Poesia & Conto

Poemas | Cesar Augusto de Carvalho

balanço

para Rubens Jardim

 

sentado na soleira da porta
picando fumo
pensando na vida
balanço dos dias vividos
plantou, semeou colheu
verduras frutas legumes
tristezas alegrias e dores.
os filhos cresceram
os netos vieram
sementes se espalharam
ganharam o mundo.
e ele? que lhe aconteceu?
enrola o cigarro
formigas se espalham
num vai e vem
carregando pesos
pesados pesos
comida da prole.
acende o cigarro
o vai e vem observa
e se pergunta:
sou como formiga?
mas por que o tédio
se tudo o que fiz
foi viver viver viver
e enquanto vivia
não sofria, vivia.
e agora?
a missão cumprida
a obra feita
viver vale a pena?
traga o cigarro
sem perceber a formiga
subir-lhe as pernas
ferroar-lhe a carne.
ele sorri:
estou vivo
velho e cansado
mas ainda tenho
muito pela frente,
afinal, formigueiros construídos
precisam ser também reformados
e a formiga não se pergunta
se está entediada.
a vida continua.
deu uma última tragada,
jogou o cigarro na lixeira,
levantou dançou cantou
sábia é a formiga,
nunca se pergunta,
               faz

 

o poeta lavra
a palavra dura
e tanto lavra
a lavra dura
que o poema flui

                                r

                                  

                                   i

 

                                     o

                                      

                                        a

 

                                           b

 

                                              a

 

                                                 i

 

                                                    x

 

                                                       o

                                                       

e se perde. 

                                                                                                                                                                      

                                                                                                imenso.

 

no dia dos namorados
o amor é homossexual
no dia dos namorados
o amor é heterossexual
no dia dos namorados
o amor é fraternal
no dia dos namorados
o amor é platônico
no dia dos namorados
o amor é sexual
no dia dos namorados
o amor é altruísta
no dia dos namorados

                                        o amor é amor

 

se a gente veio
d´algum lugar
é bom lembrar
inda que nada resolva
mas é bom lembrar
a gente veio de algum lugar
e vamos a lugar algum
nesse caminhar
  que é o nosso lugar

 

olho os pulsos
e me pergunto:
livro-me destas algemas
ou acredito na mente que não as vê?

 

fotografia de César Augusto de Carvalho

Cesar Augusto de Carvalho, sociólogo, historiador e professor aposentado pela UEL, Universidade Estadual de Londrina, PR, é escritor e poeta. Entre seus livros publicados destacam-se Lado B, contos, (Laranja Original, 2023), Viagem ao Mundo Alternativo: a contracultura nos anos 80 (Unesp, 2008); Histórias de Quem, contos (Desconcertos, 2020), Curto-circuito, poesia (Patuá, 2019), Lavras ao Vento, Pá, poesia (Benfazeja, 2017) e Proesia, poesia (Ed. Do Autor, 2013).

Vários de seus contos foram publicados tanto em jornais e revistas impressas quanto digitais Participou de várias antologias poéticas, além de organizar outras tantas. Dentre elas, destaca-se a Antologia Gente de Palavra Paulistana (Patuá, 2023).

É curador do sarau Gente de Palavra Paulistano que acontece na última 4ª. Feira do mês na Patuscada, Livraria e Café, na Vila Madalena em São Paulo.

Qual é a sua reação?

Gostei
0
Adorei
0
Sem certezas
0

Também pode gostar

Os comentários estão fechados.