Cultura

A lenda de Inês de Castro nos Lusíadas e em Corona De amor y muerte | Ester Abreu Vieira de Oliveira

Túmulo de Inês de Castro.

Resumo: Pretende-se mostrar, entre a História, a Literatura e o Mito,  o amor entre o príncipe Pedro e Inês de Castro a partir de um olhar sobre  um olhar épico de Os Lusíadas  e o projetar desse amor na obra dramática de Alejandro Casona: Corona de amor y muerte, La leyenda de Inés de Castro. 

 

Palavras Chave: História/ Mito/ Literatura. Camões: Os Lusíadas. Inês de Castro.

 

Resumé: On veux démontrer dans l´Histoire, la Littérature et le Mythe,  l´amour entre le prince Pedro et Inês de  Castro grâce à un regard sur Os Lusiadas et le projeter  cet amour dans le théâtre.

 

Mots Clés: Histoire/Mythe/ Littérature. Camões: Os Lusíadas. Inês de  Castro.

 

CAMÕES: UM HOMEM DE SEU TEMPO E SUA OBRA MESTRA

 

Luis de Camões, poeta renascentista português, traz em si uma literatura: a portuguesa, pois, mundialmente, reconhece-se que Os Lusíadas envolve todo o povo lusitano. Essa é a obra máxima de Camões, síntese e sublimação da literatura portuguesa. Poema épico que funde ciência e ficção e expressa a luta do Homem contra as forças da Natureza e as batalhas do Homem contra o Homem.

 

 Em Os Lusíadas congregam-se ideais: o nacional, o religioso e o humanístico, e manifesta-se o saber de uma civilização ocidental e o seu desejo utópico expansionista. O acontecimento central de Os Lusíadas é a viagem de Vasco da Gama à Índia, citado no Canto V, estr. 94, v. 1 a 4: 

 

Trabalha por mostrar Vasco da Gama

Que essas navegações que o mundo canta

Não merecem tamanha glória e fama

Como a sua, que o céu e a terra espanta. 

 

O sucesso da empresa foi prognosticado pela Ninfa “Não vos hão-de faltar, gente famosa,/ Honra, valor e fama gloriosa.” (CAMÕES, Canto X, estr. 74 v. 7-8).

 

Tetis1, no Canto 10, dirá a Gama que a sapiência divina lhe concedia a possibilidade única, não acessível ao saber dos homens, o poder de ver a máquina do Mundo. Nela, Gama verá nações e povos com suas culturas, montanhas e planícies, lagos e mares:

 

Vês aqui a grande máquina do Mundo,

Etérea e elemental, que fabricadas

Assi foi do saber, alto e profundo,

Que é sem princípio e meta limitadas.

Quem cerca em derredor este rotundo

Globo e sua superfície tão limada,

É Deus: mas o que é Deus, ninguém o entende,

Que a tanto o engenho humano não se estende. (CAMÕES, estr. 80)

 

Mas em Os Lusíadas, Camões, além de narrar o caminho para a descoberta das Índias, que os deuses, convocados por Júpiter se pronunciaram sobre a empresa dos Lusitanos e prognosticaram esplendor e majestade, introduz um tema histórico e fala sobre as grandes navegações, o império português no Oriente, os reis e  heróis de Portugal, dentre outros fatos que tornam a epopéia camoniana um poema histórico, enciclopédico. Entre os reis, dedica-se a falar de D. Manuel I, ordenando a viagem: “Vá gente que mandar cortando os mares/ A buscar novos climas novos ares” (CAMÕES, Canto IV, estr. 76, v. 7-8) e mostrando a extensão do reino do pólo Norte ao pólo sul: “Vedes a grande terra que contina/ Vai de Calisto ao seu contrário Pólo,/ Que soberba a fará a  luzente mina/ Do metal que  cor tem do louro Apolo?” (CAMÕES, Canto X, estr. 139, versos 1-6). Na estrofe 140, do Canto X , v. 1 – 6, o poeta  menciona o Brasil, “Santa Cruz”,  terra do futuro domínio português: 

 

Mas cá onde mais se alarga, ali tereis

Parte também, c´o pau vermelho nota;

De Santa Cruz o nome lhe poreis;

Descobri-la-á primeira vossa frota,

Ao longo desta costa que tereis;

irá buscando a parte mais remota

 

O poderio expansionista português e a figura do rei levou-nos a compor o poema  Dom Manuel I.

 

“Há nos seus olhos o sonho do Oriente

e a profundeza dos mares inexplorados.

Lisos cabelos pretos cobrem a testa

de Dom Manuel, o venturoso rei

de Portugal daqui e dalém mar.

Uma barba longa de sábio senhor escurece

a testa varonil, do rei Pio, pelos hebreus chamado.

O rei de Algarve só viu em sua nação prosperidade

porque assim os fados o determinaram.

Gama lhe abre os mares exóticos.

Mas é Cabral que lhe dá o mais rico presente:

Uma terra santa, verdejante e rica”.

Conta-se que Camões morreu pobre e que seu escravo Jau à noite mendigava o sustento de ambos e que amou a várias mulheres. Mas ele deixou para a posteridade uma riquíssima obra e mostrou nela o seu vasto conhecimento. Ele recebeu a informação humanística em Coimbra, mas desenvolveu sua personalidade em Lisboa e nas andanças por mares e terras, onde diz ter sofrido inúmeras necessidades e não ter tido o reconhecido valor. Citamos lamentos do poeta no Canto VII de Os Lusíadas, principalmente, nas estrofes de 79 a 83. Como exemplo, indicamos a estrofe 81, desse Canto:

 

E ainda Ninfas minhas não bastava

que tamanhas misérias me cercassem,

Senão que aqueles que eu cantando andava

Tal prêmio de meus versos me tornassem;

A troco dos descansos que esperava,

Das capelas de louro que me honrassem,

Trabalhos nunca usados me inventaram,

Com que em tão duro estado me deitaram!

 

Com outro desabafo poético o eu lírico camoniano em Os Lusíadas no Canto X, estr. 9, apresenta-se cansado e antevê a chegada da velhice. Ele se queixa dos desgostos que o vão levando à morte e solicita a Calíope, a rainha das Musas, poder realizar o seu empenho de expor o seu amor pátrio:

 

Vão os anos descendo, e já do Estio

Há pouco que passar até o Outono;

A fortuna me faz o engenho frio,

Do qual já não me jacto nem me abono;

Os desgostos me vão levando ao rio

do negro esquecimento e terno sono.

Mas tu me dá que cumpra, ó grão Rainha

Das musas, c´o que quero à nação minha.

 

   Homem de sua época, Camões teve em uma mão um livro e na outra a espada. Mas os seus estudos eram alternados com uma vida boêmia e neste ambiente de boemia amou e, num soneto, conceituou o Amor como “fogo”: “Amor é um fogo que arde sem se ver;/ É ferida que dói e não se sente;/É um contentamento descontente;/ É dor que desatina sem doer.” Também, em outro soneto, considera o Amor uma “fatalidade” que submete o ser humano e modifica os seres:

 

Transforma-se o amador na cousa amada, 

por virtude do muito imaginar; 

não tenho, logo, mais que desejar, 

pois em mim tenho a parte desejada. 

  

Se nela está minha alma transformada, 

que mais deseja o corpo de alcançar? 

Em si somente pode descansar, 

pois consigo tal alma está liada. 

  

Mas esta linda e pura semidéia, 

que, como um acidente em seu sujeito, 

assim co’a alma minha se conforma, 

  

está no pensamento como idéia: 

[e] o vivo e puro amor de que sou feito, 

como a matéria simples busca a forma.  (CIDADE, 1961, p. 75-76)

 

E, ainda, o eu-lírico considera o Amor brando, doce e piedoso, mas se queixa do desprazer do amor: 

 

Erros meus, má fortuna, amor ardente

Em minha perdição se conjuram; 

[…] De amor não vi senão breves enganos.

Oh! quem tanto pudesse que fartasse

Este meu duro gênio de vinganças! (CIDADE, 1961, p. 91)

 

O tema amoroso aparece na obra poética de Camões tanto nos sonetos, nas canções e nas éclogas como na sua obra épica Os Lusíadas.  Nesta, o Amor aparece ora em forma de paixão e de desejo que visa a encontrar a mulher, como no Canto IX, quando o bardo menciona a Ilha dos Amores, lugar e prêmio para os fatigados navegadores, ora em forma de louca paixão, como no Canto III, quando Inês de Castro é coroada depois de morta.

 

No Canto IX, o Amor representa a vitória sobre o desconcerto do mundo, afinal travara “u’a famosa expedição/ contra o mundo rebelde”. Nesse Canto, na estr. 83, o eu lírico mostra vencidos e vencedores entregues ao amor:

 

Oh, que famintos beijos na floresta,
E que mimoso choro que soava!
Que afagos tão suaves! Que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
O que mais passam na manhã e na sesta,
Que Vênus com prazeres inflamava,
Melhor é experimentá-lo que julgá-lo;
Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.

Não sabe ao certo os seus biógrafos a quem o poeta tenha amado, entre as “ninfas”, porém se sabe que elas tiveram importância em sua vida, pelas cartas encontradas. Reproduzimos, poeticamente, os últimos momentos desse poeta, no poema O DELÍRIO DO CATIVO (Momentos, Vitória, 1989. p.78-79)

 

No último delírio

bailam

             silhuetas

gentis

-breves enganos do amor.

 

Leonor – formosa e dadivosa

                 cabelos de ouro trançados

Bárbara –  bela cativa

                cabelos pretos

            -a mais formosa –

Dinamene – ninfa levada

                  “asinha” pelas ondas…

 

A alma transfigurada de amor

não sente a dor,

nem a pobre matéria, o branco lençol.

No delírio, a Glória o abraça

e a imortalidade guarda

sua fortuna, amor e perdição

nos quatro cantos da Terra.

 

A epopéia camoniana, quanto à temática nacional, pode ser comparada à Eneida, de Virgilio. Com a diferença de que Virgílio evoca, na história romana, as futuras glorias de Roma, com uma fabulosa ação, enquanto a ação central do poema de Camões tem um teor histórico, na viagem de descobrimento do caminho para as Índias. António José Saraiva compara a função da viagem de Vasco da Gama com a de Enéias e de Ulisses:

 

Esta viagem tem no plano do poema a mesma função que a de Enéias no poema de Virgílio ou a de Ulisses no poema de Homero. Para integrar a historiografia nacional portuguesa (que tinha […] uma origem parcialmente épica), a história das navegações e fundação do império da Índia e a expansão no Oriente (para o que dispunha de dois bons historiadores, João de Barros e Fernão Lopes de Castanheda), e ainda a descrição geográfica do novo mundo descoberto. Camões escolheu o modelo fixado por Virgílio.  (CAMÕES, 1982, p. 25)

 

Mas a parte científica e ficcional de Os Lusíadas direta ou indiretamente foi tomada de fontes diversas. Hernani Cidade (1961, p.25) explica:

 

Os Lusíadas são [….] síntese e sublimação. que funde o saber cosmológico de Pedro Nunes, às informações de História e Geografia humana de João de Barros, às narrativas pungentes da História Trágico-Marítima… Nenhum poema épico do tempo é, como este, expressivo daquele incomparável momento de luta do Homem contra as forças da Natureza que os deuses mitificavam, e do Cristão pela hegemonia, no mundo da cultura humanizadora.

 

No poema épico camoniano a História de Portugal decorre por quase cinco séculos. E o poema relembra fatos e heróis de toda a conquista, tanto os da terra como os de além mar, os que ultrapassaram a Taprobana, (CAMÕES, Canto I, estr. 1) e expõe a historia de Portugal precedente à viagem de Gama, nos III e IV Canto. Descreve o poeta batalhas com intensidade épica e ressonâncias humanas. Citamos, no Canto IV, a estr. 26, a reação das mulheres durante a batalha: “Estavam pelos muros, temerosas/ E de um alegre medo quase frias,/ Rezando, as mãis, irmãs, damas e esposas,/ prometendo jejuns e romarias.”

  

Enfim, na obra máxima de Luis de Camões, Os Lusíadas, o eu lírico manifesta um grande amor à sua pátria: “ditosa pátria minha amada”, o valor que sua época dava à vida militar e expõe dois pólos de tensão humana: 

 

    1. a guerra – atividade nobre e viril, no conceito antigo,  Canto V, estrofes 5 a 8 e  Canto X, estr. 153:, v 5-8: “A disciplina militar prestante// Não se aprende, Senhor, na fantasia, sonhando, imaginando ou estudando, /Senão vendo, tratando e pelejando.” 

 

2. o amor, na forma de paixão nos amores de Pedro e Inês, Canto X, e de desejo, segundo os modelos do ideal trovadoresco como os dos episódios da Ilha dos Amores (Canto IX, estr. 75 a 83) a perseguição que Leonardo fez à bela ninfa Efire.

 

ENTRE A ESPADA E O AMOR

 

De Os Lusíadas destacamos uma parte epo-lírica que tem impressionado a leitores de várias épocas e tem sido ponto de inspiração para muitos escritores: o episódio da história do Príncipe Pedro e Inês de Castro, “a triste e mesquinha que depois de morta foi rainha”. Essa história se encontra no Canto III, da estr. 119 à 137, mas as mais conhecidas estrofes, pela tristeza lírica, são as de 120 a 135. O canto épico Os Lusíadas, provavelmente, segundo os estudos camonianos, foi terminado em 1556 e o episódio do eterno amor entre Pedro e Inês de Castro é mencionado até os nossos dias.

 

Há várias obras que fazem referência a esse fato, imortalizado em diversas peças de teatro, em poemas, romances e outras formas de literatura, quer em Portugal em Os Lusíadas, de Luís de Camões, em A Castro, de António Ferreira, em D. Pedro, de António Patrício, e quer no estrangeiro. Na França, de 1942, encontra-se a obra La Reine Morte de Henry de Montherlant, que reproduz esse fato. Na Espanha, a repercussão dessa mítica história é significativa, várias obras surgiram ao longo desses anos, possivelmente, ocorreu pela proximidade entre os países e pelo fato de Inês de Castro ser oriunda da Galícia e, também, pelo interesse despertado na poesia popular. Citamos algumas: em 1577, Jerónimo Bermudez escreveu a tragédia Nise lastimosa y Nise laureada, em que foi referida, pela primeira vez, a coroação de Inês de Castro depois de sua morte. Em 1612, foi publicada a tragédia Doña Inés de Castro, Reina de Portugal, de Juan Mejía, em 1644, Luis Vélez de Guevara escreveu Reinar después de morir, e Alejandro Casona, em 1955, Corona de amor y muerte.

 

Cada obra pincela o mito com um elemento diferente. Nas obras dramáticas, acrescenta-se um dado a mais à história ou incluem-se novos atuantes; mas em todas as criações aponta-se um amor estranhável entre Inês e Pedro e fala-se de falsos conselheiros que, por ciúmes, levaram Inês à morte. Mas antes de mencionar esses fatos, em duas obras teatrais, Reinar después de morir e Corona de amor y muerte, apresentaremos os antecedentes históricos que Camões coloca no Canto III. 

 

Nesse Canto o leitor depara com a formação de uma nação por meio de lutas, arranjos políticos, intrigas e amor. Inicia o canto com o poeta pedindo a Calíope, deusa da epopéia/história, contar-lhe o que Vasco da Gama narrou ao Rei de Melinde. Fala-lhe que a fonte da poesia se mudou para Portugal. Depois é Vasco da Gama que passa a narrar ao Rei a história de seu povo (“geanalosia”), atendendo o seu pedido, mas sem mentir “Porque de feitos tais, por mais que diga,/ Mais me há–de ficar inda por dizer” (estr. 5) e o tempo é curto para “dizer tudo”. E começa a sua narrativa pela geografia e depois pela “sanguinosa guerra”. Com apoio do conhecimento histórico e geográfico de autores gregos e latinos, Camões, por meio de seu personagem histórico, Vasco da Gama, descreve a geografia da Europa, apresenta sua extensão até à Península Ibérica e menciona Espanha (“[…] cabeça ali de Europa toda,” (estr. 17); chega ao estreito de Gibraltar e narra a lenda do trabalho de Hércules de separar a Europa da África “Onde o sabido Estreito se enobrece/ C´o extremo trabalho do Tebano” (estr. 18); e designa todas as regiões da Península Ibérica (Aragão, Castela, Galícia, Andaluzia), com suas características marcantes, para apresentar Portugal “ […] quase cume da cabeça/ De Europa toda, Reino Lusitano/ Onde a terra se acaba e o mar começa/ E onde Phebo repousa no Oceano.”  e onde Deus quis que brilhasse nas guerras contra os muçulmanos expulsando-os  de seu território. (estr. 19- 20).  Enfim no relato de Vasco da Gama, o eu lírico camoniano exalta Portugal: “Esta é a ditosa pátria minha amada, […] Esta foi Lusitânia derivada/De Luso ou Lysa, que de Baco antigo/ Filhos foram, parece, ou companheiros,/ E nela antão os íncolas primeiros.”(estr. 21). 

 

Depois dessa apresentação, Vasco da Gama cita os vultos históricos, formadores do reino de Portugal, começando por Viriato (estr. 22); as guerras do rei Afonso da Espanha contra os sarracenos e a vinda dos cavaleiros estrangeiros para ajudá-lo, estando entre eles Henrique, filho de um rei da Hungria que, por seu destaque nos combates contra os mouros, casou-se com Teresa, filha do rei, e herdou um condado. O navegador destaca o fato de a mulher do conde, quando este morreu, tomar o poder e  deserdar o filho desencadeando novas guerras. (estr. 27-29). Seguem narrações das lutas entre filho e mãe, em Guimarães, da heróica lealdade de Egas Moniz (estr. 35-40).  Há menções de batalhas de Afonso contra os mouros (estr. 42), indo até além Tejo, e o destaque desproporcionado da batalha de Ourique entre o príncipe Afonso contra um exército de cinco reis mouros, experientes na guerra e seguidos por “guerreiras damas”. (estr. 44). Apesar da diferença de força entre os dois competidores, os lusitanos venceram (“Mas o de Luso, arnês, couraça e malha,/ Rompe, corta, desfaz, abola e talha.” – estr. 51) e recolheram o rico troféu (estr. 53).  Continuam os relatos de outras conquistas do rei Afonso: Leira, Santarém, Mafra, Sintra, Lisboa, Alentejo, Évora, Palmela, Cezimbra, Badajoz, Alentejo. Porém, em uma revanche dos mouros, num áspero combate, o rei Henrique foi ferido e seu filho Sancho assumiu a luta. Os combates prosseguem. Sancho persistiu na luta com os sarracenos na Terra Santa. Quando morreu, seu filho, Afonso III, assumiu o poder e reconquistou Alcácer no sul de Portugal (estr. 90). Seu sucessor Sancho II, “manso e descuidado” (estr. 91) foi substituído por Afonso o Bravo, que reconquistou Algarves, e a esse substituirá D. Dinis que fez prosperar o Reino e, ao alcançar a paz, construiu e reparou vilas e fundou a Universidade de Coimbra (“Fez primeiro em Coimbra exercitar-se/ O valeroso ofício de Minerva.” – estr. 98). D. Dinis será substituído por Afonso IV (estr. 98) que não gostava dos castelhanos, mas tinha uma filha casada com o rei de Castela. 

 

Assim, quando um grande exército mouro chegou a Tarifa, o rei castelhano enviou Maria, sua mulher, para pedir ao pai, Afonso IV, o rei português, auxílio. (estr. 99-115). O poeta descreve a entrada de Maria, no paço, com pinceladas pictóricas: Entrava a fermosíssima Maria / Pólos paternais paços sublimados,/ Lindo o gesto, mas fora de alegria,/ E seus olhos em lágrimas banhados./ Os cabelos angélicos trazia/pelos ebúrneos ombros espalhados. (estr. 102). O poeta aponta no pedido de Maria a seu pai, o rei português, a necessidade de socorro para o rei Castelhano, Alfonso, e menciona a catastrófica situação se houver uma negativa: “[…] Viúva e triste e posta em vida escura,/ Sem marido, sem reino e sem ventura” […] Acude e corre pai, que se não corres,/ Pode ser que não aches quem socorres.” (CAMÕES, estr. 104; 105). A súplica de Maria enternece tanto o leitor /ouvinte, como o próprio pai. E o bardo descreve, em seguida, a sangrenta batalha realizada em Tarifa e como cada oponente solicitava o apoio divino de acordo com a sua religião. Esta parte lírica e bélica serve a Camões para dar um exemplo de um amor paterno, a força bélica dos portugueses, a união do povo ibérico para expulsar os mouros, e a união sanguínea entre castelhanos e lusos, além de dar entrada à parte mais lírica deste Canto e, talvez, de Os Lusíadas, que é um fato histórico/mítico do amor do Príncipe Pedro por Inês de Castro, cuja implicação, provocada pelo amor: “Tu só, tu, puro amor, com força crua […] deste causa à molesta morte” (CAMÕES, estr. 119), teve como conseqüência a morte da amada e sua coroação após esta: “O caso triste e dino de memória […] da mísera e mesquinha/ que despois de ser morta foi Rainha” (CAMÕES, estr. 118). 

 

Como entre os livros não há fronteiras definidas. Nunca se pode dizer ser a primeira referência de um texto, pois sempre ele deve estar dentro de uma rede de referências, com certeza. O fato de uma coroação após a morte, acontecimento que assinalou Camões e foi motivo de várias reproduções, segundo Patrizia Botta, encontra-se em dois romances do séc. XV: “Gritando va el caballero”  e “Palmero”, cem anos antes de Camões colocar em sua obra mestra.

 

 

“AMOR, AMOR SEMPRE AMOR”

 

O grande amor de Pedro e Inês de Castro e a morte desta e mais ainda a sua coroação após a morte são temas que inquietaram poetas e uma meia centena de dramaturgos de diferentes épocas.  O fato de Inês de Castro ser coroada depois de morta tornou imortal o amor de Pedro e Inês. 

 

O eu lírico/épico camoniano destaca o pescoço de Inês (“colo de alabastro”) para indicar a execrável decapitação de uma inocente mulher e a cor desta pedra será retomada pelos escritores com várias metáforas. Casona, por exemplo, cita várias vezes “cuello de garça”, e no momento da decapitação Inês mencionará essa denominação: “No me hagáis daño. Me llaman “cuello de garça”… ¡Y con un cuello así debe ser tan fácil!…” (CASONA, 2003, p. 130). Com essas mudanças metafóricas para representar beleza e fragilidade se comprova que na literatura há objetos e nuances ideais, sejam eles de caráter visual ou auditivo, os quais o escritor utiliza segundo suas necessidades poéticas.

 

A bela e amorosa Inês vivia em Coimbra, num palácio, às margens do Mondego, onde tudo “Eram memórias de alegria.” (CAMÕES, estr. 121). O príncipe amado rejeitava casar-se com as mais belas senhoras e princesas que o pai indicava. (CAMÕES, estr. 122). Este, instigado pelas murmurações malignas dos ministros, pensou cortar a relação amorosa matando Inês acreditando que assim poderia “Matar do firme amor o fogo acesso” (CAMÕES, estr. 123). Os algozes da decapitação de Inês serão castigados pelo Príncipe quando se torna rei e coroa Inês como rainha de Portugal. 

 

Tais contra Inês os brutos matadouros,

No colo de alabastro, que sustinha

As obras com que Amor matou de amores

Aquele que despois a fez Rainha. (CAMÕES, estr. 132)

 

O poeta lamenta tal furor com uma frágil mulher um rei que havia usado tão ferozmente uma espada contra os mouros, deixando os seus filhos órfãos, na súplica que Inês faz de clemência para com ela para que pudesse criar os filhos:

 

“Ó tu que tens de humano o gesto e o peito

(Se de humano é matar ua donzela,

Fraca e sem força, só por ter sujeito

O coração a quem soube vencê-la).

A estas criancinhas tem respeito,

Pois o não tens à morte escura dela;

Mova-te a piedade sua e minha

pois te não move a culpa que não tinha. (CAMÕES, estr. 127)”

 

 

O dramaturgo é um usurpador de textos, mesmos os que sejam considerados grandes como Shakespeare, Lope de Vega, Gil Vicente, Federico García Lorca, citando alguns. Assim não nos admira que, para a estrutura de Corona de amor y muerte, Alejandro Casona tenha-se apoiado em obras e fatos históricos.  

 

Contudo, na redramatização do mito do Amor intenso do Príncipe Pedro que, levado à loucura, exaltou a amada Inês de Castro, coroando-a depois de morta, parece que Casona se apoia, além de Os Lusíadas, na obra de Luiz Vélez de Guevara, Reinar después de morir (1641?), na de Henry de Montherlant, La Reine Morte (1942) e em crônicas portuguesas2.

 

Na obra de um escritor, por mais genial que seja na arte de inventar, ele coloca aspectos de sua própria experiência de vida e um legado que herdou que lhe foi transmitido pela geração a que a sua dá continuidade. Difícil é medir as fronteiras de um livro, pois sempre estará preso a referências a outros livros e frases. Sá Carneiro escreveu essa situação do escritor de ser ele e o outro que os versos a seguir comprovam:

 

Eu não sou eu nem ou o outro

sou qualquer coisa de intermédio

pilar da ponte de tédio

que vai de mim para o Outro.

 

Esse ser de que Sá Carneiro se refere que é a união de um ser com o outro, Borges (1983, p. 120) explica com a narrativa das inquietações de Tzinacán, o mago da pirâmide que, ao observar as várias manchas de um tigre, reflete sobre a escritura. Assim, dizer o tigre é dizer todo um conjunto de situações. É falar de todos os que o geraram, todos os animais com os quais se alimentou e com os quais estes também se alimentaram. No universo não há um só homem, concluiu, pois este homem é a soma de outros e de sua nação e a de outros. Mikhail Bakhtin define como dialogismo o processo de interação entre textos que ocorre na polifonia; tanto na escrita como na leitura. Ele define o texto não como algo isolado, mas correlacionado com outros discursos. Julia Kristeva considera intertextual a criação de um texto a partir de outro já existente.  

 

O teatro é uma arte adaptável ao tempo histórico e o Amor um bem tradicional nas artes e na vida cotidiana, que funciona literariamente como elemento gerador de situações conflitantes, apoiadas na realidade. Logo é apropriado o tema mítico de um amor mais poderoso que a morte para uma representação teatral. 

 

O mito não tem uma sequência contínua. É um produto da linguagem. Ele sofre as mudanças do narrador, mas as versões repetidas do mito só mudam superficialmente, porque o básico é constante. O mito serve para garantir a permanência do futuro ao presente e ao passado e exemplo desse caminhar mítico são as reproduções da paixão entre o Príncipe Pedro e Inês de Castro que, após sua injusta morte, como resultado desse grande amor, foi coroada, para reconhecimento de que essa união estava sacramentada pelo casamento, para a reparação de sua honra e para vingança dos algozes que implicaram nessa morte.  

 

O tema de um amor além da morte e a história da coroação de Inês já morta inquietaram a romancistas, a poetas e a mais de meia centena de dramaturgos e, como “quem conta um conto aumenta um ponto”, versões diferentes surgiram: como a de Lope de Vega; a de Luiz Vélez de Guevara, que acrescentaram à história de Inês e Pedro, aqui e ali um detalhe, um personagem a mais ou um nome, mas conservaram a essência do mito: o amor impossível e a curiosa vingança de coroar um cadáver. 

 

O dramaturgo Luiz Vélez Guevara (1579-1644), por exemplo, em sua obra, em versos, Reinar después de morir, em que atuam 16 personagens nos 2472 versos, a ação caminha rapidamente para o seu fim. Inicia destacando o impetuoso amor de Pedro, rendido pelo amor: “[…] pues a mi Inés me humillé,/ pues me rendí a su hermosura/ a voces confesaré,/diciendo con toda el alma/ a los que amantes me ve”, e mostrando a recíproca desse amor em Inês, que segundo Brito (GUEVARA. v. 105-108) está em Coimbra, longe do amado “A perder/ el sentido cada instante/ que entre tus brazos no esté”, amorosa, cuidando dos filhos. Inês é destacada como amante apaixonada e mãe amorosa, numa preparação para o desfecho final.

 

O rei casou o Príncipe com a infanta Blanca, mas o príncipe não a quer e declara-lhe que ama a outra. Explica-lhe que após o seu casamento, o primeiro, com a infanta de Castela por obediência a seu pai, depois do enlace, ele se apaixonou perdidamente por uma dama da corte da infanta “doña Inés de Castro Cuello/ de Garza, que con su padre / pasó a servir a la reina,/ mejor dijera a matarme” (GUEVARA, v. 459- 461). Mas não traiu a sua esposa, pois só depois que ela morreu se casou com a mulher que vivia em uma quinta, às margens do Mondego. (Idem, v. 565). O dramaturgo vai reforçando as declarações de amor entre o Príncipe e Inês, acelera as ações para destacar no terceiro ato a prisão de Inês, separação dos filhos, morte de Inês por imposição da corte e morte do rei. Coroado o príncipe, pensa fazer de Inês rainha, com uma grande festa: “En público saldré con ella al lado;/ un vestido bordado/ de estrellas la he de hacer, siendo adivina,/ porque conozcan, siendo Inés divina,” (GUEVARA, v. 241-246). Contudo, ao saber pela Infanta que Inês fora decapitada pelos conselheiros “Álvar González y el traidor Coello”, o príncipe desmaia, desespera-se, manda que seja enterrada em Alcobaça  com honrarias  e  coroa Inês como rainha de Portugal: “en la muerte se corone./ Todos los que estáis aquí/  besad al difunta mano/ de mi muerto serafín;” (GUEVARA, v. 2245-2250).

 

Túmulo de Inês de Castro.

 

Corona de amor y muerte. La leyenda de Inês de Castro, de Alejandro Casona, é, também, uma vertente dessa parte lírica de Os Lusíadas.

 

 Casona escreveu 25 obras dramáticas e esse dramaturgo espanhol, Alejandro Rodriguez Álvaro, “Alejandro Casona”, (1903-1965), apresentou em três atos, Corona de amor y muerte, em 1965, em Buenos Aires. A peça tem uns 50 personagens e relembra o mítico acontecimento ocorrido a Inês de Castro: sua coroação após a morte como resultado de uma grande paixão.

 

 Segundo as crônicas, Inês era filha natural de Pedro Fernandez de Castro e Aldonza Soares de Valladares; com certo parentesco com a família real castelhana. Quando morreu a sua mãe, foi levada para Valladolid, no castelo de Penafiel, onde cresceu em companhia de Constanza Manuel, a filha do infante don Juan Manuel. Em 1341, Constanza se casou com Pedro I de Portugal, chamado O Justiceiro, que foi amante de Inês de Castro. Sente-se no texto de Casona que há intertextualidades diversas, inclusive com a obra de Luiz Vélez de Guevara, Reinar después de morir, que lhe enriquecerão a obra, dando a ela mais ritmo, mais lirismo, mais tragicidade, provocando mais emoções.

 

Corona de amor y muerte começa com a preparação para o casamento da Infanta Constanza Manuel de Castela, filha de Juan Manuel e neta de Alfonso el Sábio, com o Príncipe Pedro de Portugal, arranjo político para conservar a paz entre esses países. Toda a corte veio de Lisboa para Coimbra, povo e nobreza, menos o príncipe, o noivo. Ela se sente ofendida por essa ausência. Também se inquietou por ter ouvido, ao entrar em Portugal, uma canção de amor que se referia a uma história de um jovem que ia ver a sua amada à noite e colocava as ferraduras ao contrário para despistar dos espias. O rei e os conselheiros tentam justificar a ausência do príncipe e comentam o procedimento dele.  

 

Pedro se encontra no Paço de Santa Clara, às margens do Mondego, único rio que nasce em Portugal, numa aprazível e amorosa vida com Inês e os filhos.

 

A orgulhosa infanta, num dia de caça, com um ardil, se aproximou do Paço de Santa Clara para falar com Inês. Estabelece um diálogo entre elas com o tema do amor entre Pedro e Inês. Esta se refere a este amor como uma união de alma e corpo: “Cuando Pedro me estrecha, toda mi alma va tomando poço a poço la forma de su cuerpo […]” (CASONA, 2003, p. 80) Mas o diálogo entre elas é interrompido pela chegada do rei Alfonso, que vai ter a oportunidade de conhecer o seu neto, Juan. Há um longo diálogo terno entre eles e o rei se enternece. Chega Pedro e na fala entre o Rei e o Príncipe, o Soberano fica sabendo que Pedro e Inês não são amantes, que há sete anos se casaram em Bragança e que nem seus filhos são bastardos. 

 

No terceiro e último ato vai desencadear a tragédia. Os conselheiros insinuam que o amor do príncipe é perigoso para o país. Segundo o Rei, se eles não se fizerem fortes, um dia “Castilla muerta de sed se volcará” sobre Portugal como seus rios “desesperados” buscam o mar português. (CASONA, 2003, p. 110). Contudo, Pedro tem uma diferente visão sobre os interesses patrióticos. O Rei pensa Portugal como um todo virado para o mar com grandes barcos; os conselheiros, com interesses próprios, pensam em seus castelos e nas rendas de suas terras; ele pensa em mulheres com amor e seus filhos e nos pobres camponeses que trabalham cantando para esquecer a fome. (CASONA, 2003, p. 111) 

 

Durante a reunião dos conselheiros para decidirem o que chamam “loucura”, o amor do Príncipe pela Inês, e chegam à conclusão que era preciso matá-la, sente-se no diálogo entre eles e o rei que este não quer esta solução e faz uma tentativa para evitar matar Inês lembrando o efeito futuro: “[…] matemos esta noche a Inés, y mañana yo no seré más que el Rey del crimen y vosotros el coro de traidores” e mais que “el pueblo y los poetas” vão propagar esse crimen porque “lo dicen siempre que hay por medio una mujer” y Pacheco, um dos conselheiros dirá: “¿Y qué puede importarte? Tu trabajo es hacer la historia; que ellos la cuenten mañana como quieran.”  (CASONA, 2003, p. 116). Desde a ocasião em que o rei foi ao Paço de Santa Clara e conversou com Inês e o menino, e depois com o seu filho, Pedro, Don Alfonso está indeciso, entre o carinho para com Inês e o seu neto, despertado durante a entrevista, e a razão de estado que lhe mostram os seus conselheiros, e procura despertar nos conselheiros piedade para com Inês. É uma forma de o autor amenizar no leitor/ouvinte a culpa do rei nesse crime. 

 

Propõem o autor nas didascálias variados cenários: o predominante é a sala do Alcázar de Coimbra com tapetes góticos, janela dando para o Mondego, mapas, esferas, barcos. Segue o Paço de Santa Clara, às margens do Mondego. No terceiro ato, o autor determina o quarto de Inês à noite e no último quadro, o terceiro, um bosque no caminho de Coimbra. Neste cenário, vento e neve são agouros, prenúncios da desgraça de Pedro. Sente os presságios da morte de Inês e tem uma visão dela perguntando-lhe aonde ia, pois que a sua amada já estava morta. O apaixonado Dom Pedro, que idolatra a esposa, no silêncio e na solidão presente a desgraça ou ouve a amada: “Dónde va el Caballero?/ Donde vas, triste de ti”. O romance de Inês é uma intertextualidade da III Cena da obra de Guevara Reinar después de morir, que possivelmente é uma variação de romance.

 

¿Dónde vas, el Caballero,

onde vas, triste de ti?

que la tu querida esposa

Muerta es, que yo la vi

las señas que ella tenía

bien te las sabré decir

su garganta es de alabasto

y sus manos de marfil.

 

Mas Casona vai além de Camões, aproveitando a obra de Luis Vélez Guevara e apoiando-se em crônicas e em sua criatividade desperta mais o sentimento do ouvinte/leitor no diálogo entre Pedro e o Mestre. Quando o príncipe explicará os efeitos da premonição em seu comportamento: 

 

Pedro – No basta la fiebre. ¿Yeste cordel que me aprieta la garganta?… ¿Y estas rodillas que me niegan?…? Y este fío en el tuétano?…!Que no lo sepa nadie, pero mírame! Yo no he tenido miedo nunca…! ¡Tengo miedo en las manos! ¡Tengo miedo en la entraña! ¡Tengo miedo en los huesos!…

 

E, já terminando o terceiro ato, depois que o príncipe Pedro fica sabendo, por Fragoso, a triste notícia da morte da esposa amada, efetuada de uma forma bárbara, com “três punhais e uma tropa de escolta”, e, ainda, toma ciência de quem participou no cruel assassinato e que entre os assassinos estava o seu próprio pai, o rei, ele incita sua tropa para ir contra todos e os soldados gritaram: ¡Portugal contra o Rey!… Segue a didascália que mostra a coroação com música, gritos figuras e a jovem morta vestida de noiva e Pedro de pé, um pajem de joelhos com uma coroa numa almofada.

 

Oscuro sobre el último grito al que contesta el pueblo. sin pausa, en la oscuridad, se oyen los clarines y tambores de la rebelión, galopadas a caballo y, finalmente, la triste melodía del rabel crescendo solemne, hasta disolverse en música sacra de órgano. Vuelve la luz lentamente en el salón del trono, ornado con banderas y escudos en doble perspectiva heráldica, sobre un fondo de vitral gótico. Inmóviles y armoniosos como figuras de tapiz. damas, caballeros. reyes de arma. Soldados, iglesia y Pueblo. En el trono, Inés, tal como apareció en el bosque-sin chal rojo- cubierta de velos blancos. Ni un crepón ni una sola nota lúgubre. Es una muerta bella y joven, vestida de novia. Pedro, con un sencillo manto sobre los hombros. Un paje, de rodillas, sostiene la corona en un cojín de púrpura. La música va esfumándose, sin llegar a perderse.  (CASONA, 2013, p. 140):

 

Procuramos com este ensaio redespertar o interesse pela obra Os Lusíadas e para isso nos detivemos no Canto 3, mencionando o amor extremado de Pedro a Inês de Castro que, numa louca paixão e uma exótica vingança de, antes de matar injustos algozes, coroar a vítima já morta e fazê-los prestar homenagem ela. Também buscamos mostrar que um possível fato histórico torna-se um mito e que desperta sonhos, criações artísticas com várias interpretações, pois a imaginação humana pode acrescentar dados, fixados num tempo histórico, e que a dramaturgia, a serviço da literatura, procura (re)apresentar a realidade,  visando despertar paixões no ser humano, e tecer ações  com imagens vivas  estimulando o leitor ou o ouvinte.

 

Notas

 

1 A deusa Tetis era a mais importante das ninfas.

 

2 “Según las tesis más acreditadas por la gran mayoría de los críticos, el personaje de Inés habría tenido su entrada oficial en la literatura tan sólo en 1516, y en lengua portuguesa, gracias a las Trovas que García de Resende publicó en su Cancioneiro en ese mismo año. Después, habría tenido un desarrollo sucesivo, máxime en lengua portuguesa, a través de la literatura tanto lírica como teatral (con Camões y Ferreira en la segunda mitad del XVI). Y, ya en época barroca, habría por fin pasado a una etapa exclusivamente española, también lírica y teatral (con los poemas de Lope, Soares de Alarcão, Francisco Manuel de Mello, y los dramas de Mejía de La Cerda y Vélez de Guevara, todos de las primeras décadas del XVII).” (BOTTA, Patrizia. El romance de Palmero e Inês de Castro. Disponível em http://www.cervantesvirtual.com/obra-visor/el-romance-del-palmero-e-ins-de-castro-0/html/015af066-82b2-11df-acc7-002185ce6064_7.html. Acesso em 07.jul. 2016.

 

REFERÊNCIAS

 

BORGES, Jorge Luis.  El Aleph.  Madrid: Alianza Editorial, 1983.

CAMÕES, Luis de. Os Lusíadas. Org. Antônio José Saraiva. Porto: Figueirinhas, 1982. 2v.

CASONA, Alejandro. Corona de amor y muerte, La leyenda de Inés de Castro. Madrid: Ibergráficas, 2003.

CIDADE, Hernani.  Luis de Camões. Lisboa: Editora Arcádia, 1961.

OLIVEIRA, Ester Abreu Vieira de. Momentos. Vitória: El Autor, 1989.

VÉLEZ DE GUEVARA, Luis. Reinar después morir. Disponível em: http://www.comedias.org/velez/Reidm123.pdf. Acesso em 07 jul. 2016.

 

Fotografia de Ester Abreu Vieira de Oliveira.

Ester Abreu Vieira de Oliveira, professora Emérita da Ufes, atua nas áreas literárias de teatro, poesia e narrativa das Literaturas brasileira e hispânica, com publicações de tradução, poesia, ensaio, crônicas e livros infantis e didáticos.

 Nasceu em Muqui (1933). É Doutora em Letras Neolatinas (UFRJ), sua tese doutoral foi “O Mito de Don Juan: suas relações com Eros e Tanatos”. Pós-doutora em Filologia Espanhola – (UNED – Madri), apresentando a pesquisa “Para uma lectura del teatro actual: Estudio de Panic de Alfonso Vallejo”. Mestre em Letras-Português (PUC-Paraná), com a dissertação “Alguns aspectos do possessivo em português em confronto com o espanhol”. 

Pertence ao Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo; à Academia Espírito-santense de Letras, Cadeira 27, atual Presidente; à Academia Feminina Espírito-santense de Letras. Cadeira 31, atual Tesoureira; e a outros segmentos culturais e literários do Brasil e do exterior. Tem atuado como membro de corpo editorial de revistas e de editoras, no Brasil e no exterior, e de organização de livros e de antologias, como também, em Setores Culturais, participando em comissões culturais do Estado e do Município de Vitória.


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