Até onde a bondade, por incrível que pareça, pode ser benéfica ou trazer alegrias?
Evidente que sempre é salutar, porém o homem bondoso algumas vezes não é levado a sério e em outras, pior ainda, é tratado com chacotas.
Por não ver maldades abusam do bom indivíduo. Quase uma inversão de valores onde o bonachão, o benfeitor, o humano(o demasiado?) chega a ser considerado um idiota.
Sim, um idiota.
Dostoiévski, sempre ele, desnuda um ser tão puro com uma alma sem maldades, mas que no fim sempre leva a pior.
Renuncia a várias prioridades pessoais para ajudar o próximo enquanto outros revelam as perversidades humanas.
A bondade do idiota só lhe causou sofrimentos.
Vejam só…
Talvez essa seja a proposta do gênio russo, questionar a bondade.
Dostoiévski deixa dúvidas no ar onde nossas crenças se revoltam.
Basta ver o final de seu livro “O Idiota” onde seu personagem baila na curva.
A bondade do príncipe Mishkin se retorce quando ele percebe que o mal está nas primeiras filas.
O príncipe acreditou nos homens e fez empréstimos quase sem dinheiro.
Acreditava no ser humano e foi, literalmente, até o fim com sua bondade ingênua.
Viu a filosofia estoica ser menosprezada e seus valores caindo em abismos.
Pobre Mishkin.
Enquanto isso, discordâncias e guerras explodiam ao seu redor. Um querendo o sangue do outro.
Nada de novo no front…
Como no clássico “Inferno no Pacífico”(1968) com Lee Marvin e Toshiro Mifune, sozinhos numa ilha, um americano e um japonês, um caçando o outro e roubando água do inimigo numa ilha perdida do Pacífico.
Agora… São dois idiotas.
Não sabem nem o que defendem e após se unirem morrem tragicamente.
Distantes da bondade, mas próximos do horror…Os dois idiotas…
O Idiota de Dostoiévski pelo menos segue a cartilha do bem, mesmo sendo golpeado pelos mais próximos, assim como o filósofo Sêneca que foi “hostilizado por Calígula, punido por Claudio e condenado por Nero”. Que absurdo, a bondade de Sêneca o levou ao suicídio.
É, amigos, ser bondoso não traz garantia nenhuma.
Mishkin vive assim, ajuda todos e é massacrado. E mesmo após ficar rico ao receber uma herança, sua paixão o menospreza por que “ele é bom demais”.
Que dilema.
Que contradição.
Que inverossímil.
Que cruel.
A bondade do idiota pôs tudo a perder…
O jornalista Coca Trevisan nasceu em Santa Maria, RS. Atuou como repórter e redator nos jornais NH, de Novo Hamburgo; VS, de São Leopoldo e Jornal Alto da XV, de Curitiba. Como profissional freelancer assinou matérias em diversos periódicos. Participou de workshops e atuou em debates sobre a Indústria Cultural dos anos 1980/90. Mais recentemente, concluiu pela PUC-RJ o Curso de Extensão Origens do Existencialismo. Mantém e abastece o blog Violências Culturais. Atualmente mora em Florianópolis, SC.