Cumparsa | Carlos Eduardo Matos

Ah cumparsa, comparsa, parça, parceirinha, cumparsita fiadeumaégua, sacanagem de vosmecê ter puxado o carro! Me deixou numa merda de fazer gosto, fodido e mal pago. Percanta do carai, por que vosmecê fez isso comigo? Os amigos também sumiram, acho que vinham aqui só pra xavecar vosmecê, cumparsita. Cambuta, cambada de fiodaputa.

 

Até aquele cão fio de uma cã, que parou de comer quando vosmecê sumiu, que sentiu sua falta tanto quanto eu, mais do que eu, me olhou com desprezo e deu no pé. Cachorro ingrato, eu comprava as mais caras rações pro parceirinho recuperar a saúde…Foi embora, tchau e bença, adeus, good bye, au revoir, adiós. Foda-se, ô quatropata.

 

Ah, mas me vingo, cumparsita. Porque tudo isso é culpa de vosmecê. Estou compondo um tango da pesada, que vai chamar, é claro, La cumparsita. E não vai ter imagens típicas de tango de corno, do tipo diz, percanta, que fizeste do meu pobre coração? Nananinanão, vai é botar pra fudê, chamar vosmecê de percanta fiadeumaégua, de cumparsita traidora e por aí vai…

 

O difícil vai ser arranjar um tanguero que tope gravar minha canção herética, pode ser areia demais pro caminhãozinho do bajo fondo porteño. Mas, como dizem nos meus pagos, tá fodido, truco, pra quem tá no inferno, ave maria é lenha. Vou partir pras cabeceiras, pedir a Carlos Gardel, ele é do ramo, até que canta bem…

 

 

Meu nome é Carlos Eduardo (Cadu) Matos. Nasci em 1946, em Niterói, cidadezinha diante do Rio de Janeiro – uma Almada da baía de Guanabara. Formei-me em Direito em 1968 mas jamais advoguei. Dei aulas de Sociologia na Fundação Getúlio Vargas- SP e, antes disso, em 1975, na Escola Bento de Jesus Caraça, em Évora. Sempre exerci o ofício de escritor. Desde 1969 trabalhei como editor, redator, tradutor, preparador de texto e revisor para editoras de fascículos, revistas e livros didáticos e não didáticos. Contudo, apenas em 2018 escrevi meu primeiro texto pessoal, não encomendado por uma empresa. E não parei mais. Lancei quatro e-books pela Amazon: Shoshana – publicado na íntegra em quatro edições sucessivas da InComunidade – e os livros de contos Lili dos dedinhos, A outra e Rebeldes.