Cultura

O império universal-reintegracionista | Artur Alonso

 

Primeiro sentir os símbolos, sentir que os símbolos têm vida e alma, que os símbolos são gente. Mais tarde virá a interpretação, mas, sem esse sentir, a interpretação não vem”

(Fernando Pessoa)

Entre o Imanifesto sem forma (arrúpico) e o mundo físico da manifestação (rúpico), situa-se a “Árvore da Vida” e suas esferas (Sephirah).

Na mitologia grega, o caos gera por cisão (separação) – Eros por fusão (união) – Seu irmão Anteros se transforma no seu oponente pela tendência da repulsão, para marcar a polaridade inerente ao mundo efémero da matéria.

Observamos que aquele Caos, da mitologia grega, se poderia corresponder com o Deus Primogénito Andrógino, que dentro de si contém o masculino e feminino; o Adam – Kadmon ou Homem Cósmico dos cabalistas.

A criação em Sânscrito se denomina “Sistih” ou “fruto de manar”- Manar, emanar, fluir – projetar-se.

A criação se projeta desde um centro (ponto axial – como no Big-Bang). Esse ponto permanece imóvel enquanto tudo em seu redor gira – como as galáxias – A seu exemplo os sistemas solares giram ao redor das galáxias – os planetas ao redor do sol central. Estamos diante da dança cósmica que descreveu o poeta Rumi?

Vê como as partículas do ar / E os grãos de areia do deserto / Giram desnorteados.

Cada átomo / Feliz ou miserável, / Gira apaixonado / Em torno do sol.

Vem, / Te direi em segredo / Aonde leva esta dança”

(Jalaluddin Rumi – séc. XIII)

 

Desde esse centro axial, ao raiar da manifestação surge a ponte entre o Imanifesto – Todo Uno – Ilimitado (Ain Soph da Cabala Hebraica) até o manifestado efémero – multiplicado.

 

Na “Árvore da Vida”, essa ponte que surge do ponto de conexão se denomina “Kether” (a Coroa) – Através dela promana a Fonte da vida que, por meio de um processo de densificação (do mais subtil até o mais denso), vai construir os diversos planos universais para, finalmente, chegar ao nosso plano físico.

Assim se parecem referir as diversas mitologias, cujos símbolos (também variados) nos achegam esta visão maravilhosa, do acordar do indiano “Parabrahman” – o AIN SOPH (sem limite) – até ao início, no período de manifestação Manvantara ou Manuantara.

A base desta manifestação é aquela “quinta essência” dos alquimistas, a qual o mestre eubiótico Roberto Luciola chamava de substância. Assim o expressa o autor no seu caderno Fiat Lux, nº1: “Para nós, Substância é aquilo que se manifesta, ou seja, a base da manifestação dos Universos. A Causa Sem Causa do Espírito e da Matéria. É algo que não tem princípio nem fim; que não tem Passado, Presente ou Futuro, que transcende o Tempo, é a Realidade Única incontinente”.

O dicionário (on-line) Priberam, na sua primeira aceção, nos referencia a substância como: “Aquilo que subsiste por si”. O dicionário Dico, no seu sentido filosófico nos fala de substância como: “Princípio do ser, que é permanente, em oposição aos acidentes que são alvo de mudança”.

Poderíamos, de certo modo, imaginar que dos centros de Emanação Superiores surgem por projeção, por promanar da substância que sustenta, os mundos. E junto a eles – aqueles Ancestrais Arquétipos – que cada mitologia atribui àquela Parelha Original – verdadeiros gémeos espirituais – que dão inicio aquele determinado povo; e dizer o “Pai e Mãe Mitológicos”.

Itzamná (o Deus Bom, senhor dos céus e do dia) e Ixchel (senhora da Lua, a Deusa da gestação, da medicina, das águas, da fertilidade e da noite), são o resultado da polarização do Andrógino Divino – na mitologia maia.

Na mitologia suméria, Anu e Aserah cumprem essa função. Aserah como Deusa Mãe passará à mitologia caaneia associada ao Deus ugarítico El-Elyon.

No mundo egípcio, temos Osíris e Isis, com idênticas funções.

Da união destas parelhas mitológicas, surgem as mitologias dos filhos. Estamos, aqui, a falar de uma união mística. Refletindo na terra a união celestial entre a vontade – semente da manifestação – lado masculino e a Taça-útero recetor do impulso – lado feminino – que recolhe aquela semente, e com amor-sabedoria gesta os mundos – universos.

Aqui temos a composição teosófica do Logos Uno ao Logos Triplo – Um Trisquel Inicial – que contém em si- Um primeiro logos – masculino – Pai – vontade – ou mundo das causas – Um segundo Logos – feminino – ou Mãe – recetora no mundo da Planificação ou da Lei Cósmica – e Um terceiro Logos (surgido da anterior união) plano onde os seres físicos se manifestam ou mundo dos efeitos.

O conhecimento eubiótico os nomeará de 1º -2º e 3º Trono.

Em relação a esse esquema, surgem os filhos (metade divinos – metade humanos) de todas as mitologias. Onde uma deusa ou, em certas ocasiões, uma mãe humana – são inseminadas de maneira mística por uma divindade masculina.

 

Assim nasce Quetzalcoalth – o filho divino da mitologia nahualt do México– da deusa Coatlicue. Coatlicue ficou grávida ao cair uma pluma de ave – sobre o seu ventre. Lembremos, por semelhança, a pomba que representa no cristianismo o Espírito Santo, do qual a Virgem Maria ficou grávida para dar à luz ao filho de Deus, Yeshua.

Baal Haddad, divindade de origem mesopotâmica, na cidade de Ugarit vai ser associada ao papel do filho divino – o Touro Sagrado – protetor da comunidade. E dizer o filho do Deus Supremo El e a deusa Aserah. Esta divindade cananeia estendeu o seu culto até à Fenícia. Muitos nomes teofóricos são associados a ele, como os dos famosos generais, os irmãos, Aníbal- e Asdrubal (filhos de Almírcar). A nobre família Barca (que tentaram realizar o belo sonho do Império Universal que integra re-integrando as partes, anteriormente em discórdia).

Aníbal significando o “Recetor da graça de Baal” e Asdrubal como significando a “ajuda de Baal”.

No mito Sumério de Gilgamesh, cuja epopeia poética se calcula foi escrita sobre o ano 2,000 antes de Cristo, o mesmo Gilgamesh aparece associado como filho do Deus Enlil, realizando trabalhos de rigor na matéria, em favor de proteger a humanidade; a qual este homem-gigante deveria ter ajudado a trespassar as trevas.

Nos mitos simbólicos, os filhos dos Deuses – aparecem, na terra, bifurcados em dois aspetos: o do amor e o do rigor. No caso de Gilgamesh, ele vai encerrar os dois aspetos – como Rei terá o rigor do guerreiro – protetor do povo. Ao falhar neste aspeto, empreende uma epopeia em procura de um caminho de libertação – que volte a religar (re-integrar) o ser humano ao Eterno (que se tinham separado por causa da queda do espírito atropado na matéria). O caminho que Gilgamesh percorre é aquele do herói mitológico: o caminho da transcendência.

 

Como filhos do amor temos os Zoroastro, Budha, Cristo… Em Krishna ou Horus, podemos observar trabalhos de amor e rigor ao igual que em Quetzalcoalth ou Viracocha.

Como filhos de rigor encontramos Alexandre, O Grande – associado ao Deus Apolo. Alexandre cuja etimologia remete para o “protetor dos povos”.

Júlio César encarna já o filho dos “Filhos dos Deuses” dado sua mãe Aurélia lhe lembrar continuamente que ele descendia da linhagem de Eneias (o herói troiano da Eneida) emparelhado com a Deusa Vénus. Vénus, que sinaliza a luz da alvorada, também está associada ao celta Lugh, ao Lúcifer caído ou ao Cristo renascido.

Assim pois todas as mitologias partem de uma tríade cósmica – que trabalha na terra com sua contraparte: a tríade menor correspondente. Exceto na religião judaica e na muçulmana. Na tríade cristã a mãe é substituída pelo Espírito Santo – que no entanto tem forma duma pomba feminina.

No Islão, esse Deus transcende o Deus histórico do judaísmo e se torna como o transcendente Parabrahman, dos indianos, que não tem uma representação pictórica.

 

No cristianismo, temos o Deus – auxiliado pela contraparte humana feminina para dar à luz– seu filho: o redentor do mundo. Lembrando aqui a mitologia nahualt, de Quetzalcoalth, como já temos referido.

No caso do Deus Yaweh, as referências históricas nos conduzem a situar o mesmo como um Deus originário da região Moabita (Jordânia atual).

Edomitas, quenitas, moabitas e midianitas, entre outros povos cananeus, adoravam Yahweh. Havendo mesmo evidências de um antigo templo egípcio, dedicado à divindade feminina Hathor, ter incluído também a adoração de Yahweh, perto das minas de Timnah (Isarel) onde trabalhavam comunidades edomitas.

Os dados arqueológicos, atuais, validam a ideia de uma profunda semelhança entre a língua de Canaã e o hebraico bíblico. Os costumes, a cultura, os modos sociais tem muitas semelhanças.

Para a professora da universidade norte-americana de Yale, Christine Hayes, os achados arqueológicos de Ugarit e os textos ugaríticos oferecem o transfundo cultural propício que, mais tarde, daria origem às famosas doze tribos de Israel.

Yahweh originariamente seria uma deidade menor, por baixo do Deus Supremo El. – Em Ugarit, El possui os aspetos específicos que vemos no Deus bíblico do período patriarcal, referido no livro do Genesis. El Shadday, na tradução teológica se nos apresenta visionado como o “Todo-Poderoso”, enquanto que na tradução etimológica resulta em “El- da Montanha”. Sendo que na mitologia ugarítica o Supremo El vai aparecer relacionado com um Deus da Montanha: ancião sábio, de vida eterna.

Francesca Stavrakopoulou, professora do Departamento de Teologia e Religião da Universidade de Exeter, na Inglaterra, nos mostra evidências arqueológicas, textos ugaríticos e pequenos ídolos, onde se mostra uma associação de Yahweh com a deusa Aserah (Deusa mãe adorada na Mesopotâmia como Astarte, Ista ou Inanna) como sendo sua consorte.

Na mitologia fenícia, Astarte estava associada a Baal. Na cidade de Biblos, Astarte era nomeada de “Baalate” (forma feminina para Baal). A palavra Bíblia, do grego βιβλία “livro” e o termo biblioteca derivam precisamente desta cidade: Biblos.

 

Astarte, Istar, Inanna representam a deusa Mãe Cósmica da fecundidade. Deusa amorosa, maternal, sábia. Nomeada de Kubaba-Cibeles no norte da Síria. Entre os gregos lembra as deusas Afrodite e Hera, entre os egípcios Isis e Hathor.

Temos, pois, referências certas para entender que o povo de Israel originariamente cultuava várias divindades, sendo, talvez durante o reinado do rei Josias (630 a.C), por necessidade de diferenciação e homogeneização interna, que o culto ao Deus único teria sido fortalecido e imposto.

No século VIII a.C, já o profeta Oseias se levanta, insurge-se contra a adoração a Baal: “Acontecerá naquele dia, – oráculo de Yahweh- que me chamarás “Meu marido”, e não mais me chamarás “Meu Baal”. Afastarei de seus lábios os nomes dos baais, para que não sejam mais lembrados por seus nomes” (Oseias 2, 18-19).

Os textos bíblicos foram compilados por escribas. Boa parte destes textos circulavam de forma oral e os escribas na sua composição tinham livre arbítrio para incorporar, nos textos, fontes anteriores. Os cinco livros do Pentateuco foram redigidos perto do ano 450 a.C – narrando possíveis eventos, alguns dos quais teriam mais de oitocentos ou mil quinhentos anos de anterioridade.

O facto desta redação já estar afetada pelo caminho “isolacionista” – que marca o rei Josias – pode ter influenciado o formato final da sua redação. Temos aqui, nesta narrativa “isolacionista”, imposta no 630 a.C. um povo eleito por um Deus Supremo, destinado a comandar a humanidade como povo de sacerdotes. Um Deus único, com um único nome, que não pode ser nomeado de outra forma, nem cultuado fora da tradição hebraica.

Esta divisão terá consequências políticas, culturais e religiosas até aos nossos dias.

A ideia anterior de diversas culturas, diversas civilizações, diversos tipos de sociedades, diversas visões políticas, com diversos cultos, mas que poderiam ser unificadas pela essência comum: aquela de um Eterno – Imanente e Transcendente – que desde a sua origem Imanifesta – se manifesta, por meio da sua criação “Sistih” – manando a substância – essência que promana, do subtil ao denso, até tomar forma física – Deus – Eterno – Todo-Uno, ao qual se pode acessar desde a própria essência inata no ser humano, fica anulada por esta conceção hebraica, implantada durante o reinado do rei Josias.

 

Como bem explica Joseph Campbell, no seu famoso estudo de 4 volumes “As mascaras de Deus” (no seu volume II sobre a mitologia Oriental): “A queda e expulsão de Adão do Paraíso não foi, portanto, em nenhum sentido uma divisão metafísica da própria substância divina, mas um evento apenas na história, ou pré-história, do homem. E esse evento no mundo criado aparece ao longo da Bíblia no registo dos sucessos e fracassos do homem na tentativa de religar-se a Deus — sucessos e fracassos, mais uma vez, concebidos historicamente. Pois, como veremos a seguir, o próprio Deus, em certo momento no curso do tempo, por sua própria vontade, moveu-se em direção ao homem, instituindo uma nova lei na forma de um pacto com um certo povo, que se tornou, com isso, uma raça sacerdotal, única no mundo. A reconciliação de Deus com o homem, de cuja criação ele se havia arrependido (Génese 6:6), deveria ser alcançada apenas pela virtude dessa comunidade particular — em seu devido tempo: pois em seu tempo deveria ocorrer a instauração do reino do Senhor Deus na terra, quando as monarquias pagás se desagregariam e Israel seria salvo”.

Esta visão afetou também o cristianismo, ao incorporar entre os seus livros sagrados o Pentateuco, na forma do “Antigo Testamento” – Mesmo assim o cristianismo, ao ver-se afetado pelo neoplatonismo, muito presente no Egito e no norte da África, onde o cristianismo copta original, ainda prevalece como o ramo mais antigo… Ao tempo que tanto Santo Agostinho de Hipona como, mais tarde, Santo Tomás de Aquino fariam prevalecer a essência grega, ao primeiro santo estar muito influenciado por Platão e o segundo por Aristóteles.

A velha tradição grco-romana nunca deixou de permear o Ocidente, estando presente na Roma do Oriente, desde Constantino, como na do Ocidente – Lembrando os Paleólogos de Bizantino, na Idade Média manter a raiz do neoplatonismo, enquanto os Palaviccini de Veneza mantinham a raiz aristotélica. Cósimo de Medicci, ao trazer o mestre Pleto de Constantinopla para Florência voltaria a implementar as escolas neoplatónicas, com Marsilo Ficino, como substituto de Pleto.

Por sua parte, a civilização islâmica foi o farol que manteve em pé os restos da cultura greco-romana, entroncando a mesma com a sua tradição e a tradição oriental da Índia e da Pérsia.

Campbell volta a pôr o foco do seu livro na ideia da separação e das divergências culturais entre o Oriente e Ocidente: “Nas duas tradições (Oriente-Ocidente), o mito do andrógino primevo é aplicado à mesma função: evidenciar a distância do homem, em sua vida secular normal, dos divinos Alfa e Ómega. Mas os argumentos diferem radicalmente e, por isso, sustentam duas civilizações radicalmente diferentes. Pois, se o homem foi afastado do divino por um evento histórico, será um evento histórico que o levará de volta, enquanto, se foi impedido por algum tipo de desvio psicológico, a psicologia será seu veículo de retorno”.

 

No entanto, a visão Oriental de uma essência comum (guardada no Ocidente pela tradição grega), vai-se complementar no mundo cristão ocidental, com as achegas de Nicolau de Cusa, no século XV, e a sua teoria das emanações, que devolvem a ideia de Unidade num Deus – Absoluto. E ativam o sentido da conexão mística, de todas as eras, ao reconhecer que esse Absoluto não pode ser alcançado pela razão, transcendendo a ideia judaica da unidade histórica com Deus quebrada ao afirmar Cusa, somente ser possível a volta à unidade por meio de um retorno – reintegração mística: unindo a essência comum metafísica do homem com a essência metafísica Total que é Deus.

A mística do retorno por meio da conexão com o divino também vai estar presente no cristianismo ortodoxo oriental, e no Islão por meio do sufismo. Assim acontece no judaísmo através da Cabala – mesmo assim, o movimento sionista realça na sua prática política a ideia de um mesianismo não místico ou simbólico, se não como processo histórico, que vai afetar o próprio misticismo judaico, assentando o mesmo no ideal de povo eleito, com terra eleita, destinado a comandar a humanidade.

Certa similitude vemos com um certo cristianismo que levará aos Estados Unidos o ideal da “excecionalidade” de um povo destinado a guiar e comandar a humanidade. Esse ideário, que vigorou, no Ocidente, com muita força durante o século XIX, sustentou no período colonial a imposição do modelo civilizacional Europeu.

Modelo eurocêntrico que permitiu e incentivou os abusos sobre as populações autóctones; justificando mesmo o extermínio indígena nos Estados Unidos ou a aniquilação de metade da povoação do Congo, nos tempos de Leopoldo II da Bélgica. Das suas visões mais extremas surgiu o nazismo.

Pelo contrário, na Península Celtibérica, o ideal cristão universal – do “catos” do catolicismo teve menor escrúpulo na hibridação, ainda que justapondo por cima da civilização vencida o simbolismo da nova…

Mesmo nos piores momentos de conquista e imposição de uma cultura ou civilização sobre outra (junto a seus abusos), a possibilidade de substituição, na base de compartilhar uma essência comum, permitia uma certa sincretização. Foi o que aconteceu na conquista espanhola da América – onde o culto nahualt à Deusa – Mãe Tonantzin (no cerro de Tepeyac) é subsistido pelo culto da mãe de Deus, a Virgem Maria – na figura da Virgem de Guadalupe.

Eis pois que as perversas tendências da imposição de um modelo único – excecional – baseado num Deus único – ao serviço de um povo eleito – ou sua abordagem materialista de um povo eleito para comandar a humanidade – sempre partiram de uma visão “isolacionista” – não fractal.

 

Na geometria da natureza, encontramos os fractais – como partes dentro da unidade. Partes que repetem os traços, a aparência do todo completo – criando uma espécie de padrão repetitivo – onde a unidade, de algum modo, mantém a sua essência na individualidade (como no floco de neve de Koch).

Essa é a essência do Império Universal: uma unidade Estatal unindo as diversas partes, pela essência, respeitando, no seu seio, as diversas culturas, sociedades e cultos. Isso permite um Estado mais expansivo – multicultural, integrado pela essência comum – do Divino e humano, manter aquela unidade essencial – vivificada de diversos modos, que não são contrários – se não complementares: exemplos das diversas formas de expressar a mesma unidade. Esta é a verdadeira ideia ou ideal Reintegracionista: o ideal verdadeiramente universalista.

O ideal que conservaram os grandes homens e mulheres que deixaram lembranças a toda a humanidade, pelo seu trabalho em prol da unidade, da paz e da aplicação da lei, seguindo aquela visão da República de Platão, do bem, da beleza e da justiça. Tendo em conta os distintos contextos históricos e a tónica evolutiva da humanidade, em cada determinado momento.

Por cima das personagens históricas, prevaleceu na tentativa destes seres o “Arquétipo Universal” do Filho, que se torna Pai Protetor dos seres humanos.

Assim foram entre outros os ideias que motivaram o Sargão da Acádia, Assurbanípal do Império Neoassírio. Ciro I e Dario, O Grande da Pérsia. 

Alexandre Magno – que recebeu essa visão dos persas completando, assim, a ideia da helenização. Os impérios mongóis da Índia (durante os seus períodos de esplendor). O domínio na Mesoamérica de Toltecaya, no período clássico e, mesmo, a ideia de Saladino (ao expulsar aos cruzados e tomar de novo Jerusalém, a cidade dos três cultos). Igualmente os Omeya de Córdova, no auge do Al-Andalus…

O império chinês do céu – China na etimologia de centro – Gengis Khan e Tamerlão. Aquele foi o sonho que Napoleão matou ao tornar-se demasiado egocêntrico.

Como já falado por cima das personagens históricas, no imaginário coletivo da humanidade prevalece o sonho, ainda por conquistar, da necessária Fraternidade.

Hoje de novo a humanidade encontra-se numa nova encruzilhada, onde terá de eleger, entre um mundo dominado por uma potência “isolacionista”, aplicando as suas regras ao resto da humanidade ou um mundo onde o “Império da Lei” permita a integração na unidade, dentro da diversidade, com um novo marco marco jurídico e político multipolar, consensualizado por todas as partes.

E, assim, podemos de novo observar o ideal do Império Universal, que sonhamos como utopia – horizonte a ser realizado no futuro propício, em que a humanidade estiver pronta – liberada de seus próprios medos… Momento em que todas as culturas e todos os seres vão poder abraçar-se.

Esse ideal de ir construindo o futuro com justiça, amor e beleza deve ser construído ultrapassando as provações do presente.

Esse ideal nos volta a pôr de novo cara a cara com o embate dos dois projetos: o isolacionista de um poder comandando e impondo a sua cultura e a sua visão de mundo ao resto…

Ou o modelo reintegracionista – do Império Universal a realizar – entre todos e todas, onde todas as culturas e todos os povos têm direito à sua soberania e ao seu caminho para encontrar a transcendente unidade. Unindo as partes pela essência comum.

A decisão é nossa. E não fazer a escolha e deixar que outros, no cimo, escolham por nós, os filhos e filhas de todas as raças. Filhas e filhos na mãe Terra unidos, com o seu entorno natural. Entorno a ser respeitado – para desde ele unir-nos com a Mãe Cósmica e o Pai Cósmico, a Eles, pela substância comum conectados.

Lembrando aquelas sábias palavras do poeta brasileiro Mário Quintana: 

 

“A amizade é um amor que nunca morre”

 

 

Fotografia de Artur Alonso Novelhe

 

Artur Alonso: escritor com vários livros editados de teatro, poesia, ensaio e romance… Ex diretor do Instituto Galego de Estudos Internacionais e da Paz. Ex secretario do Instituto Galego de Estudos Celtas. Membro do Conselho Consultivo do Movimento Internacional Lusófono. Membro de Honra da Associação de Escritores.Mocambicanos na diáspora. Membro do Conselho de Redação da Revista Identidades, etc.

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