Política

O novo Governo Lula (2023) e a ascensão de figuras representativas na democracia brasileira: os povos originários, afrodescendentes e as religiões minoritárias | Aline Batista

O ano de 2023 iniciou com um discurso favorável às expectativas populares semeadas no período eleitoral, com uma reforçada perspectiva de que os anseios populacionais, assim como os seus direitos, acompanhariam a prosperidade democrática e a recuperação da soberania do Estado Nacional, como valores salvaguardados pelo governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com uma governabilidade que inaugurou a execução das suas promessas de campanha, observa-se uma pluralidade nas lideranças de seus Ministérios, dispondo de agendas diversificadas, sua ocupação objetiva a promoção da dignidade dos cidadãos, diversos deles dados como minorias negligenciadas e ainda sub representadas.

 

A cerimônia oficial de posse foi emblematicamente marcada por simbolismos que validam o compromisso para com as aproximações populares e representatividades, com ênfase para a faixa presidencial, que foi passada a Lula, no dia primeiro do mês de Janeiro, após um empenho histórico que culminou em uma “quebra de protocolos” cheia de significados. A mesma foi repassada pelas mãos das seguintes pessoas: um menino preto, um homem com deficiência, um metalúrgico, um professor, uma cozinheira, um artesão ativista, um cacique indígena e, enfim, uma mulher negra catadora cooperativista. O ato foi reforçado com um discurso que justificava a demanda pela diversidade para a expressão nacional.

 

Na defesa de suas proposições para a reconstrução do país, declarou que considerava inadmissível que a população negra e parda permanecesse como a parcela mais pobre do Estado, esse constituído pelo sangue e a escravidão de sua ascendência. Em menção à fé, anunciou que a mesma faria morada em estruturas, templos, igrejas e cultos com diversidade para o exercício livre da religiosidade. E concluindo o seu discurso com a reafirmação de sua missão governamental, confirmou que seus valores se estabeleciam na confiança auferida, objetivando a correspondência para as esperanças populacionais, honrando-as. O que será observado nas sanções e atos do seu primeiro mês de governo.

 

O protagonismo indígena na ideação e execução de políticas públicas indigenistas 

 

E no campo das reparações históricas, os povos originários adquiriram representatividade e devido foco para as suas agendas por intermédio da fundação do Ministério dos Povos Indígenas, dispondo de inserção e poderio no executivo, sob representação da liderança indígena Sônia Guajajara. E com referência, empossou-se Joênia Wapichana, chefiando a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Em sigla, FUNAI), propondo-se na composição de uma política indigenista brasileira sob as perspectivas afirmativas, nos seus locais de fala. Em 133 anos da Proclamação da República, pela primeira vez institucionalmente se vislumbrou a autoridade no governo federal com o enfoque e comando de um indígena. 

 

Em suas primeiras ações presidenciais, no que concerne às legislações sancionadas e direcionadas para os indígenas, evidenciam-se as iniciais políticas públicas executadas na reserva Yanomami, o espaço geográfico ocupado pelos mais de 35 mil indígenas que residem nas aldeias da floresta amazônica, com especificidade na fronteira da Venezuela e do Brasil. As discussões sobre esses povos originários possuíram amplitude em razão da crise sanitária, consequência do garimpo ilegal e dos anos de negligência visualizados no governo do Ex-Presidente Jair Messias Bolsonaro. A comunidade foi alvo de casos de malária e grave desnutrição, uma agressiva e emergencial condição de saúde pública. 

 

Pela declaração de emergência advinda do Governo Federal, além do posicionamento, observou-se agilidade no amparo e efetiva assistência aos indígenas da localidade, assim como a publicização do descaso visualizado. A visita presidencial rendeu a classificação de desumanidade à condição dos Yanomami, originando assim a instauração do Comitê de Coordenação Nacional para discussão e a adoção de medidas que articulem poderes para o fornecimento de atendimento à comunidade, com prazo de operação pelos 90 dias posteriores à sua funcionalização. Constatou-se o resgate e prestação de socorros inicial a cerca de mil indígenas, pela instalação e o funcionamento de um hospital de campanha.

 

Com estrutura da Força Aérea Brasileira (Em sigla, FAB), a operação de socorro instituiu as especialidades necessárias para o atendimento médico emergencial, sendo elas as de clínica, pediatria, ortopedia, radiologia, ginecologia e neonatologia, com a disposição dos instrumentos demandados para os exames laboratoriais. Sequencial ao amparo instituído, determinou-se o início de um inquérito policial para que se apure cada crime executado na reserva dos Yanomamis, o ambiental e ainda o de genocídio. Essas resoluções iniciais reforçam o compromisso presidencial firmado em discurso de posse, designando acesso e cuidado do executivo para com a população minorizada, concedendo voz e intercessão.  


A jurisdição como mecanismo pró liberdade religiosa em uma luta antirracista 

 

É inegável a recorrência do repúdio, de perseguições e prejulgamentos com relação às religiões minorizadas no Brasil, em específico as advindas de matrizes africanas, os alvos costumeiros dos grupos que não possuem o mínimo respeito pela liberdade de crença e, que disseminam inverdades ou creem em falsas colocações sobre sacralidades alheias. Compreende-se que há uma diferenciação declarada da intolerância religiosa para com o racismo religioso, essa designada pelo elemento racial, que amplifica o preconceito e concede enfoque para as manifestações de origem negra, afro indígena e afro diaspórica. Em 2023, a consciência sobre essa colocação é expressa na sanção de uma legislação.

 

A lei mencionada foi sancionada pelo 39.º Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, no primeiro mês da sua posse (11/01), declarando a equiparação do crime de injúria racial ao de racismo, especificando o salvaguardo à liberdade religiosa. Essa ordenação prevê uma pena de dois a cinco anos para indivíduos que impedirem, bloquearem ou da mesma forma empregarem violência às manifestações ou práticas religiosas. Cabe a menção do acréscimo da penalização caso ofensas discriminatórias forem cometidas coletivamente, assim como a exigência do pagamento de penalidades financeiras. Espera-se que auxilie na punição e ampare na proteção da vítima, desvalida mesmo na execução da denúncia.

 

Avalia-se esperançosamente as mobilizações de reparação histórica recém sancionadas. Mais do que simbólica, a operacionalização dessas jurisdições urge como um mecanismo da luta antirracista, validando plena e constitucionalmente a existência de cada cidadão. E como mais um recurso, institucionalmente evidencia-se a composição do “Ministério de Igualdade Racial”, liderado pela Ministra Anielle Franco, compondo-se das subsequentes secretarias recém instituídas: “Políticas de Ações Afirmativas e Combate e Superação do Racismo”, a de “Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana e Ciganos” e “Gestão do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial”.

 

E sucedendo às sanções inaugurais da primeira semana do governo recém empossado, considera-se como simbólica a legislação para inscrição do nome de Antonieta de Barros no livro “Heróis e Heroínas da Pátria”, célebre como uma das primeiras mulheres eleitas no Estado, sendo a primeira negra que assumiu um mandato popular. Com a originação de um marco para a rememoração e o empoderamento da causa dos afrodescendentes e de fiéis de religiões afrodiaspóricas, instituiu-se o “Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé”, (21 de Março), com a referência ao “Dia Internacional Contra a Discriminação Racial”, designado pelas Nações Unidas (a ONU).

 

Observa-se um saldo de primeiro mês constituído pela reconfiguração e remodelação de uma esperançosa democracia, sob expectativas de representação genuína dos povos em suas agendas e com reflexo para suas lideranças. Em uma gestão federal que dispõe de desafios desde a elaboração do seu projeto de governo, ansiando pela igualdade social, permanece a plena espera de uma vindoura efetivação de suas promessas de campanha.

 

FONTES CONSULTADAS 

 

Lei aumenta pena para crimes de intolerância religiosa no Brasil. Disponível em: <https://www.cedefes.org.br/lei-aumenta-pena-para-crimes-de-intolerancia-religiosa-no-brasil/Segundo%20dados%20do%20Minist%C3%A9rio%20dos>. Acesso em: 16 fev. 2023.

Lula reafirma compromisso com democracia e promete atenção à população mais carente. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/01/01/lula- reafirma-compromisso-com-democracia-e-promete-atencao-a-populacao-mais-carente>. Acesso em: 16 fev. 2023.

ORELI, S. J. C. No governo Lula, o perspectivismo indígena e a perspectiva sobre os indígenas. Artigo de Ivânia Vieira. Disponível em: <https://www.ihu.unisinos.br/categorias/ 625331-no-governo-lula-o-perspectivismo-indigena-e-a-perspectiva-sobre-os-indigenas-artigo-de-ivania-vieira>. Acesso em: 16 fev. 2023.

PODER360. Discurso de Lula no Congresso durou 30 minutos; leia a íntegra. Disponível em: <https://www.poder360.com.br/governo/discurso-de-lula-no-congresso-durou-30-minu tos-leia-a-integra/>. Acesso em: 16 fev. 2023.

ROSE SILVA. 31 Ações que marcaram o primeiro mês do novo governo Lula. Disponível em: <https://fpabramo.org.br/2023/02/01/31-acoes-que-marcaram-o-primeiro-mes-do-novo -governo-lula/>. Acesso em: 16 fev. 2023.

 

Fotografia de Aline Batista

 

Aline Batista dos Santos Silva: Graduada em Relações Internacionais pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU de São Paulo pelo Programa Universidade para Todos – PROUNI) | Pesquisadora Acadêmica no Programa de Iniciação Científica – Educadora para a Transformação e o Impacto Social | Membro do think tank CERES – Centro de Estudos das Relações Internacionais do Brasil https://ceresri.org 

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