Cultura

Urgência | Tere Tavares

URGÊNCIA

 

A minha vida não é apenas essas teclas: pensas antes de te debruçares em lágrimas. Nem os abraços estendidos fazem parte do teu mundo. Ergue as pálpebras; ninguém ocupa o teu vazio. Prolonga as mãos. Não há escapes possíveis se não te desgarras dos entulhos. 

 

                Dá o tom sem esperar repliques. Sopra a ferida uma vez mais. Percebe: não há cascas na transmutação da Terra que clama por umidade. Rega os teus pés, senão com água, com sais. Há grânulos espalhados em toda parte e algumas estrelas aclaradas para que, talvez, evites a queda ou tropeces. 

 

                 Esmaga ervas aromáticas para o regresso: nunca se prevê o quanto há para caminhar. O instante em que poderás saber o quanto não sabes e o que terás de perder de forma muito rápida. Tu nunca serás o nascedouro desses acordes: exulta a escuta. Não há posse alguma. Tudo o que tens cabe num maço de folhas. Solta a voz, omissa de timbres. Exercita e ouve: há rumores nas ruas e o céu está longe de ser-te um manto isento. 

 

                  Deita no chão e perde o medo de gritar para ti mesmo: só a tua obsessão agrupa os tons. No ato de olhares para trás, não achas nada além do outro e o mesmo. Tudo é tocaia. Desde a Natureza e seus gemidos secretos. A flor mantém a beleza apenas enquanto está no caule. E, quando, e, se algum dia chegares dirás, sabendo que o espírito não envelhece, mas apruma-se: sou flores e ventos. Pólen e néctar. Sou elemento e consciência. Destempero de tempo. Quanto me aspira essa espiral geografia de pensamento? Quanto há de mim no que não sou? Do ar que deixo de respirar. Do ver e do rever.

 

 

Publicado também na antologia OFF FLIP 2021

 

Fotografia de Tere Tavares

Tere Tavares, escritora e artista visual, residente em Cascavel, PR, autora dos livros Flor Essência (2004), Meus Outros (2007), Entre as Águas (2011), A linguagem dos Pássaros (Ed Patuá 2014), Vozes & Recortes (Ed Penalux 2015), A licitude dos olhos (Ed Penalux 2016), Na ternura das horas (Ed. Assoeste 2017) Campos errantes (Ed. Penalux 2018), Folhas dos dias (Selo Ser MulherArte Editorial, 2020), Destinos desdobrados (Ed. Penalux, 2021) e Diário dos inícios ( Meatanoia Editora, Selo Mundo Contemporâneo Edições, 2021) . Conta com publicações em antologias, jornais e sites literários nacionais e internacionais. Integra a Academia Cascavelense de Letras.





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