Política

EDITORIAL | Henrique Dória

Desde que começou a agravar-se o conflito entre a Ucrânia e a Rússia, sempre acreditámos que a Rússia não cometeria a imprudência de invadir a Ucrânia. Isto porque, a quando da anexação da Crimeia, a Rússia tinha adotado a posição inteligente de promover um referendo que, à partida, lhe sabia ser-lhe favorável, e seria credível que tivesse o mesmo procedimento relativamente ao Donbas, de maioria russa.

Porém, no passado dia 19 de Fevereiro, na 56ª Conferência de Segurança de Munique, o presidente na Ucrânia, Vladimir Zelensky, declarou que Ucrânia poderia instalar no seu território armas nucleares.

Tratou-se de um rastilho que levou Putin a decidir a invasão da Ucrânia. É evidente que Zelensky e o seu auditório, fiéis servidores dos Estados Unidos da América, sabiam muito bem que Putin nunca aceitaria a instalação de armas nucleares capazes de atingir e destruir Moscovo em cinco minutos e que, tendo as suas tropas preparadas para defender os separatistas russas do Donbas, tomaria a decisão de invadir a Ucrânia.

Foi isto que aconteceu. Na realidade, de modo diverso ao que alega a propaganda americana e europeia, a Ucrânia, os EUA e a União Europeia tinham-se preparado para a invasão melhor que a Rússia 

( os EUA gastam 770 mil milhões de dólares com o orçamento da defesa e a Rússia 70 mil milhões de dólares), como o demonstrou a resposta ucraniana e europeia, em todos os campos, à invasão, e uma certa impreparação  das forças russas que, apesar da enorme desproporção com as ucranianas, não conseguiu, através de uma guerra relâmpago, conquistar Kiev e, sobretudo, Kharkiv, a segunda cidade ucraniana, bem junto à fronteira russa.

Putin caiu na armadilha que lhe foi lançada por Biden. Invadiu a Ucrânia e está a defrontar-se não só com uma oposição militar inesperada, como com a censura de grande parte opinião pública mundial e, sobretudo, com a alinhamento cego da União Europeia com a estratégia americana.

Com isso, o complexo militar industrial que comanda a política americana, quer de republicanos quer de democratas, conseguiu vários dos seus objetivos, para além do escoamento de material bélico em excesso e do aumento do preço do petróleo. O principal deles foi acabar com as dúvidas sobre o futuro da NATO que a França e a Alemanha estavam a mostrar e, sobretudo, o fazer alinhar a União Europeia com todas as exigências americanas de subserviência à sua estratégia de confronto com a Rússia, como o demonstra a sua disposição de aumentarem o orçamento de defesa para 2% do respetivo PIB, como exigiam os EUA. O seguinte foi o afastarem a ligação económica da Rússia à União Europeia e tentarem provocar um enorme abalo na economia russa.

Com isso fazem da Rússia, cada vez mais, um pivot na estratégia da China. Mas tal parece não os preocupar.

Porém a ação de Putin não faz esquecer o criminoso bombardeamento de Belgrado pelas tropas da OTAN, em 1999 durante 78 dias, para forçar a independência do Kosovo, a cuja população nunca foi perguntado, nem então nem hoje, se queria separar-se da Sérvia, nem faz esquecer os milhares de civis sérvios mortos por esses bombardeamentos.

A propaganda americana fala, com razão, cobras e lagartos dos oligarcas russos. Mas os oligarcas ucranianos, um dos quais catapultou  com  o seu dinheiro o medíocre Zelensky para a presidência, bem como os oligarcas americanos que dominam o poder político nos EUA, não são melhores que os oligarcas russos.

A Rússia e os EUA são muito semelhantes no que toca às desigualdades  pornográficas e injustiças sociais existentes nos seus países e ao imperialismo dos respetivos poderes.

Uma diferença essencial existe, porém, entre os dois países: no que toca aos EUA ainda podemos chamar criminosos  aos seus dirigentes mas, se o fizéssemos na Rússia, com muita probabilidade seríamos presos ou assassinados.

Vladimir Putin parece ter exigido, nas conversações de paz de 28 de Fevereiro, o reconhecimento da Crimeia como território russo, a “desnazificação” do governo ucraniano e  a neutralidade da Ucrânia, como condições para por fim à invasão. Se a primeira exigência é difícil a cedência pela Ucrânia e os EUA (apesar de ser essa a vontade da maioria da população crimeia), e a segunda não terá grande sentido, a aceitação da neutralidade da Ucrânia é uma exigência que deveria ser aceite em benefício da paz, pondo-se, com isso, termo a este inaceitável conflito.

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