Cultura

Mãos de Deus: biografia autorizada do padre Júlio Lancellotti | Luiz Eduardo de Carvalho

Foto de Karsten Winegeart na Unsplash

 

Mãos de Deus – biografia autorizada do padre Júlio Lancellotti

por Luiz Eduardo de Carvalho

Editora Calêndula

ISBN 978-65-982594-3-3

1ª edição, 2024

432 páginas, lombadas costuradas

Sinopse Curta:

Mãos de Deus é a biografia autorizada, em tom jornalístico salpicado de ligeiras incursões literárias, do pe. Júlio Lancellotti, conhecido pela atuação junto a detentas do sistema carcerário, crianças abandonadas e adolescentes em litígio legal nas Febems, protagonista na formulação do ECA, no acolhimento de crianças com AIDS e vigário da Pastoral do Povo de Rua. Formação, influências, fatos, reconhecimentos, oposições e depoimentos compõem este relato sobre o importante humanista contemporâneo.

Sinopse Longa:

Apresentada com linguagem objetiva, predominantemente jornalística, salpicada com pontuais incursões literárias, que conferem emoção a alguns episódios narrados, Mãos de Deus conta a história do enfermeiro, pedagogo, teólogo e sacerdote Júlio Renato Lancellotti em tom quase memorialista, uma vez que é repleta de depoimentos e declarações do protagonista biografado a respeito de si mesmo, dos fatos que transcorreram em sua vida e das interações com pessoas que foram fundamentais para sua história e que, em todos os casos, marcaram sua trajetória positiva ou negativamente. Somam-se a isso, dezenas de outros depoentes a acrescentar visões diversificadas por pontos de vista coadjuvantes.

Considerando depoimentos, livros, periódicos, artigos, matérias, reportagens, entrevistas e participações em programas televisivos e radiofônicos, a monta de registros jornalísticos, bibliográficos ou acadêmicos envolvendo este relato a respeito do padre Júlio ultrapassa a casa de 650 ocorrências que foram cuidadosamente consultadas, decupadas e compiladas em Mãos de Deus, com o fito de fornecer um conjunto de informações articuladas que representa o mais largo e profundo perfil, na forma de uma biografia autorizada, já escrito a respeito deste importante personagem humanista contemporâneo.

 A obra principia com um preâmbulo, no qual o autor expõe as motivações voltadas ao coletivo, seguidas das decorrentes de fomento pessoal e apresenta uma premiada crônica composta em homenagem ao biografado. O livro, então, deriva para a narrativa dos fatos circunstanciados pela história da vida do padre Júlio, desde a infância no período pré-escolar, atravessando toda sua formação, até se consumar com seu ordenamento como sacerdote. A seguir, abre-se aos tópicos que mais marcaram sua vida eclesiástica, desde a influência de fatos históricos, de movimentos ideológicos, de mestres e ídolos, até à sua atuação junto às detentas do Presídio Feminino do Tatuapé, onde foi capelão por muitos anos; junto aos internos das diversas unidades da Febem, onde trabalhou por muitos tempo como funcionário direto e, depois, lotado na Pastoral do Menor, cuja fundamentação acompanhou desde o princípio; seu envolvimento visceral com a formulação do Estatuto da Criança e do Adolescente; a histórica luta pela abertura e manutenção da Casa Vida para o acolhimento de crianças portadoras do vírus HIV, o protagonismo expoente, desde a nascente e até os dias de hoje, na Pastoral do Povo de Rua, da qual é o vigário há exatos trinta anos.

Sempre sob duas vertentes são apresentadas sua prédica e sua práxis: a metodológica, que apresenta seus pensamentos e suas ações norteadas pelo embasamento teórico em todas as frentes em que atuou e a política, que determinou as tentativas, muitas delas exitosas, de consolidação dos resultados de sua luta como um legado permanente, mediante a instauração de marcos legais ou a incorporação em políticas públicas para assegurar a continuidade dos avanços pelos quais tanto se debateu.

Não poderiam faltar, decerto, os tantos reconhecimentos e as muitas oposições ao seu trabalho, desde os expressos em simples descontentamentos ou em orquestradas intrigas, passando pelos que tentaram constrangê-lo, denegri-lo ou derrubá-lo e culminando com circunstâncias em que ele esteve realmente em grande perigo de vida, sob ameaça de morte.

No encerramento, após um rol de mais de trinta depoimentos de pessoas e entidades, com juízos de cunho valorativo a respeito de sua pessoa, de suas ideias e de sua luta, são apresentadas ementas dos 268 artigos e crônicas que escreveu e publicou semanalmente por mais de 5 anos em um jornal de grande circulação em São Paulo.

O desfecho fica em aberto na expectativa dos próximos anos de sua vida que, certamente, renderão muitas outras histórias que, emanadas das mãos de Deus, convergirão para um reconhecimento ainda maior do que o juízo a respeito dos fatos narrados em Mãos de Deus possam criar na mente dos leitores dispostos a conhecerem o padre Júlio Lancellotti que, para muitos, é o mais representativo profeta vivo de nossos dias.

Texto de abertura da Parte IV, Mais Pelas Mãos de Deus, da biografia autorizada do padre Júlio Lancellotti, Mãos de Deus. O trecho denomina-se Meninos e Meninas Jesus e foi cedido para publicação com exclusividade na Revista InComunidade pelo autor da obra, Luiz Eduardo de Carvalho:

Meninos e Meninas Jesus

“Pelo que se mostrou de seu protagonismo em defesa dos menores da Febem, a criança sempre teve lugar de centralidade na prédica e na atuação do padre Júlio Lancellotti. Muitas histórias poderiam ilustrar a inspiração dessa preponderância, uma delas, talvez com mais emoção, remonta a quando, ainda nos primeiros dias de sacerdócio, em 1985, ele rezava uma missa na Comunidade Nossa Senhora da Boa Esperança, no Jardim Sinhá, Sapopemba, periferia de São Paulo, e uma criança de uns seis anos de idade entrou, seguida pelo seu cãozinho vira-latas, passou por baixo do altar e ficou do seu lado a ouvir atenciosamente a homilia que falava em solidariedade e partilha. O menino, pequeno e magrinho, estava descalço, com nariz sujo, cabelos sem lavar, mas com os olhos brilhantes a observar enquanto ouvia o sermão com atenção.

Padre Júlio quis falar com ele, saber seu nome e com a mão o aproximou de si. De repente, sem motivo aparente, ele passou de volta por baixo do altar e foi embora, saiu pela porta da igreja acompanhado pelo fiel cãozinho e pelo olhar do padre que, ainda ocupado com a celebração, lamentou intimamente não ter podido saber seu nome. A missa ia adiantada, quando o menino voltou, com o cachorro, passou por baixo do altar novamente e, com um saquinho plástico na mão, olhou para o padre e disse que trouxera aquilo para repartir com quem nada tem. Em sua pequenina mão estava a oferta de um pouco de arroz. Estupefato, o sacerdote recebeu a oferta enquanto o menino acrescentava que havia pedido aquilo para a mãe, com a intenção de dar a quem não tem comida. “Foi difícil segurar a emoção para terminar a celebração”, conta padre Júlio.

Depois da missa, o padre acompanhou o menino até onde estava sua mãe que lhe contou que, diante do pedido do filho para dar um pouco aos pobres, argumentou que eles próprios eram pobres e nada tinham, mas que o menino insistiu em ofertar a partilha porque, na igreja, o padre disse que era preciso repartir e, por isso, ele argumentou que, mesmo eles nada tendo, havia quem tivesse menos ainda. “Nunca esqueci a lição daquele menino e da própria comunidade, onde o fato se deu, que, nascida pobre e pequena, cresceu em amizade e dedicação à luz desse exemplo vivo de solidariedade”, conta o padre Júlio ainda com ecos de enternecimento e motivação daqueles dias.

 

fotografia do Padre Júlio Lancellotti.

 

fotografia do Padre Júlio Lancellotti e Luiz Eduardo Carvalho.

 

fotografia de Luiz Eduardo Carvalho.

Nota biográfica: Luiz Eduardo de Carvalho estudou Farmácia e Bioquímica e Letras na USP e formou-se em Comunicação Social na ESPM, é licenciado em Língua Portuguesa pela Universidade Nove de Julho e fez o Curso de Extensão Universitária de Escrita Criativa: Técnicas e Práticas da PUC RS. Sempre atuou na intersecção entre Cultura, Educação e Política, tendo emprestado da Comunicação Social as ferramentas para as pontes: professor, teatrólogo, publicitário, jornalista e gestor cultural, dedica-se exclusivamente à produção literária desde 2015, conquistou 113 prêmios literários. Publicou 17 títulos: O Teatro Delirante, Retalhos de Sampa, Sessenta e Seis Elos, Frasebook, Xadrez, Quadrilha, Evoé, 22!, O Pirata Grilheta e os Dragões do Mar, Um Conto de Réis (e de Rainhas), Crônicas do Ofício, Curtas-metragens, Cabra Cega, Q Absurdo!, Multiversos, Mãos de Deus – Biografia do Padre Júlio Lancellotti e Os Primeiros Músicos. No prelo: Bicho-da-Seda.

 

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