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As religiões de matriz africana em Portugal | Wesley Sá Teles Guerra

As religiões de matriz africana em Portugal

O número de terreiros e casas de umbanda em Portugal aumenta como reflexo do incremento da comunidade brasileira no país luso, próxima de alcançar as 400 mil pessoas, além da influência da comunidade africana. 

 

Embora a relação entre o país e as religiões de matriz africana sejam muito mais antigas que os processos migratórios atuais,  já que Portugal, nação com uma rica história de exploração marítima e encontros culturais, foi a primeira nação europeia a circundar a África,  estabelecendo contato com diferentes manifestações religiosas que iam além do Islã , que já esteve presente em terras portuguesas, durante o reino do Al-Andalus por aproximadamente 500 anos. 

 

Entre essas tradições religiosas, as religiões de matriz africana com origem nas tradições Yorubá e Nagô, entre outras, desempenham um papel significativo, tanto como expressões espirituais para seus praticantes, quanto como elementos importantes da identidade cultural lusófona não sendo a mesma exclusiva dos imigrantes, mas com adeptos portugueses entre seus fiéis.

 

Dentro do contexto das religiões de matriz africana em Portugal, destacam-se principalmente três tradições: Candomblé, Umbanda e cultos de origem bantu, como o Batuque e o Tambor de Mina. Cada uma dessas tradições possui características únicas, influenciadas pelas culturas e regiões específicas de onde se originaram. Por exemplo, o Candomblé tem suas raízes principalmente na região da África Ocidental, enquanto o Umbanda é uma religião sincrética que combina elementos do Catolicismo, Espiritismo Kardecista e tradições indígenas brasileiras.

 

Cabe lembrar que o Kardecismo ou espiritismo, de origem francesa, teve uma rápida expansão na Europa durante o século XIX porém inibido pela Igreja Católica, que ainda mantinha grande influência política na região, sendo relegado às colônias. Atualmente, segundo a Federação Espírita do país existem 120 casas ou centros de culto.

 

 

 

Federação Espírita Portuguesa

 

Na atualidade, a Umbanda é a principal manifestação de origem africana em Portugal,  fortemente ligada à migração brasileira porém com um crescente número de praticantes de origem portuguesa ou africana, com a característica de absorver, por vezes, tradições pré-romanas de regiões do norte de Portugal.

 

As religiões de matriz africana em Portugal

As práticas religiosas dessas tradições muitas vezes envolvem rituais complexos, incluindo cantos, danças, oferendas e cerimônias de invocação aos ancestrais e divindades. Os rituais são conduzidos por sacerdotes ou sacerdotisas, que desempenham um papel crucial como mediadores entre o mundo espiritual e os crentes. A música e a dança desempenham um papel fundamental nessas práticas, servindo como meios de comunicação com os deuses e espíritos, resultando em uma ritualística mais atrativa para jovens.

 

Associação Terreiros de Portugal

 

Assim mesmo, o papel da Igreja Católica no país, ora admirado, ora temido, e a vinculação da mesma ao conservadorismo fomenta a uma ingente perda de fiéis nas igrejas católicas.

 

Apesar da presença significativa das religiões de matriz africana em Portugal, essas tradições enfrentaram e ainda enfrentam desafios, incluindo estigmatização, discriminação e marginalização, sendo muitas vezes relacionadas com aspectos negativos da migração. 

 

No entanto, nas últimas décadas tem havido um movimento crescente em direção ao reconhecimento e valorização dessas tradições como parte integral do patrimônio cultural português já que foram os mesmos que, de alguma forma ou outra, viabilizaram sua integração ao liderar o fluxo de escravizados para as colônias sendo consequentemente parte da história portuguesa, além da história brasileira.

 

Além de seu significado espiritual e religioso, as religiões de matriz africana também desempenham um papel importante na formação da nova identidade cultural portuguesa quando levado em consideração o incremento dos descendentes nascidos em Portugal das diversas comunidades migrantes presentes no país. 

 

Elas contribuem para a riqueza da diversidade cultural do país, influenciando a música, a dança, a culinária e outras formas de expressão cultural. Além disso, essas religiões têm desempenhado um papel crucial na promoção da inclusão e da diversidade, oferecendo um espaço de pertencimento e empoderamento para comunidades afrodescendentes em Portugal.

 

Assim mesmo, o sincretismo presente na Umbanda é fruto da ação indireta de Portugal nos cultos africanos, ao gerar paralelismos entre os santos católicos e as essências dos orixás, movimento este que no Brasil tem caído em desuso.

 

Porém, ainda é comum ver a Iemanjá sincretizada em Nossa Senhora dos Navegantes, Iansã em Santa Bárbara, Obá em Santa Luzia, Oxalá no Sagrado Coração de Jesús, Nanã Buruquê em Santa Ana, etc.

 

O panteão Yorubá está sincretizado em santos católicos.

 

As religiões de matriz africana em Portugal representam uma parte essencial da herança cultural e religiosa do país como tal, não sendo algo exclusivamente alheio ou estrangeiro, já que isso seria negar seu domínio durante centenas de anos no Brasil e demais colônias. 

 

Suas tradições ricas e vibrantes continuam a desempenhar um papel vital na vida espiritual, cultural e social de muitos portugueses, ao mesmo tempo em que contribuem para a diversidade e a pluralidade da sociedade portuguesa como um todo. É fundamental reconhecer e valorizar a importância dessas tradições, tanto em termos de patrimônio cultural quanto de promoção da justiça social e da igualdade.

 

fotografia de Wesley Sá Teles Guerra

 

Wesley Sá Teles Guerra, formado em Negociações Internacionais pelo Centre de Promoció Econômica del Prat de Llobregat (Barcelona), Bacharel em Administração pela Universidade Católica de Brasília, Pós-graduado em Ciências Políticas e Relações Internacionais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, MBA em Marketing Internacional pelo Massachussetts Institute of Business, MBA em Parcerias Globais pelo ILADEC, Mestrado em Políticas Sociais com especialização em Migrações pela Universidade de A Coruña (Espanha), Mestrado em Gestão e Planejamento de Cidades Inteligentes (Smartcities) pela Universitat Carlemany (Andorra) e doutorando em Sociologia e Mudanças da Sociedade Contemporânea Internacional. 

Atuou como paradiplomata e especialista em cooperação internacional e smartcities para a Agência de Competitividade da Catalunha (ACCIÖ – Generalitat de Catalunya), atualmente é colaborador sócio do Instituto Galego de Análise e Documentação internacional (IGADI) e do Observatório Galego da Lusofonia (OGALUS), Também participa como coordenador da área de Economia, Ciência e Tecnologia do CEDEPEM – UFF.

Idealizador e diretor do CERES – Centro de Estudos das Relações Internacionais, membro do Smart City Council, do IAPSS International Association for Political Sciences Studentes, do Consório Europeu para a Pesquisa Política, REDESS, Centro de Estratégia e Inteligência das Relações Internacionais e colaborador da ANAPRI.

Autor dos livros ”Cadernos de Paradiplomacia” (2021) e “Paradiplomacy Reviews” (2021) além de participar do livro “Experiências de Vanguarda, no ensino nos países lusófonos” publicado em 2021 pelo CLAEC e organizado pela Dra. Cristiane Pimentel. 

Professor, articulista e especialista: wesleysateles@hotmail.com

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