Política

Editorial: tráfico de droga, um flagelo do nosso tempo | Henrique Dória

As drogas sempre foram um flagelo de todos os tempos, sendo utilizadas como instrumento de destruição, como de dominação e de ganância. O caso mais flagrante foi o da guerra do ópio que opôs, no século XIX, a China à Inglaterra em duas guerras do ópio, motivadas pela ganância de ricos comerciantes ingleses que forçaram a China a tornar livre a importação e o consumo do ópio que destruía a população chinesa, incluindo as classes mais elevadas. No século XX, os generais nazis drogavam os seus soldados para combaterem sem descanso, e a utilização de crianças drogadas foi uma realidade cruel nalgumas guerras em África, particularmente pelos traficantes de diamantes na Serra Leoa.

 

Nos dias de hoje, a produção e o tráfico de droga são uma forma de os setores mais repugnantes das nossas sociedades satisfazerem a sua ganância e obterem riquezas colossais à custa da destruição física, mental e moral de milhões de seres humanos, sobretudo dos mais jovens. Só no Rio de Janeiro, estima-se que são vendidos cerca de 500 milhões de dólares de droga por ano, sendo o lucro do tráfico, de cerca de 50% desse valor, arrecadado por um reduzido número de grandes barões da droga.

 

Poderia crer-se que, com a pandemia do covid-19, o tráfico de droga diminuísse. Mas sucedeu exatamente o contrário:  os jovens, sujeitos a maior isolamento e ao medo e ao sofrimento da doença e da morte, passaram a refugiar-se mais na droga que lhes permitia encontrarem o consolo que o mundo não lhes proporcionava, mesmo sabendo que esse consolo os transformava em zombies, em seres cujo objetivo na vida era apenas encontrarem a droga mesmo roubando ou matando, consumirem a droga que os levaria a comportarem-se como animais caminhando em direção ao barranco da morte.

 

Por seu lado, os traficantes passaram a socorrer-se de meios que antes não utilizavam. Mensagens encriptadas, redes sociais e os próprios correios, além da distribuição porta a porta, revelaram-se meios eficazes não só de manter como aumentar o tráfico.

 

O consumo de droga e a destruição física, mental e moral que isso acarreta são, sobretudo, um flagelo para os países que, como Portugal, têm taxas de natalidade e fertilidade muito baixas. Essa destruição pela droga que, na maior parte dos casos, conduz à morte precoce, atinge sobretudo as camadas mais jovens e em idade fértil que deveriam começar a fazer parte da população ativa. Em vez de conseguirem uma profissão e produzirem rendimentos para eles próprios se sustentarem, são lançados, por via da droga, no consumo de riqueza obtida pelo trabalho alheio, esmolando do modo mais degradante ou praticando crimes que chegam ao assassinato de familiares, incluindo os próprios pais.

 

Urge, por isso, agravar a moldura penal pelos crimes de tráfico de droga, sobretudo nos casos em que as vítimas ou colaboradores são menores ou diminuídos mentais, e nos casos, como os de associações criminosas e de profissões, como a dos guardas prisionais, em que a prática  do crime se torna mais censurável. Com esse agravamento e sem possibilidade de liberdade condicional, os altamente nocivos efeitos individuais e sociais desses crimes seriam, como toda a certeza, amplamente diminuídos e, com isso, salvas vidas, famílias e sociedades.

 

É advogado e colaborou no Diário de Lisboa Juvenil e nas revista Vértice e Foro das Letras. Tem quatro livros de poesia e dois de prosa publicados. É diretor da revista online incomunidade.com, e da radiotransforma.

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