazer além de ficar esperando Godot.
Samuel Beckett sofreu na resistência francesa e lá, o tempo era outro, não deixando ninguém se levar.
Se Vladimir e Estragon (personagens) conversavam sobre nada ou talvez sobre a existência inexistente esperando alguém ou algo, Beckett superou o fim da guerra, enquanto Pagodinho rolava garrafas saboreando gotas de outros diálogos.
Porém, um dos vagabundos de Samuel Beckett parece encarnar nosso sambista, “nada acontece, ninguém vem, ninguém vai, é terrível”, mas aí Zeca Pagodinho ensina o carpe diem. E revela aqueles dias que ficamos à mercê do destino quem sabe esperando Godot.
Mas os infelizes não vivem, apenas sobrevivem e um lembra ao outro que “o terrível é não ter pensado um dia”, e isso é o que eles, sempre eles, querem.
Como autênticos alunos de colégios militares, sim senhor, não senhor.
Vladimir e Estragon são assim, vivem na escuridão, fazem parte de um (triste) belo quadro social.
Doutrinados.
E humilhados.
Estão cegos e para eles pensar é algo impossível. Não correm mais o risco de pensar e sobrevivem como operários sem razão.
Estão esgotados por uma sociedade comandada pelo capital.
Estão perdidos, não conhecem a palavra resiliência e se não estão esperando Godot, estão esperando a morte chegar. Os canhões venceram as flores. Os anos de chumbo ainda ressoam.
Porém, a voz de Beckett também é resiliente e é a paz de espírito que vai determinar o meu “deixa a vida me levar”.
Respeitando o oposto, não açoitando o pequeno ao contrário do arrogante e desprezível Pozzo(Bozo?), outro personagem de Beckett. Quero alertar o oprimido e dar voz a Lucky, o cão humano.
E responder ao opressor maldito.
Maldito gado.
Malditos…ingênuos(Tambo do Bando).
Malditos…
Como Vladimir e Estragon, não pensam mais, vivem em suas bolhas acreditando em falsos mitos pois não há mais discernimentos, as mídias malditas triunfaram.
“Eles” levaram tudo.
E agora Estragon?
“Não há nada a fazer”, responde derrotado.
Enquanto isso, Pagodinho deixa a vida lhe levar, nada contra, a sede é grande… o drama é ver estragons e vladimires todos os dias esperando…Godot…


Fotografia de Coca Trevisan
O jornalista Coca Trevisan nasceu em Santa Maria, RS. Atuou como repórter e redator nos jornais NH, de Novo Hamburgo; VS, de São Leopoldo e Jornal Alto da XV, de Curitiba. Como profissional freelancer assinou matérias em diversos periódicos. Participou de workshops e atuou em debates sobre a Indústria Cultural dos anos 1980/90. Mais recentemente, concluiu pela PUC-RJ o Curso de Extensão Origens do Existencialismo. Mantém e abastece o blog Violências Culturais. Atualmente mora em Florianópolis, SC.