Política

Oligopólio – nova forma de poder ocidental | Artur Alonso

Foto de Jandira Sonnendeck na Unsplash

“Porque a dor e a morte não são terríveis, senão o medo a dor e a morte” —  (Epíteto “Discursos”, Livro II, capítulo I)

 

A ideia evolutiva do Capitalismo humanista – na procura daquela tónica sonhada, onde a humanidade pudesse experimentar um desenvolvimento de livre comércio, regulado pela “mão invisível do mercado” de Adam Smith, nos finais do século passado ficou totalmente ruída  – desconstruída –  demolida, pela real natureza das forças que tomaram conta do seu desenvolvimento.

 

Aquele sonho duma tónica de comunidades pequenas, com pequenos proprietários trabalhando em conjunto, dentro de uma certa ajuda mútua – e auto-regulando-se as suas interações comerciais por meio de um mercado livre de intervenção estatal (que faria mais livres os seres humanos) – ficou morta, após os monopólios entrarem em cena.

 

Na realidade, já tinha nascido morta, pois esse capitalismo final, ficou impulsionado pela mão oculta de certa nobreza lombardo veneziana (que já tinha provocado a crise de dívidas soberanas nos reinos medievais, do século XIV). Aliada mais adiante ao poder mercantil privado neerlandês e britânico que cresceriam da mão das companhias monopolistas das Índias Orientais….

  

 

E mais morta todavia resultou quando esse poder corporativo, que descobriu que, pelas suas capacidades de inversão e des-inversão, poderia manipular os mercados, tomou conta das praças bursáteis do mundo. E ainda ficou mais morto aquele sonho do “capitalismo humanista” quando estes mesmos monopólios avançaram um degrau acima no seu desenvolvimento, tornando-se nos atuais oligopólios.

 

Oligopólio – grupo determinado, bem organizado, que promove o domínio de determinada oferta de produtos e serviços.

 

Aqui na prática, aquela economia concorrencial, a busca pelo interesse individual e que, no entanto, podia resultar numa melhoria do bem comum (como idealizou Adam Smith), caiu pelo buraco obscuro da história para sempre.

 

Vanguard, Blackrock, Berkshire Hathaway e a State Street Corporation (que formam o Oligopólio das 4 maiores empresas de investimento do mundo) passaram, nos nossos dias, a controlar praticamente toda a Indústria alimentar, todos os meios de comunicação (incluindo as plataformas das redes sociais), todo o  complexo militar industrial dos países ocidentais; assim como todas as grandes empresas ocidentais de alta tecnologia, toda a indústria do cinema ocidental, as maiores industrias extrativas e de fornecimento de matérias-primas, as maiores indústrias químicas e petroquímicas…

 

Controlando, por sua vez, as poluentes indústrias dos hidrocarbonetos e, ao mesmo tempo, as supostamente verdes indústrias “sustentáveis” – junto com a indústria aeronáutica e automobilística do Ocidente… Assim como a maior parte do sector imobiliário…

 

Esta rede de “poder privado corporativo” está, por sua vez, intimamente ligada ao Poder Financeiro Privado que, através das dívidas privadas, públicas e soberanas, tem o controlo global dos fluxos de capital – por meio de Bancos centrais Privados – e dos bancos comerciais – conectados ao Banco de Pagamentos Internacionais (Bank for International Settlements -BIS-), com sede em Basileia.

 

Organograma, por sua vez veiculado, ligado, ao poder do dólar como moeda de reserva e intercâmbio planetário – e ao sistema de pagamentos internacionais – SWIFT.

 

Por meio deste poder e da sua capacidade – quase ilimitada – de compra de vontades e de controlo (por meio de investimentos) de instituições internacionais chave – Universidades, Think-Tanks ou Laboratórios de ideias, Institutos de investigação e Gabinetes estratégicos – desenham as políticas globais – que, através de Organizações supranacionais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional ou as redes Académicas de prestígio internacional, a este poder adstritas pelas subvenções monetárias que garantem os seus orçamentos.

 

O monstro é uma espécie de “Polvo Gigante” muito ramificado – nos seus tentáculos – mas controlado desde uma Mente – Inteligência Corporativa; um Sistema Emocional – que comanda a sístole e diástole – do Grande coração dos mercados bursáteis – e um Corpo de Ação, realização, interação  – ligado ao poder militar estruturado em torno da maior organização de defesa: a mais grande e ativa do planeta – a NATO ou OTAN. Organização militar  cuja missão é a defesa dos interesses corporativos daquele poder privado financeiro.

 

Na prática – governos, sociedades e indivíduos estão ligados a este poder por meio do atrelo às dívidas ou à prática da “usura” – Dinheiro criado do nada, por Bancos centrais privados, que endossam os Estados àquele fardo monetário em forma de dívida soberana, restringido, a efeitos reais, qualquer soberania.

 

Assim caminha este poder, pelas dinâmicas próprias monopolistas até um novo modelo, onde as democracias viram palco de show mediático – e onde a margem de manobra dos governantes e governados é estreita – referendando-se em aspetos menores de políticas nacionais, regionais e locais, de gestão delegada.

 

Na realidade, o modelo corresponde a um “fascismo corporativo”, onde sociedades civis “entorpecidas” por uma mídia global de ócio pernicioso – cria a fantasia de liberdade de escolha individual, dentro do mercado de consumo, que oferece diversas opções – em todos os âmbitos controladas pelo poder corporativo, desde a alimentação, o desporto, até à cultura…

 

Oferecida uma variedade incrível de diversas “marcas” de empresas, que, em aparência variam de formato, tamanho…  Ofertas que amplificam as nossas escolhas, mas que, na prática, respondem ao mesmo patrão – matriz de domínio.

 

Nesse domínio, entram o controlo do pensamento, da opinião e da dissidência –  Efetuados através dos fluxos de capital destinados aqueles conglomerados que controlam, na base, a cultura, a ciência, a tecnologia, o ócio e o divertimento…  

 

No momento em que este sistema chega ao seu máximo de expansão (na nossa época foi na crise sistémica de 2007-2008)  e o ciclo decadente começa a surgir – certa entropia se apodera da rede – expansiva – contraindo a mesma…

 

Surge então aquela famosa tríade política na qual democracia (por falta de inovação) começa a deixar passo a um poder demagogo (falta de bons estadistas e um bom aparato e organograma estatal, destruído pelo poder oligopólico) – O demagogo ignorante pode ser melhor utilizado pelo poder supra-estatal na sombra, evitando confrontos não necessários.

 

Mas aquele abuso da demagogia potencia a banalização do todo e, somado à procura do ter material em detrimento do ser (como estudara Erich Fromm no seu famoso “Ter ou Ser) ocasionada pelo consumismo excessivo, traz consigo a inversão daquele caminho desenhado por Jâmblico, no qual: “A virtude é o caminho para a harmonia interior e a felicidade duradoura”.

 

Empurrando as sociedades para a desvirtude – infelicidade, geradora de desarmonia, desconforto, alteração. Adharma – caminho da anti-evolução – ao contrário do Dharma – caminho da boa praxis, boa lei e evolução – como falariam os budistas ou os hinduístas…   

 

Sendo que, deste modo, esse poder “demagogo” definha numa desorganização estatal que conduz à desorganização social, desordem e maior ou menor caos. Muitas vezes, seguindo aquela boa reflexão de Ortega y Gasset na “Rebelião das Massas” quando escrevia: “Nas agitações provocadas pela escassez, as massas populares costumam procurar pão, e o meio que empregam costuma ser o de destruir padarias”.

 

Essa desordem chama por aquele guerreiro rigoroso de Marte – “tirano” – “caudilho” ou, no melhor dos casos, o aspeto do Marte mais Luminoso do  “Protetor”. Neste caso, o “Protetor dos Povos”  (etimologia de Alexandre).

 

O rigor marcial na procura de uma certa ordem, exercendo um forçado equilíbrio – ao que sempre tende a natureza, por homeostase. Assim, o excesso de flexibilidade, que traz falta de rigor, chama pelo excesso de rigor, falta de flexibilidade, a sua contraparte.

 

Eis pois que, neste momento, o Poder Financeiro dos Oligopólios, virando em neo-fascismo corporativo por causa da necessidade da rigidez sistémica, confronta (ao surgir um novo poder estatal que ocupa os vazios deixados por este, na sua contração, causada pela crise sistémica) um novo Poder Estatal, sua antítese.

 

Este novo poder estatal está a virar neo-socialista por necessidade (unir o povo com o estado, para confrontar a Corporação utilizando, para isso, agenda social e insuflas patrióticas). Estes poderes virados ao lado rigoroso e autocrático dirigem, em um determinado rumo toda a sociedade, evitando fissuras – dissidências – em tempos de confronto.

  

 

Nos nossos dias, ao embater este poder Estatal Euro-Asiático (também já colocado em alguns espaços da África) com o poder  Privado Corporativo, os limites para um bom encontro – diálogo (dentro de ambos espaços) – se tornam cada vez mais estreitos – tendendo ambas, díspares realidades à centralização e à hierarquização do poder, à vez que o confronto se intensifica e avança.

 

Podendo mesmo ocasionar, se as franjas de fricção aumentarem, a hipótese (menos favorável às camadas empobrecidas da sociedade) de entrar num confronto global… Ou mesmo, se as contradições no seio de cada comunidade, muito polarizadas por causa da decadência cíclica, se aprofundarsm, eclodir em guerras civis ou confrontos internos…

 

Mas isso já seria tema de outras conversas… E, mesmo assim, se as sociedades da sua letargia acordarem, o acordo pacifico pode ser obtido por pressão da massa mais consciente. Ativar essa consciência do dever no diálogo aberto é missão dos sectores mais despertos das nossas sociedades.

 

Lembrando aquela frase do filósofo grego Heráclito, que diz: “A alma se tinge com a cor dos teus pensamentos”  – Que os nossos sejam amorosos, justos e harmoniosos para com os nossos irmãos, respeitando, dentro da unidade, toda a saudável diferença – Pois é no contraste dos contrários que as sociedades avançam.

Fotografia de Artur Alonso

Artur Alonso: escritor com vários livros editados de teatro, poesia, ensaio e romance… Ex diretor do Instituto Galego de Estudos Internacionais e da Paz. Ex secretario do Instituto Galego de Estudos Celtas. Membro do Conselho Consultivo do Movimento Internacional Lusófono. Membro de Honra da Associação de Escritores. Moçambicanos na diáspora. Membro do Conselho de Redação da Revista Identidades, etc.

 

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