Cultura

O barulho do fim do mundo | Denise Emmer

A escritora Denise Emmer encontrou forma original de contar a história de Amiudinha, protagonista de O barulho do fim do mundo (Ed. Bertrand Brasil). A menina que vive com a mãe sanguessuga e o padrasto abusador cria um universo particular e poético para suportar a vivência. Moradia de 200 anos se torna uma aliada de Amiudinha e começa a ruir, o que se torna evidente a cada abertura de capítulo 

 

Foi há quatro anos que começou O barulho do fim do mundo e grande parte do romance foi escrita durante a pandemia. Obra explora temas como solidão, abandono e falta de ar e de socorro. Denise Emmer tem graduação em física e em música, é poeta e romancista reconhecida com diversos prêmios nacionais e internacionais, entre eles o Alceu Amoroso Lima Poesia e Liberdade, APCA, José Martí (Unesco), Pen Clube do Brasil, Prêmio ABL de Poesia e Prêmio Olavo Bilac (ABL). Publicou 23 livros ao longo de sua trajetória literária, e seus poemas estão em antologias dos Estados Unidos, da Espanha, da Itália e da Turquia

 

 “Para escrever O barulho do fim do mundo, decerto, arrisquei-me, não só na solidão do vazio cósmico, como na escuridão das moléstias, no submundo dos carrascos, e na desvalorização da vida”, Denise Emmer

 

 

O BARULHO DO FIM DO MUNDO

Denise Emmer

 

168 págs. | R$ 54,90

 

Ed. Bertrand Brasil| Grupo Editorial Record

 

Informações à imprensa:

 

ro.tavares@record.com.br |Rô Tavares

                        

www.blogdaeditorarecord.com.br

 

Em O barulho do fim do mundo (Ed. Bertrand Brasil), Denise entrega aos leitores uma narrativa que mescla o imaginário e o real, uma trama de fantasia e horror tecida com seu lirismo de poeta, sua musicalidade de violoncelista e sua perspectiva cósmica de física. Na trama narrada por uma casa com vida própria, conhecemos uma mãe cruel, um padrasto abusador e uma menina vítima dos dois. Amiudinha, obrigada a trabalhar e servir, tratada como uma escravizada para que lhe permitissem usufruir de teto e comida. 

 

Abandonada pelo pai ainda bebê — pelo simples fato de nascer mulher — cresceu sem saber o que era o amor materno, não teve uma mãe, apenas uma sanguessuga que a explorava nos trabalhos domésticos. A casa é tudo que ela conhece e sua grande companheira e aliada. E, pela menina, a casa é capaz de tudo.

 

Uma edificação de 200 anos, isolada de tudo e de todos, mas cheia de histórias para contar. Num raio de cem quilômetros não há outra morada com quem possa compartilhar as aventuras de abrigar criaturas mágicas, como o mestre e o piano que hospedou, com melodias que alcançavam os astros mais remotos, ou o circo que ocupou seus aposentos e lhe arrancava boas gargalhadas. Agora abrigava uma pequena família que corroía seus alicerces.

 

“Minhas chaminés, quase mortas e encardidas, faziam-nos cansar e tossir. Tossir. Tossir. E era nessa hora que os quartos sacudiam. As lâmpadas queimavam e as cortinas ventavam como saias. Dos telhados, caíam telhas avermelhadas qual hemoptises do tuberculoso que morou em mim. Não seria a sua bactéria ainda a circular por meus ares, mas outra, nova, avassaladora, advinda dos hábitos insalubres e repugnantes dos meus habitantes de agora. Sem a criada Miúda, filha e escravizada, comiam o que se arrastasse nos chãos mais imundos”, relata a casa-narradora.

 

Completamente sozinha e desamparada, tendo sido vítima de uma violência sexual, não tinha a quem gritar sua dor, não tinha a quem pedir socorro. Da sensação de quase morte e tentando fugir da dor que sentia, Amiudinha adormeceu e de seu sonho um cão ganhou vida, um devoto animal surgirá da desesperança. Enorme e iluminado, o cão Lanterna tornou-se real, destinado a proteger e guardar a integridade da menina.

 

Prestes a dar à luz, a menina se refugia no sótão com o cão. Ali, Amiudinha, sua filha Céu e o cão Lanterna vivem suas aventuras como se estivessem em um mundo à parte. Mas, enquanto isso, a casa começa a sentir os efeitos de ser regida somente pelos tiranos. 

 

“A tudo eu via e chorava pelas trepadeiras umedecidas dos muros. Um objeto colonial impotente, o que eu era. Presa na imobilidade de minha condição de coisa. Edificação no meio do mundo, isolada, para que ninguém jamais ousasse me saber vivo elemento de concreto. Minha fachada de pedras sobrepostas, seria o meu silêncio diante dos episódios que se passavam. Quero dizer que, em mim, as pedras franziam as testas. Dos batentes de madeira das minhas inúmeras janelas, escorria um soro de salgada tristeza”, lamenta a casa-narradora.

 

Denise Emmer explora o realismo mágico para preencher as lacunas do inimaginável. Um cão vindo dos sonhos, uma escola de bailarinas das estrelas, e a casa que narra a história e tem vida própria. Denise toca nas feridas mais profundas dos assédios hediondos e escancara os medos.

 

TRECHOS DO LIVRO

 

“Era preciso expurgar os demônios impregnados em sua pele juvenil. Esfolando-a. Sangrando-a. Autoflagelando-se para livrar-se da cicatriz e do odor fétido do falo peçonhento. Passaria o resto da vida a lavar-se compulsivamente para um dia se livrar da culpa de ser mulher” 

 

“Assim ficou abraçada a si mesma, como um caramujo que não quer saber do mundo ao derredor. As chagas haveriam de cicatrizar no decorrer do tempo, quem sabe. Mas a alma, atravessada em pedaços de morte, não se levantaria do chão. Nunca mais.”

 

“A quem falar do grave fato para abrandar a aflição do seu espírito, da infâmia e do embaraço? Quiçá gritar como quem lança a funda angústia aprisionada no peito de menina. Para quem? Para onde haveria de exclamar sua tragédia? Quem lhe daria o crédito e a resposta. A palavra de uma criança contra a de um monstro”

 

Fotografia de Denise Emmer

 

Denise Emmer é natural do Rio de Janeiro. Poeta e romancista, tem graduação em física e em música. Denise é uma das mais consagradas poetas brasileiras, reconhecida com diversos prêmios nacionais e internacionais, entre eles o Alceu Amoroso Lima Poesia e Liberdade, APCA, José Martí (Unesco), Pen Clube do Brasil, Prêmio ABL de Poesia 2009 e Prêmio Olavo Bilac (ABL). Publicou 23 livros ao longo de sua trajetória literária, e seus poemas estão em antologias dos Estados Unidos, da Espanha, da Itália e da Turquia.

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